OPINIÃO

Empresário bolsonarista diz que não contrata esquerdista, porque é “mimizento e não trabalha duro”

Tallis Gomes deve míseros 10,5 milhões de reais em impostos à União. Algo típico do “cidadão de bem”. Desnecessário mencionar quem ele apoiou na campanha presidencial de 2022. Não falha

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Facebook / Tallis Gomes

Quando pensávamos que as investidas da Brasil Paralelo em cursos de formação de professores e a resolução do governo de São Paulo sobre policiais lecionarem em escolas cívico-militares seriam as únicas notícias negativas envolvendo a área educacional, eis que Tallis Gomes, diretor-executivo da “G4 Educação”, grupo ligado ao Magazine Luiza, afirmou no podcast Café com Ferri que “não contrata esquerdista, porque é mimizento e não trabalha duro”. 

No entanto, este “não trabalhar duro” não está relacionado, necessariamente, à falta de qualificação profissional ou mau desempenho em uma determinada função, fatores que seriam até “compreensíveis”. Para Tallis, uma “boa equipe” é aquela em que os “colaboradores” (eufemismo para empregados) trabalham até uma hora da madrugada e retornam às oito da manhã. Ou seja, “intervalo interjornada” é coisa de “comunista” e “vagabundo”. 

Do mesmo modo, descanso aos finais de semana é algo impensável, coisa de mimizento. Mas, nesse ponto, devemos reconhecer, Tallis Gomes é até bonzinho. Aos sábados e domingos, o “colaborador” não precisa comparecer à empresa; pode trabalhar no conforto de sua casa, em regime de home office. Concessão que é um verdadeiro luxo. 

Nas palavras do diretor-executivo da “G4 Educação”, “se não meter 70 ou 80 horas por semana de trabalho, você não vai construir nada na vida”. Como cada semana possui 168 horas, dedicando quase metade desse tempo à labuta, se não errei o cálculo, o trabalhador terá uma média de 12 horas diárias para dividir entre dormir, repor suas energias, convívio familiar e se deslocar até a empresa.

Temos assim uma nova frase motivacional coach: “trabalhe enquanto eles dormem”. Selo “Paulo Guedes” de qualidade e trato com o “colaborador”. Não por acaso, segundo Tallis Gomes, “principalmente no início de um negócio, tem que achar uma galera que tope ‘comer caco de vidro contigo’, que esteja disposta a trabalhar cinco anos com você”. Lembrando um meme bastante compartilhado nas redes sociais: “se você trabalhar duro, não faltar nenhum dia, e der tudo de si, seu patrão vai poder comprar um carro e uma casa melhores”. 

Para Tallis, “não contratar esquerdista elimina 90% dos problemas”, pois esse pessoal, quando chega o fim do expediente, já quer ir embora e, se “falar alguma coisa”, já recorre ao RH. “Reivindicar direitos”, mais uma prática de “esquerdista mimizento”, viúva da CLT. 

Completando o combo bolsonarista, a “G4 Educação”, no melhor estilo Teologia da Prosperidade, “levou a igreja para dentro da empresa”, com exemplares da Bíblia, rezas e grupos de oração. 

Portanto, conforme Tallis Gomes, as práticas apontadas acima explicam o porquê de a “G4 Educação”, em apenas cinco anos de existência, fazer 100 milhões de reais de lucro líquido. 

Por outro lado, conforme levantamento da página “Brasil para lerdos” (citado em vídeo dos “Galãs Feios”), por trás dessa receita de sucesso do diretor-executivo e dublê de coach, está uma empresa com histórico de gestores despreparados, salários abaixo da média do mercado, forte competitividade, vendas agressivas, ambiente hostil para minorias e lavagem cerebral sobre posicionamento político. O perfeito retrato do capitalismo atual. O próximo passo seria pedir a revogação da Lei Áurea?

Além disso, o Brasil de Fato noticiou que Tallis Gomes deve míseros 10,5 milhões de reais em impostos à União. Algo típico do “cidadão de bem”. Desnecessário mencionar quem ele apoiou na campanha presidencial de 2022. Não falha! 

Assim, com exploração do trabalho ao nível máximo e calote, é fácil “fazer 100 milhões de reais de lucro líquido”. 

Diante dessa realidade, é possível concluir que o único “G4” benéfico é aquele que dá vaga para a Primeira Divisão do Campeonato Brasileiro. Se for relacionado à educação, como diz um famoso personagem, corre que é cilada.