OPINIÃO

Maradona, futebol e política

Há quatro anos, no dia 25 de novembro, falecia o jogador de futebol argentino Diego Armando Maradona. Sua figura transcende as quatro linhas

Maradona com Lula na foto divulgada pelo presidente brasileiro no dia da morte do craque argentino.Créditos: Rede X / Lula Oficial
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Há quatro anos, no dia 25 de novembro, falecia o jogador de futebol argentino Diego Armando Maradona. Não entrando em polêmicas sobre quem é o melhor de todos os tempos, é fato que Maradona é o maior “personagem” do esporte mais popular do planeta. Sua figura transcende as quatro linhas.

Em um meio conhecido pela alienação (e até certo conservadorismo), Maradona se destacou por seus posicionamentos políticos à esquerda. Defendeu a soberania latino-americana, se opôs ao imperialismo estadunidense, denunciou o genocídio palestino, apoiou governos progressistas e foi contrário a políticos comprometidos com interesses alheios ao povo.

Não por acaso, foi perseguido pela cartolagem da Fifa e já chegou a ser atacado nas redes sociais pelo atual presidente da Argentina, Javier Milei - que o chamou de “Mardedroga” e “gordo”.

Nos gramados, as atuações de Maradona eram ao mesmo tempo esportivas e políticas. Na Copa do México, em 1986, em que teve o melhor desempenho individual de um jogador na história, ele foi protagonista daquele que, talvez, seja o jogo com maior simbolismo geopolítico dos mundiais (tema até de livro escrito por Andrés Burgo). Trata-se de Argentina e Inglaterra, pelas quartas de final do torneio, no lendário Estádio Azteca.

Apenas quatro anos antes, argentinos e o imperialismo inglês lutaram no conflito conhecido como Guerra das Malvinas, com vitória acachapante dos europeus. 

Evidentemente, uma disputa esportiva jamais terá o peso de uma guerra, porém é inegável que o fator Malvinas estaria presente naquela partida, por mais que ambos os lados negassem essa influência. Por si só seria motivo para uma partida envolta em tensões, dentro e fora de campo.

E foi o que ocorreu, com o registro de brigas entre barra bravas e hooligans no Estádio Azteca. Em campo, Maradona marcou os gols antológicos que garantiram a vitória argentina por 2 a 1.

O primeiro gol, marcado com a mão, foi uma espécie de vingança simbólica contra os ingleses, conforme disse o próprio Maradona, ciente do significado geopolítico daquela partida.

Para não deixar dúvida sobre sua capacidade técnica, no segundo gol, Maradona partiu de seu campo de defesa e driblou meio time inglês até balançar as redes. O camisa 10 argentino fazia com os pés o que Eduardo Galeano fez com as letras em “As Veias Abertas da América Latina”.

Se, em sua seleção, Maradona simbolizava os povos oprimidos contra o imperialismo, no Napoli, clube em que viveu sua melhor fase, ele representava os antagonismos entre o sul (pobre) e o norte (rico) na Itália.

Numa época em que o campeonato italiano era o mais disputado do planeta, com o domínio das poderosas equipes do norte, Maradona levou o modesto Napoli a dois títulos nacionais. Pelo menos no plano esportivo, o sul subvertia o histórico hegemônico do norte. 

Ciente dessa desigualdade regional, quando Itália e Argentina se enfrentariam na cidade de Nápoles, pela Copa do Mundo de 1990, Maradona solicitou aos torcedores napolitanos que apoiassem a seleção sul-americana contra a Azzurra, como forma de protesto pelo histórico preconceito sofrido pelos italianos meridionais por parte de seus compatriotas do norte.

Em 2012, Reinaldo Azevedo, no auge de seu reacionarismo, escreveu que Oscar Niemeyer seria “metade gênio” (profissionalmente) e “metade idiota” (por causa do posicionamento ideológico). Parafraseando essa infeliz colocação, podemos dizer que Maradona, em sua metade profissional, foi genial; em sua outra metade – como ser humano – esteve do lado certo da história.

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