CARLOS CASTELO

O papagaio que dava a letra dos truques do dono mágico

O papagaio, mais metido do que subcelebridade em programa de televisão, dava a letra dos truques para todo mundo. Mal Claudinor finalizava a mágica, a ave já berrava

Papagaio traíra.Créditos: Dall-E
Escrito en OPINIÃO el

Durante a infância e a adolescência em Catolé do Rocha, Claudionor acompanhava as apresentações do pai, o mágico Mr. N (nascido Neuclidenor), no circo Trastevere.

Apesar do nome gringo, o circo era nacional, formado por artistas, bodes, porcos, coelhos, pombas e jumentos sertanejos. 

O número mais antológico de Mr. N era transformar um preá num leitão pai-de-chiqueiro. Multidões acorriam ao Trastevere apenas para presenciar o momento transcendental.

Claudionor cresceu aprendendo as manhas do ilusionismo. Mais tarde, já adulto e fornido, se mudou para a capital paulista indo habitar as barrancas da Vila Mangalô.

Trabalhava no centro velho como engraxate. Nos momentos de folga, cursava a escola de mágica de José Mojica Marins.

Em pouco mais de um ano, com seu próprio repertório autoral, passou a performar em arenas da periferia, com o nome artístico de Mr. C.

Para se diferenciar da figura paterna, promovia suas aparições ao lado de um papagaio, importado da Paraíba.

Sua prestidigitação era muito elogiada, mas havia apenas um senão. O papagaio, mais metido do que subcelebridade em programa de televisão, dava a letra dos truques para todo mundo. Mal Claudinor finalizava a mágica, a ave já berrava:

“A moeda estava na manga do paletó!”.

Ou: “ele usou dois baús pra serrar a moça!”.

Certa noite, numa soirée do Gran Circus Goldenkovich, no momento do desfecho de um número, uma carreta abalroou dois postes de alta tensão na rodovia Anhanguera. Em segundos, tudo virou um caos urbano.

A arquibancada do circo, na hora do curto-circuito, saltou violentamente para frente. Na sequência, retornou ao lugar de origem, sem que nenhum ocupante saísse dos assentos.

Passado o susto, Claudinor foi para a boca do picadeiro e se curvou, de forma respeitosa. A audiência, impressionada com o que vivenciara, o aplaudiu por vários minutos.

Horas depois, no camarim, o papagaio apareceu em estado deplorável. Sem uma pena no corpinho, manquitolando, parecia mais um filhote de cruz-credo. Trêmulo, virou-se para Claudionor, e disse:

“Rapaz, vai ser bom assim lá no Cirque de Soleil! Agora vai, me conta: como você fez aquele truque da arquibancada!”