Escalada nuclear no Oriente Médio abre caixa de Pandora: conseguirá a ONU conter a catástrofe? – Por Washington Araújo
Reunião do Conselho de Segurança expõe perigo nuclear após ataques dos EUA e Israel ao Irã, provoca alertas de radiação e coloca populações civis em risco
Em meio a uma crise internacional inédita em oito décadas da existência das Nações Unidas, a reunião extraordinária do Conselho de Segurança, realizada neste domingo, 22 de junho de 2025, escancarou o tamanho da ameaça que paira sobre o mundo. O pano de fundo: os ataques coordenados dos Estados Unidos e de Israel contra as principais instalações nucleares do Irã, uma escalada sem precedentes em meio ao conflito desencadeado no último dia 12. As falas contundentes das grandes potências — EUA, China, Rússia, Reino Unido e França — deixam clara a gravidade do momento, num cenário que parece evocar o mito da Caixa de Pandora: uma vez aberto, o mundo é confrontado com perigos que fogem do controle, em especial o espectro de uma catástrofe nuclear.
O início da guerra e a escalada da destruição
Na madrugada de 13 de junho de 2025, Israel surpreendeu a comunidade internacional ao lançar dezenas de ataques aéreos em território iraniano, tendo como alvo instalações nucleares, bases militares e centros de comando. Em apenas algumas horas, segundo fontes militares israelenses, mais de 200 aeronaves lançaram mais de 330 munições sobre cerca de 100 diferentes locais estratégicos. O Mossad desempenhou papel fundamental em ações de sabotagem que enfraqueceram os sistemas de defesa do Irã, ampliando o alcance e impacto dos bombardeios.
A resposta iraniana foi imediata: o lançamento de ondas de mísseis balísticos contra cidades em Israel, com parte dos projéteis atravessando o sistema Domo de Ferro e deixando dezenas de mortos e feridos. O ciclo de retaliações aumentou exponencialmente o grau de destruição, levando à morte centenas de civis e combatentes de ambos os lados.
Com a devastação eclodindo em ritmo acelerado e o mundo à beira de um colapso diplomático, o envolvimento dos Estados Unidos, ao atacarem diretamente as instalações nucleares de Fordow, Natanz e Isfahan no último sábado, marcou o ponto de inflexão mais dramático até aqui. Donald Trump, então presidente, afirmou: "ou haverá paz ou tragédia para o Irã", ao anunciar a ofensiva aérea, classificada como "cirúrgica", mas de consequências ainda incalculáveis.
O alerta dos especialistas: radiação e riscos civis
As consequências dos ataques despertaram alarme internacional, em especial pela possibilidade de liberação de material radioativo em áreas densamente povoadas. O diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica, Rafael Grossi, soou o alerta já na madrugada de sábado: “Bombardeios contra instalações nucleares elevam substancialmente o risco de dispersão de material radioativo. Há sérias preocupações quanto ao impacto ambiental e sobre a saúde da população civil nas imediações”.
As cidades vizinhas às instalações atingidas concentram considerável população:
– Fordow: Localizada próxima à cidade de Qom, com cerca de 1,2 milhão de habitantes segundo estimativas. O complexo nuclear está encravado em área montanhosa, mas o risco de contaminação radioativa afeta dezenas de vilas e bairros próximos.
– Natanz: Originalmente uma cidade de 12 mil habitantes, a presença da maior usina de enriquecimento de urânio do Irã significa que há milhares de trabalhadores e famílias nas redondezas da planta, além de cidades médias num raio de até 80 quilômetros.
– Isfahan: Terceira maior cidade do Irã, com população superior a 2 milhões de pessoas. O centro de tecnologia nuclear de Isfahan está nos subúrbios, ampliando o potencial de impacto em zonas densamente habitadas caso haja vazamento ou destruição do reator experimental e armazéns de resíduos nucleares.
O impacto de um acidente nessas áreas pode resultar em “contaminação do solo e da água, aumento de cânceres, doenças respiratórias e deslocamento em massa de pessoas”, conforme alertou Grossi. Ele também lembrou que, dependendo da direção do vento e das chuvas, nuvens radioativas podem percorrer longas distâncias, atingindo até outros países da região.
O Conselho de Segurança: tensão, cobranças e apelos
Com a escalada militar, o Conselho de Segurança da ONU tornou-se, neste domingo, o centro do debate internacional. Na reunião transmitida ao vivo, os discursos dos cinco países membros permanentes revelaram tanto desacordos quanto o temor comum de uma catástrofe sem precedentes.
Os Estados Unidos defenderam a ofensiva:
“O mundo não pode permitir que o Irã desenvolva armas nucleares. As ações tomadas foram legítimas para garantir a segurança mundial e dos nossos aliados.”
A China insistiu na solução diplomática e condenou o uso unilateral da força:
“Pedimos respeito ao Direito Internacional e apoiamos a proposta de cessar-fogo imediato. O diálogo e a negociação são as únicas vias legítimas para superar esta crise.”
A Rússia reiterou a necessidade de contenção:
“É inadmissível recorrer a bombardeios contra alvos estratégicos de outro Estado sem o aval deste Conselho. A escalada militar apenas trará mais instabilidade à região.”
O Reino Unido lamentou a deterioração da segurança e apelou por contenção:
“Instamos todas as partes a demonstrar contenção e abrir canais de diálogo imediato. Só através do multilateralismo e respeito às resoluções deste Conselho poderemos restaurar a estabilidade regional.”
Já a França foi enfática no apelo:
“A França apela com urgência à cessação imediata das hostilidades. O caminho para a paz passa pela diplomacia, não pelos bombardeios. Devemos agir para proteger vidas civis e garantir que o Oriente Médio não entre num ciclo irreversível de guerra.”
Pandora, a ONU e o perigo sem precedentes
Diante desse quadro, resgatar o mito da Caixa de Pandora serve como poderosa metáfora: ao ser aberta, propaga todos os males pelo mundo, restando apenas a esperança. O Conselho de Segurança, criado para evitar os horrores das guerras mundiais, jamais esteve tão próximo de sua função original ameaçada. Especialistas e diplomatas alertam: a possibilidade de um acidente nuclear, intencional ou por erro de cálculo, colocaria em risco não apenas o Oriente Médio — mas o planeta.
A ONU enfrenta, assim, o seu maior desafio em 80 anos. A retórica dos discursos pode ser insuficiente diante da rapidez com que decisões militares são tomadas e executadas. A ameaça nuclear, antes restrita à retórica de dissuasão, tornou-se concreta e palpável, com impactos já sentidos pelas populações civis vulneráveis. O fechamento do espaço aéreo israelense, o risco do bloqueio ao Estreito de Ormuz e o pânico nos mercados internacionais sinalizam que o efeito dominó pode ir muito além das fronteiras dos envolvidos.
A urgência da paz
Em meio ao pessimismo, persiste a urgência de renovar a esperança. As falas firmes de Rafael Grossi e o apelo dos atores internacionais devem servir de alerta: sem a reconstrução do multilateralismo, sem a busca obstinada pela paz, há risco real de que a humanidade experimente, em tempo real, um mal irreversível liberado da caixa de Pandora — a destruição nuclear em larga escala.
O Conselho de Segurança deve agir, a comunidade internacional precisa pressionar todas as lideranças envolvidas, e a opinião pública mundial não pode se omitir. A cada minuto sem trégua, cresce o perigo de que o mundo hoje testemunhe, ao vivo, a quebra definitiva de um tabu nuclear que perdura desde Hirochima e Nagasaki. E resta perguntar: será a esperança suficiente para fechar novamente a caixa?
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.