Tem gente que gosta de sol. Tem gente que gosta de chuva. Sim, e tem gente que não gosta de nada.
Minha mãe gostava de vento. Não um vento específico, mas o vento. Qualquer um. Uma suave brisa ou uma ventania, um vendaval daqueles de fazer as roupas darem cambalhota no varal.
Tem gente que se incomoda com o vento. Despenteia o cabelo. Ela gostava disso, de sentir o vento nos cabelos.
Ela dizia que quando criança corria e brincava com o vento. Não apenas sentia seu sopro no corpo, mas gostava de vê-lo movimentar a vida.
Corria para o muro, subia num caixote e ficava olhando o balanço das árvores, o desalinho dos cabelos, o movimento das roupas, das saias, as pipas...
Tem gente que acredita em reencarnação. Tem gente que não acredita nem desacredita. Tem gente que não acredita em nada.
Fico pensando, se minha mãe reencarnasse. Sempre ouvi falar na possibilidade de reencarnação até como uma nova pessoa. Ou um animal.
Aí minha mãe poderia ser uma pombinha, porque ela sempre invejou nas pombas (as comuns e também as pequenas, rolinhas) a capacidade de voar.
Nunca ouvi falar na possibilidade de uma pessoa reencarnar num fenômeno da natureza. Não sei se tem. A pessoa voltar como água. Como vento.
Só sei que toda vez que venta, me lembro dela.
Hoje é Dia das Mães. Se estivesse viva, comemoraríamos. Como não está, invento.
Sempre vento.
*Antonio Mello, escritor, blogueiro do Blog do Mello, autor do romance ELA (linktr.ee/blogdomello) publica uma crônica todo domingo aqui na Fórum.
**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.