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Taiwan é um país? Para a maioria dos países do mundo, não. Entenda

IIha está no centro de disputa entre as duas maiores potências mundiais, China e EUA

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Jornalista que atua em Brasília desde 1995, tem experiência em redação, em comunicação corporativa e comunicação pública, em assessoria de imprensa, em produção de conteúdo, campanha política e em coordenação de equipes. Atuou, entre outros locais, no Governo Federal, na Presidência da República e no Ministério da Justiça; no Governo do Distrito Federal, na Secretaria de Comunicação e na Secretaria de Segurança Pública; e no Congresso Nacional, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados e na Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO).
Taiwan é um país? Para a maioria dos países do mundo, não. Entenda
Taiwan é um país? Para a maioria dos países do mundo, não. Entenda. IIha está no centro de disputa entre as duas maiores potências mundiais, China e EUA. Wikipedia

A questão de Taiwan ocupa um lugar estratégico na geopolítica mundial e influencia diretamente as relações entre as duas maiores potências globais: China e Estados Unidos. O status político da ilha alimenta debates complexos e disputas diplomáticas, mas para a maior parte do mundo o território insular é parte da China.

Para a República Popular da China (RPC), Taiwan é uma província que faz parte do território nacional. Essa posição é baseada na política de “Uma Só China”, segundo a qual apenas o governo de Pequim é reconhecido como legítimo representante da China. 

Essa política é respaldada por resoluções internacionais, como a Resolução 2758 da Organização das Nações Unidas (ONU), aprovada em 1971, que transferiu a representação oficial da China à RPC.

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A maioria esmagadora dos países do mundo, 181 nações no total, aderem à política “Uma Só China” e não mantêm relações diplomáticas oficiais com Taiwan. Essa lista inclui o Brasil e os Estados Unidos.

No entanto, diversos governos mantêm laços econômicos, culturais e de cooperação com a ilha, como ocorre com os Estados Unidos, que também fornecem armamentos ao governo de Taipei.

Apenas 12 países reconhecem oficialmente Taiwan como um Estado soberano: Belize, Eswatini, Guatemala, Haiti, Ilhas Marshall, Nauru, Palau, Paraguai, São Cristóvão e Nevis, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas e Tuvalu. 

Os apoiadores de Taiwan têm diminuído nos últimos anos, à medida que diversas nações optaram por reconhecer a China continental, como Honduras, Panamá, El Salvador, República Dominicana e Nicarágua.

Como Taiwan se define

Taiwan, oficialmente denominada República da China (ROC), tem governo próprio, constituição, moeda (novo dólar taiwanês), forças armadas e eleições regulares. O Partido Progressista Democrático (DPP, da sigla em inglês), atualmente no poder, defende a manutenção da autonomia da ilha dentro da política de "status quo", sem declarar independência formal.

Na prática, Taiwan funciona com autonomia administrativa e política. No entanto, sua situação jurídica no cenário internacional permanece indefinida, o que a torna um dos pontos mais sensíveis da geopolítica contemporânea, especialmente nas relações entre China e Estados Unidos.

O papel dos EUA

Taiwan também ocupa posição central na chamada “guerra dos chips”, devido à TSMC, maior fabricante mundial de semicondutores, responsável por cerca de 50% da produção global. Esses componentes são fundamentais para a indústria de alta tecnologia, incluindo smartphones, carros elétricos e equipamentos militares. A rivalidade tecnológica entre Estados Unidos e China tem levado Washington a reforçar sua cooperação com Taiwan nesse setor estratégico.

Além disso, a localização geográfica da ilha a torna uma peça-chave no comércio marítimo global. O Estreito de Taiwan é uma das rotas comerciais mais movimentadas do mundo. Tensões na região, como exercícios militares e disputas diplomáticas, geram preocupação internacional quanto à estabilidade das cadeias de suprimentos.

A política dos Estados Unidos em relação a Taiwan é definida pela "ambiguidade estratégica". Embora reconheçam oficialmente a política de "Uma Só China", os EUA mantêm uma relação sólida com Taiwan por meio do Taiwan Relations Act, aprovado em 1979. Essa lei garante o fornecimento de meios defensivos à ilha e estabelece que qualquer tentativa de alteração do status de Taiwan por meios não pacíficos será considerada uma ameaça à paz regional.

O governo chinês afirma que os EUA interferem nos assuntos internos da China ao manter laços com Taiwan. As principais críticas incluem a venda de armas, visitas oficiais de autoridades estadunidenses e o apoio a partidos taiwaneses que defendem maior autonomia. A Lei Anti-Secessão, promulgada em 2005, autoriza o uso de medidas não pacíficas caso a ilha adote ações que possam ser interpretadas como um movimento formal de separação.

Taiwan entre duas histórias

A história da ilha de Taiwan é contada de formas radicalmente distintas por Taipei e Pequim. De um lado, muitos taiwaneses veem a ilha como uma nação com identidade, história e sistema político próprios. De outro, a China continental afirma que Taiwan é uma província rebelde que deve retornar ao seu controle. Essas versões opostas alimentam disputas diplomáticas, militares e ideológicas com impacto direto na ordem global.

Para amplos setores da sociedade taiwanesa, especialmente os que apoiam o DPP, Taiwan tem uma trajetória histórica autônoma. A narrativa começa com os povos austronésios, primeiros habitantes da ilha, com raízes culturais mais próximas do Sudeste Asiático e do Pacífico do que da China continental. Ao longo dos séculos, Taiwan foi marcada por colonizações holandesa, espanhola, chinesa e japonesa — processo que moldou uma sociedade plural e cosmopolita.

O domínio japonês, entre 1895 e 1945, é considerado um marco decisivo. Apesar da repressão colonial, esse período modernizou a infraestrutura, o sistema educacional e a economia. Muitos taiwaneses mais velhos aprenderam japonês como primeira língua, e parte da identidade moderna da ilha é associada à experiência sob o Japão.

Com a derrota do Kuomintang (KMT) na guerra civil chinesa, em 1949, os nacionalistas se refugiaram em Taiwan, impondo um regime autoritário e a identidade chinesa como oficial. Essa nova ocupação é vista por muitos como mais uma imposição externa. 

Apenas nos anos 1990, com a redemocratização, Taiwan começou a construir um sistema político baseado em eleições livres, liberdade de imprensa e pluralismo. Hoje, muitos cidadãos se identificam como “taiwaneses” e defendem que a ilha é, na prática, um Estado soberano, ainda que sem reconhecimento oficial da maioria dos países.

Para Pequim, Taiwan é parte inseparável do território chinês desde a antiguidade. A incorporação da ilha pela dinastia Qing em 1683 confirma a legitimidade histórica do vínculo. Após a fundação da RPC em 1949, o governo comunista passou a ver a separação como uma anomalia provocada pela guerra civil.

Desde os anos 1980, Pequim propõe a “reunificação pacífica” com base no modelo “um país, dois sistemas”. O presidente chinês, Xi Jinping, elevou a reunificação ao status de missão nacional, ligando o retorno de Taiwan ao continente ao “rejuvenescimento da China” no século XXI.

Geografia e demografia

Taiwan é composta por mais de 160 ilhas, incluindo a ilha principal, onde vivem 98% dos seus cerca de 23,3 milhões de habitantes. Também fazem parte do território administrado pela República da China o arquipélago de Penghu, as ilhas Kinmen, Matsu, Lanyu (Orchid Island), Ilha Verde (Ludao), Dongsha e Taiping, esta última localizada no disputado Mar do Sul da China.

O DPP (Partido Democrático Progressista) surgiu em 1986, no contexto da transição democrática da ilha, e defende o fortalecimento da identidade taiwanesa e políticas sociais progressistas. Embora o partido não defenda uma declaração formal de independência, sua posição pró-autonomia é frequentemente criticada por Pequim. A eleição de Lai Ching-te em 2024, após dois mandatos de Tsai Ing-wen, sinaliza a continuidade dessa linha política.

Enquanto a China reforça a narrativa de reunificação com base em fundamentos históricos e legais, setores da sociedade taiwanesa defendem que a ilha desenvolveu uma identidade própria, marcada por experiências históricas diversas, como a colonização japonesa, e pela construção de um sistema político autônomo nas últimas décadas.

A disputa em torno de Taiwan envolve aspectos territoriais, jurídicos, históricos, militares e tecnológicos. O equilíbrio delicado entre manter o status atual e evitar uma escalada militar faz da ilha um dos principais focos de atenção na geopolítica global do século XXI.

 

 

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