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Gestão Nunes descumpre decisão da Justiça e continua a negar aborto legal

Pelo menos três vítimas de violência sexual foram impedidas de realizar o procedimento em hospitais municipais

Protesto a favor do aborto legal no Rio de Janeiro.Créditos: Fernando Frazão/Agência Brasil
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Mesmo após decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) para que fosse realizado o serviço de aborto legal nos hospitais municipais de referência, a prefeitura de São Paulo, sob gestão de Ricardo Nunes (MDB), continua a negar o procedimento

De acordo com mapeamento divulgado pelo site G1 e pela GloboNews, nesta segunda-feira (26), a prefeitura negou pelo menos três abortos legais para vítimas de violência sexual que procuraram hospitais de referência na cidade. Duas delas tiveram que realizar o procedimento em um hospital estadual. 

Desde dezembro de 2023, a prefeitura de SP vem dificultando o acesso ao aborto legal. Segundo a legislação brasileira, o procedimento é permitido em três casos: gravidez resultante de estupro, risco de vida à mãe e anencefalia fetal. 

Na primeira decisão da prefeitura, o aborto legal foi suspenso no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, o único na cidade que realizava o procedimento acima de 22 semanas de gestação. A decisão foi levada ao Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal (STF), que ordenaram a retomada do procedimento. O TJ-SP também exigiu que outras unidades de saúde de referência realizassem o aborto legal. 

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Moraes intima hospitais de SP para garantir acesso ao aborto legal após 22 semanas

Porém, o município não cumpriu a decisão judicial e encaminhou as mulheres a hospitais estaduais. A principal justificativa apresentada pelas unidades de saúde era uma suposta falta de equipe especializada. Ao ser direcionada a outro hospital, uma das vítimas teve que refazer todos os exames que já tinha feito dias antes, e ainda precisou passar mais 10 dias naquela situação

Em novo relato, outra mulher vítima de violência sexual conta que precisou esperar mais de um mês para conseguir fazer o aborto legal, tendo que realizar seis consultas na rede municipal, mas sem sucesso. Algumas das justificativas apresentadas por diferentes unidades foram de que a médica que faria o procedimento estava de "férias"; em outro hospital, o médico faltou à consulta e, no seu quinto atendimento, foi impedida com o argumento de que ela precisava da autorização de um familiar, mesmo sendo maior de 18 anos.

Com todas essas barreiras, a vítima passou das 22 semanas de gestação e ainda teve que ouvir diversos questionamentos. "Ninguém faz aborto com gravidez tão avançada”, “já pensou em adoção?”, “muitas mulheres passaram por isso e são mães guerreiras”, “se você quer a interrupção você sabe que vai ter que enterrar este feto”, foram algumas da frases ouvidas pela paciente, que conseguiu realizar o aborto legal somente na semana passada. 

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A terceira paciente, também vítima de estupro, compareceu ao Hospital Municipal Mário Degni, na Zona Oeste, quando estava com 12 semanas de gestação. Ela, porém, foi informada de que a unidade não realizava aborto legal e não recebeu nenhum encaminhamento nem auxílio para buscar o serviço em outro hospital. 

Em nota ao G1, a Secretaria de Saúde disse “que atende às demandas de aborto a partir de determinação legal e em observância à legislação”, não tendo comentado as novas recusas reveladas.

Já o prefeito Ricardo Nunes, quando questionado sobre a decisão do STF que determinou que a prefeitura prestasse esclarecimentos sobre a recusa ao aborto legal, afirmou que "o magistrado não tem condição de definir o serviço melhor do que o médico".

As dificuldades para acessar o aborto legal no Brasil

Em uma série de três reportagens, a Fórum mostrou as dificuldades para acessar o aborto legal no Brasil, permitido pela legislação desde 1940. Na prática, porém, mulheres e crianças enfrentam uma série de desafios e questionamentos para darem continuidade ao procedimento, principalmente as vítimas de violência sexual.

Leia mais nas reportagens abaixo:

As dificuldades para acessar o aborto legal no Brasil

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