A gestão do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), foi denunciada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), vinculada à Organização dos Estados Americanos (OEA), após suspender o serviço de aborto legal no Hospital e Maternidade Vila Nova Cachoeirinha.
A unidade é uma das únicas de São Paulo a realizar o procedimento e sua suspensão, desde dezembro do ano passado, vem impedindo o direito de dezenas de pessoas ao aborto legal, garantido na legislação desde 1940 para três casos: estupro, anencefalia fetal e risco de vida à mãe.
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Além disso, o hospital é referência na realização do aborto legal após 22 semanas de gestação, situação que ocorre muito em mulheres e crianças vítimas de estupro. Com a interrupção do serviço, essas vítimas estão tendo que viajar para outros estados para realizar o procedimento.
A justificativa do hospital, após uma série de denúncias, foi de que a unidade "está atendendo outros procedimentos ginecológicos" e que a suspensão é para realizar "cirurgias eletivas, mutirões cirúrgicos e outros procedimentos envolvendo a saúde da mulher".
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Mesmo a Justiça já tendo determinado o retorno do serviço, a prefeitura de São Paulo o mantém suspenso há mais de seis meses. Por isso, a Bancada Feminista do PSOL na Câmara Municipal de SP acionou a CIDH.
Na denúncia, as vereadoras afirmam que a suspensão do serviço "limita o acesso ao aborto legal em toda a região Sudeste e sobrecarrega os já poucos serviços remanescentes". Elas também citam a situação das vítimas de estupro. "É sabido que quem chega no serviço de aborto legal com uma gestação avançada são as pessoas que estão em situação de maior vulnerabilidade, como crianças, adolescentes, pessoas trans e mulheres que sofrem com a violência intrafamiliar", acrescentam.
As parlamentares ainda citam a perseguição que o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) fez contra médicos que cumpriram com a lei e realizaram o aborto legal em pacientes da unidade.
"Coagir ou obrigar mulheres a prosseguirem com gestações que comprometam sua integridade física e psicológica constitui uma forma de discriminação de gênero passível de ser caracterizada como tortura, tratamento cruel, desumano e degradante", diz um trecho do documento.
Por fim, a Bancada pede que a CIDH "intervenha e exorte o Brasil, em especial o município de São Paulo, a garantir o acesso irrestrito ao aborto legal, conforme previsto na legislação nacional e nos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo país".
O aborto legal no Brasil
Em uma série de três reportagens, a Fórum mostrou a dificuldade que pessoas que precisam realizar o aborto legal enfrentam até o serviço. O debate sobre o procedimento se intensificou nos últimos meses, tanto pela decisão da prefeitura de SP, quando pela nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) e do PL 1904/2024, conhecido como PL do Estupro.
Para saber mais sobre os assuntos discutidos dentro do debate sobre o aborto legal, confira as reportagens abaixo:
- As dificuldades para acessar o aborto legal no Brasil
- Assistolia fetal: entenda o procedimento usado para aborto após 22 semanas
- Aborto legal e objeção de consciência: banalização do conceito limita procedimento garantido em lei
Legislação do aborto do Brasil
Atualmente, o Brasil está entre os países com legislações mais rígidas contra o aborto. Considerado crime pelo Código Penal, com pena de seis meses a dois anos, aborto é permitido apenas em três situações:
- Quando a gravidez representa risco de vida para a gestante;
- Quando é resultado de estupro;
- Quando o feto é anencefálico.
Nesses casos, a pessoa tem direito ao aborto seguro e gratuito pelo Sistema Único de Saúde (SUS), independentemente do tempo de gravidez. No entanto, foi preciso muita luta das mulheres para terem, pelo menos, direito ao aborto nessas três situações.
LEIA MAIS: Como é a legislação do aborto do Brasil