Foi exibido no capítulo desta terça-feira (12) da novela "Terra e Paixão", a atual produção das 21 horas da Rede Globo, o aguardado beijo entre Ramiro (Amaury Lorenzo) e Kelvin (Diego Martins). A última vez que tal cena ocorreu foi na novela "Amor à Vida" (2013), entre os personagens Felix e Nico (Thiago Fragoso). Ou seja, há uma década. Aliás, ambas as tramas são de autoria do mesmo autor: Walcyr Carrasco.
Mas a pergunta a se fazer é: o beijo entre personagens LGBT+ em telenovelas exibidas na TV aberta tem alguma importância? A resposta, obviamente, é sim, e isso por uma série de motivos. Vamos a eles.
Te podría interesar
Lembro muito bem quando ocorreu o beijo entre Niko (Thiago Fragoso) e Félix (Matheus Solano), na reta final de "Amor à Vida". Estava em um bar e, quando chegou o momento, o ambiente simplesmente silenciou e depois foi ao delírio, as pessoas presentes se emocionaram e brindaram. Alguns até comentavam, "finalmente aconteceu!".
Invisibilidade e Representatividade
As histórias de personagens LGBT+ não são algo novo e estão presentes desde 1974, por exemplo, na versão original de "O Rebu". Porém, foi uma longa travessia até que tais personagens tivessem estrutura narrativa (começo, meio e fim) e não fossem apenas trampolim para outras histórias.
Te podría interesar
Dessa maneira, as histórias de personagens LGBT+ viviam na sombra da trama e podiam "desaparecer" sem fazer falta alguma à história. Tal cenário mudou no século XXI, mas ainda eram retratados de maneira assexuada, ou seja, não trocavam afetos, eram aquelas pessoas que todo mundo sabe que são LGBT, mas que sempre ficam no fundo da foto.
Com a novela "Amor à Vida", a coisa mudou de cenário, pois, o personagem Félix, que faz toda uma travessia de saída do armário, era um dos protagonistas e fez muito sucesso com os espectadores. Foi nesta mesma história que o tal beijo aconteceu. Mas vejam: foram necessárias quatro décadas para que as narrativas não heteronormativas ganhassem relevância e estrutura narrativa.
Além das histórias homossexuais, a questão travesti e transexual também passou a ganhar relevância a partir da novela "A Força do Querer" (2017) com a história de Ivana/Ivan. Com o sucesso da personagem junto ao público, a pauta sobre a questão trans/travesti adentrou todos os espaços de comunicação e permanece até hoje.
Ou seja, no âmbito das telenovelas e em boa parte das comunicações de massa, as histórias LGBT+ saíram da invisibilidade e ganharam visibilidade. E por que isso é importante? Importa, pois, durante mais de 50 anos, a maioria das produções culturais era completamente heteronormativa, dando a entender que esse modo de vida era o único existente e isso alimenta toda sorte de violência: se não existe, ninguém fala.
Sim, o beijo importa
É dentro de todo esse contexto que sim, o beijo e todos os outros afetos LGBT+ importam, pois, diariamente, mais de 60 milhões de brasileiros sintonizam na novela das 21 horas. Dessa maneira, a novela ainda é o produto cultural com a maior inserção social, atingindo todas as classes sociais e lares do Brasil.
Portanto, quando as LGBT+ ganham histórias com começo, meio e fim, com afeto e, sim, com um belo de um beijo, o debate é promovido, as pessoas passam a discutir - novamente, a personagem trans de “A Força do Querer” é um ótimo exemplo - e temos um debate nacional em torno das LGBT+.
Além disso, quando histórias LGBT+ ganham estrutura narrativa em telenovelas, temos um processo de humanização dessas vidas, daí a importância da visibilidade aliada às políticas de orgulho: retirar as pessoas não heteronormativas da vergonha e da sombra é um processo político de fundamental importância que envolve saúde mental e uma melhor sociabilização, pois, o que existe não pode ser ignorado.