O ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, e o assessor especial da Presidência do Brasil, Celso Amorim, reuniram-se no sábado (15) à margem da Conferência de Segurança de Munique para discutir a cooperação bilateral e os esforços conjuntos para a paz na Ucrânia.
Ambos reafirmaram o compromisso com uma solução pacífica para o conflito, destacando a importância da plataforma "Amigos da Paz", criada no âmbito da ONU, como alternativa diplomática.
Te podría interesar
Proposta Brasil-China para a paz na Ucrânia
Em maio de 2024, Brasil e China apresentaram uma proposta conjunta de paz para a guerra na Ucrânia, composta por seis pontos principais:
- Evitar escalada do conflito: Nenhuma das partes deve adotar ações que agravem a guerra.
- Conferência internacional de paz: Organizar um fórum reconhecido por Rússia e Ucrânia, garantindo participação equitativa de todas as partes.
- Ampliação da assistência humanitária: Facilitar a troca de prisioneiros de guerra e a proteção de civis.
- Controle da proliferação nuclear: Evitar o uso de armas de destruição em massa e crises relacionadas.
- Proteção de instalações nucleares: Condenar ataques contra usinas e infraestrutura nuclear civil.
- Fortalecimento da cooperação global: Buscar estabilidade nas cadeias de suprimentos e na economia mundial.
O plano foi bem recebido pelo presidente Vladimir Putin, mas encontrou resistência por parte do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, que argumentou que a proposta poderia favorecer interesses russos.
Te podría interesar
A iniciativa não exige a retirada prévia das tropas russas da Ucrânia, o que gerou críticas de aliados ocidentais, que temem que essa abordagem possa consolidar os ganhos territoriais de Moscou.
Apesar das dificuldades diplomáticas, Lula e Xi Jinping continuam defendendo o plano como alternativa viável à guerra, promovendo negociações multilaterais para uma solução duradoura.
Efeito Trump para a paz da Ucrânia
Com a volta de Donald Trump à Casa Branca, as negociações de paz na Ucrânia ganharam uma nova dinâmica, com a entrada direta dos Estados Unidos no processo.
Trump anunciou negociações imediatas com Vladimir Putin, mas a iniciativa foi marcada pela exclusão inicial de aliados europeus e da própria Ucrânia das discussões preliminares, gerando preocupações e críticas.
A abordagem de Trump, que inclui barrar a entrada da Ucrânia na OTAN e permitir sua adesão à União Europeia até 2030, além de manter o apoio militar dos EUA, contrasta com a proposta sino-brasileira.
Enquanto Brasil e China enfatizam a necessidade de uma conferência internacional inclusiva, a estratégia de Trump tem sido vista como unilateral, marginalizando outros atores relevantes no processo.
A exclusão da Europa e da Ucrânia levou a uma forte reação dos líderes europeus. A chefe da diplomacia europeia, Kaja Kallas, afirmou que qualquer acordo negociado sem a participação de Kiev e dos europeus "está fadado ao fracasso".
Nesse contexto, a proposta sino-brasileira ganha relevância ao promover uma abordagem multilateral, buscando incluir todas as partes interessadas no processo de negociação.
A entrada dos EUA nas negociações, embora possa acelerar o processo, apresenta desafios relacionados à legitimidade e eficácia das soluções propostas, especialmente se não houver uma representação abrangente de todas as partes envolvidas.
Encontro Brasil-China na Conferência de Munique
Na reunião entre Wang Yi e Celso Amorim, o chanceler chinês destacou que Brasil e China, como potências do Sul Global, têm um papel estratégico na promoção da paz, estabilidade e desenvolvimento mundial. Wang enfatizou que a China está comprometida em praticar o verdadeiro multilateralismo, fortalecer o papel da ONU e proteger os interesses dos países em desenvolvimento.
Já Amorim ressaltou a importância da visita de Estado de Xi Jinping ao Brasil em 2024, que consolidou a relação estratégica entre os dois países. Ele reafirmou o compromisso brasileiro em acelerar a implementação de acordos bilaterais e ampliar a cooperação econômica e política.
No entanto, a presença de Xi Jinping na cúpula do BRICS no Brasil, prevista para julho de 2025, ainda é incerta. Amorim afirmou que a participação do líder chinês dependerá de sua agenda internacional e de eventos como o Fórum China-CELAC e a COP30, em Belém.
Wang Yi e a defesa de um mundo multipolar
Em seu discurso na Conferência de Munique, Wang Yi fez uma defesa contundente de um mundo multipolar, com igualdade entre as nações e respeito ao Direito Internacional. Ele alertou sobre os riscos da desordem global e criticou a imposição de normas unilaterais:
"A multipolaridade não deve ser uma condição de desordem. Sem normas e padrões, quem hoje está à mesa pode amanhã estar no cardápio."
O chanceler chinês delineou quatro princípios para um sistema internacional mais equilibrado:
- Tratamento igualitário entre as nações – Todos os países, independentemente de tamanho ou poder, devem ter os mesmos direitos e oportunidades.
- Respeito ao Direito Internacional – A ONU deve ser o guia para as relações internacionais, sem imposição de regras unilaterais.
- Fortalecimento do multilateralismo – Cooperação internacional deve substituir políticas de confronto entre blocos.
- Abertura e benefícios mútuos – A globalização econômica precisa ser inclusiva, sem protecionismo excessivo.
Relações China-EUA e impacto global
Wang Yi também abordou a relação com os Estados Unidos, afirmando que a China não deseja conflitos, mas responderá a qualquer tentativa de coerção econômica. Ele criticou tarifas arbitrárias e protecionismo, alertando que essas políticas prejudicam a estabilidade global.
Sobre a guerra na Ucrânia, Wang reiterou que a China defende negociações de paz e que sanções econômicas não devem ser usadas como ferramentas de pressão política. Ele ressaltou que Pequim mantém relações normais com Moscou e que as questões econômicas não podem ser politizadas.
A participação de Wang Yi na Conferência de Munique reforça o compromisso da China em atuar como mediadora global, fortalecendo parcerias internacionais e defendendo uma ordem mundial mais justa.
Uma proposta viável?
A cooperação entre Brasil e China na busca por uma solução pacífica para a guerra na Ucrânia reflete o esforço de ambos os países em fortalecer o multilateralismo e a diplomacia global.
Apesar das dificuldades em conquistar consenso internacional, a proposta Brasil-China segue como uma alternativa viável para desescalar o conflito e evitar uma crise ainda maior.
A defesa de Wang Yi por um mundo multipolar indica que a China continuará pressionando por reformas na governança global, desafiando a influência das potências ocidentais e promovendo a autonomia dos países do Sul Global.
A guerra na Ucrânia, longe de uma solução imediata, segue como um dos maiores desafios da geopolítica atual, e o papel de mediadores como Brasil e China pode ser essencial para construir um novo equilíbrio de poder internacional.