Continuo contando a história da Olivetti....
Toda a política de bem-estar dentro da Olivetti era alimentada por fundos criados com a participação e contribuição tanto da empresa como dos empregados e gerenciados por um conselho formado por representantes de todos os setores – e todos com poderes iguais de decisão.
Te podría interesar
O "stato sociale olivettiano" perderá importância na década de 70, quando será substituído pelas novas Leis Nacionais de proteção ao trabalhador.
Do ponto de vista da produção, os operários tinham voz e participação. Para exemplificar, conto o que ouvi em um documentário onde entrevistavam vários ex-funcionários da Olivetti: em dado momento foi decidido que uma das etapas da produção seria feita com o modelo “linha de produção 'fordiana' tradicional (como no filme 'Tempos Modernos” de Chaplin')". Segundo os cálculos dos técnicos, o tempo empregado para aquela etapa podia ser reduzido de oito minutos e menos de um minuto. Mas os empregados conseguiram provar, depois de algum tempo, que o modelo era contraproducente, que gerava perda de material, erros, produtos mal-acabados e stress. A direção da empresa ouviu o que os operários relatavam e juntos decidiram que cada funcionário daquele setor deveria estar envolvido numa parte maior do processo, se responsabilizar por uma etapa mais complexa da produção, e os engenheiros responsáveis reconheceram que era melhor para a fábrica e não tiveram pruridos de mudar o processo. Havia inteligência. Havia participação e responsabilidade. Havia crescimento interno porque os chefes eram formados dentro da empresa. Havia principalmente o sentimento de “pertencimento”. Os funcionários sentiam que a fábrica era sua também.
Te podría interesar
Houve um momento de crise de “superprodução” e, ao invés de demitir operários, Adriano Olivetti decidiu aumentar e profissionalizar seu quadro de vendedores. Ampliou a capacidade de venda de seus produtos criando o que depois conheceremos como “Marketing”. Pois é, ele inventou isso, de entender o mercado, de preparar e qualificar seus vendedores para atender diferentes necessidades de diferentes possíveis clientes.
Sobre o espaço da fábrica, todas as salas eram envidraçadas, inclusive as de reuniões, e todos podiam ser vistos. As salas de dirigentes não estavam em locais ou prédios separados, mas próximos da linha de produção. A ideia era facilitar a interação de todos.
A presença de vidros e de transparência tinha várias justificativas, além de permitir de se ver uns aos outros: era para ter luz natural e contato visível com a paisagem. Segundo a ideia de Olivetti, o contato visual com o campo que rodeava a fábrica devolvia ao homem parte da serenidade que o trabalho repetitivo roubava e facilitava a relação dos operários com o território.
O pertencimento não era só do empregado em relação a fábrica, mas da comunidade, da cidade, em relação a empresa. E isso explica o que é o “comunitarismo” cujos princípios giravam não só na transparência nas relações trabalhistas, mas na relação com a cidade, sua comunidade e seu território. A fábrica fazia parte do território e com ele devia estabelecer uma relação de simbiose. Deveriam trocar recursos e, sem o respeito ao território e ao homem, não haveria futuro. A fábrica era “fruto” da comunidade e devia respeito a ela.
Vocês precisam de um tempo para suspirar?
Olha o que fizemos com a fábrica (transferida para a China, Paquistão, Vietnã, Romenia) e com o operário (terceirizado e empurrado para a periferia do processo e da cidade)!
Ivrea foi o cenário da “arquitetura olivettiana”, que concebeu tanto a estrutura dos edifícios dedicados a produção, como uma grande zona residencial de apartamentos desenhados por grandes arquitetos italianos, especialmente construídos para empregados e dirigentes.
Na ausência de transporte público, a Olivetti criou uma rede de transporte gratuito para os empregados e familiares. Era quase uma “cidade” Olivetti, onde a Fábrica cumpria o papel de ponto de encontro e de troca cultural porque era ali, exatamente no chão da fábrica, que se apresentam grupos teatrais, se organizavam mostras de cinema, se desfrutava das possibilidades oferecidas por um centro cultural e uma biblioteca. Em uma oportunidade, o responsável pela biblioteca reclamou que muitos livros emprestados não voltavam, eram “roubados”. Adriano respondeu: “Ótimo! Sinal de que estão sendo lidos!”
Gente, isso parece um filme de ficção cientifica sobre um reino utópico, né? Mas não para aqui, quer dizer, hoje eu paro por aqui, mas a história Olivetti continuará no próximo capítulo.
Abraços!
*Esther Rapoport é graduada em História pela Universidade de São Paulo, mas se dedicou nos últimos 40 anos à indústria do Turismo, tendo trabalhado em diversas empresas do setor além de oferecer palestras e cursos para profissionais do turismo e viajantes curiosos, interessados em ampliar seu repertorio sobre a História dos mais variados destinos do planeta. Mora atualmente na Alemanha
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum