Apenas um capítulo sobre comida italiana nunca será suficiente.
Então vamos em frente, tem muita coisa interessante para contar.
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Quem já ouviu falar que foi Marco Polo, famoso navegador italiano, que trouxe o macarrão da China para a Itália, lá nos idos de 1295?
Só que não... Essa foi uma lenda nascida e espalhada nos Estados Unidos, no século XX, por um lobby interessado na divulgação do produto no mercado local e nos incentivos a produção do trigo tipo “grano duro”
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A origem, ou as origens, são outras.
Os romanos, como alguns povos pré-históricos, já conheciam a técnica de misturar a farinha de trigo com água, sem fermento, e fazer esse mingau virar alimento. O que eles fizeram de diferente foi esticar a massa em uma folha fina chamada de “lagana”, (termo que vem do grego “laganoz”), deixar secar e cozinhar. Alguém, um dia, cozinhou a tal da lagana no forno e inventou a “lasanha”.
Mas a pasta italiana, como conhecemos hoje, provavelmente nasceu na Sicília, que era um Emirado árabe até o final do primeiro milênio da era cristã. Ou seja, não foram os chineses, e nem mesmo os árabes que inventaram a pasta. Possivelmente foram eles que trouxeram o conhecimento da pasta que já existia na Pérsia, onde provavelmente os primeiros agricultores fizeram a experiência da mistura da farinha. Na verdade, acho que foram todos. Sabe aquelas coisas quase iguais que vários povos inventam ao mesmo tempo? Pois, então, na Sicília eles misturaram a farinha com água e cortavam em forma de fios, chamado pela palavra árabe “itriyah”. Os árabes tinham muita experiencia de viajar muitos dias pelo deserto e tinham o know how de como secar os alimentos para a viagem. Ainda hoje, na região de Palermo, essa pasta é chamada de “vermicelli di Tria”.
O que era muito fascinante no Mediterrâneo fenício-greco-romano-árabe era a profusão de gentes diferentes, de costumes diferentes, de sabores e artes variadas, um verdadeiro Melting pot de culturas. Roma era um grande centro comercial e de consumo que absorveu tudo que era novo e diverso, proveniente de todos os cantos, sem tentar se impor ou se apossar da autoria.
A importância da pasta, que já era notável no sistema alimentar italiano medieval, foi ficando ainda mais importante na vida dos povos da Península.
Começou em Nápoles, sob governo espanhol, quando a pobreza cresceu e faltavam carnes e verduras para povo comer. Sobraram os carboidratos. O pão e a pasta viraram a “piece de resistance” na mesa napolitana e o napolitano ganhará mais tarde, quando emigrar para a América, o apelido de “mangiamaccheroni”.
Atenção, até aí não existia o tomate!! Essa fruta americana, pomodoro (maçã de ouro), chegou mais tarde no território napolitano, vindo da América via Espanha e daí distribuída pelos territórios do Império espanhol, que incluía o Reino das Duas Sicílias, no século XVIII para o XIX.
Foi no período medieval que se estabeleceram alguns elementos fundamental da cultura da “pasta”, que no Brasil, ainda identificamos genericamente como “macarrão”.
O primeiro elemento de diferenciação é o formato: curto, longo, largo, estreito, liso, ondulado. Depois o modo de cozimento. Se a “lasanha” romana era cozida ao forno junto com seus recheios e condimentos, a pasta medieval era cozida na água ou na sopa, as vezes no leite.
Além disso, tem o tipo do grão, que produz a pasta seca ou a pasta ao ovo. No sul da Itália se produz o grão duro, cuja farinha liga bem com a água e fica fácil cortar e secar. Já no centro e norte da Península, o grão disponível é o tenero, macio, que precisa do ovo para dar consistência.
A pasta all’uovo é um produto típico da região emiliana, especialmente o tagliatelle, que normalmente é servido com um molho “ragu alla bolognesa”. E é bom explicar: ragu é o molho feito com carne desfiada e tomate e bolognesa é apenas o seu sobrenome, em homenagem a cidade que o inventou.
Cuidado, então, se chegar na Itália e pedir um macarrão a bolonhesa, provavelmente vai passar fome ou vergonha .... tem que pedir um tagliatelle al ragu!
E bom apetite!!
P.S. ahhh ... ainda não sabe por que o uniforme dos times italianos é azul?? Explico: o azul vem da bandeira dos Savoia, aquela família real que arquitetou a unificação da Itália. A cor que homenageia a unificação!
*Esther Rapoport é graduada em História pela Universidade de São Paulo, mas se dedicou nos últimos 40 anos à indústria do Turismo, tendo trabalhado em diversas empresas do setor além de oferecer palestras e cursos para profissionais do turismo e viajantes curiosos, interessados em ampliar seu repertorio sobre a História dos mais variados destinos do planeta. Mora atualmente na Alemanha
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum