Hoje vou fazer um outro pouporri, mas não é de gente, é de empresas, e como tenho certeza que ninguém quer que eu fique listando as maiores e melhores empresas do mundo da Alemanha, que iria acabar depois da próxima pandemia, vou contar apenas sobre algumas que me surpreenderam.
Todo mundo sabe que a Volkswagen é alemã, ou a BMW ou a Telefunken, mas escolhi algumas empresas que faz pouco tempo descobri que eram alemãs.
Começo pela Beiersdorf. Nome bem alemão... Alguém aí já conhecia esse nome?
Acho difícil conhecer a empresa, mas todo mundo conhece as marcas que ela produz: NIVEA, Eurecin, La Praine e o famoso Labello, que se você pronunciar Labéllo, vai pensar que é uma marca italiana, e se falar Labellô vai achar que é francesa.
A empresa foi criada em Hamburgo, em 1882 e o Labello foi lançado em 1909, antes do creme Nivea, que nasceu em 1911.
Tudo ia super bem, abrindo filiais e subsidiárias em vários países, até que os nazistas chegaram ao poder, em 1933, e vários membros da diretoria, inclusive seu presidente na época, que eram judeus, tiveram que se desligar do negócio e emigrar. A Beiersdorf tentou se manter afastada do nazismo, mas a guerra deixou as plantas fabris destruídas e, após a rendição alemã, várias subsidiarias haviam sido expropriadas e a empresa havia perdido inclusive o direito da marca Nivea. No pós guerra a empresa se relançou e, piano piano, com muita injeção de capital (Marshall) e a criação de novos produtos, foi retomando o caminho do crescimento.
E já que estamos na área da beleza, que tal falarmos da Wella, que eu achava que era brasileira!! Só que não, ela nasceu em 1880, na região chamada Saxônia, que depois da Segunda Guerra Mundial seria parte da Alemanha Oriental, por um cabelereiro, o Sr. Ströher, que fazia a rede de base de perucas. Na medida que as perucas foram saindo de moda, na década de 20, os filhos do Sr. Ströher, que herdaram a firma, inventaram outra coisa: um produto para ondular o cabelo, de forma permanente, ou seja, a nossa conhecida “permanente” e criou o nome Wella, a partir da palavra “Dauerwellapparat”, que significa "dispositivo de onda permanente", a maquininha de tortura que fazia os rolinhos se encherem daquele produto hiper forte que enrolava as madeixas.
Como sempre, na história das empresas alemãs, a gente tem que ler o que foi até 1930, e o que vai ser depois de 1950. Neste caso, os irmãos Ströher eram anti-nazistas e, impotentes, viram suas instalações se tornarem fabricas para equipamento de guerra. Depois da guerra, e com a transformação daquele território na República Democrática Alemã, a empresa foi expropriada, mas os irmãos se instalaram no lado ocidental e reabriram uma nova empresa Wella do zero. O resto da história está no Google.
Mudando de área, tem uma empresa que eu achava que era norte-americana: Faber Castell. Uma empresa que pertence a mesma família por nove gerações!
Tudo começou com um marceneiro, Kaspar Faber, em 1761, na Alemanha, que resolveu produzir lápis seguindo uma técnica inglesa antiga de prender um pedaço de grafite dentro de uma estrutura de madeira.
Foi passando a empresa de pai para filho e para neto, mas foi o bisneto que teve oportunidade de viajar pela Europa e ter contato com outras empresas, aprender novas técnicas, investir em outros segmentos, ganhar muita grana, contribuir com iniciativas sociais para finalmente ganhar o título nobiliário de Barão e se tornar um VON Faber, Lothar von Faber.
Mas quando sua neta, Ottilie, se casou com o Conde Alexander zu Castell-Rüdenhausen, em 1898, mudou o nome da empresa para Faber-Castell. Isso foi em 1900 e até o brasão da família entrou no logotipo da empresa.
Na lista de seus consumidores está nada menos que Van Gogh, que teria feito uma bela publicidade do material, lá no finalzinho do século XIX.
Tenho que fazer um destaque importantíssimo nessa história, que é a ligação da Faber Castell com o Brasil. Na década de 20, foi criada uma fábrica de lápis em São Carlos, cujo proprietário era o suíço Germano Fehr. Este cara acabou vendendo parte da empresa para Johann Faber, que coincidentemente era irmão do Lothar von Faber. Quando a Faber Castell avisou que ia se instalar no Brasil, Johann Faber resolveu oferecer ao irmão a maior parte da empresa paulista que, após ser comprada por ele, tornou-se a principal filial do Faber Castell e base do seu projeto de reflorestamento e desenvolvimento sustentável. Atualmente a Faber Castell é considerada a maior fabricante de lápis do mundo.
E depois do lápis vem a caneta. Hora de apresentar a outra empresa alemã que eu achava que fosse francesa, ou suíça: a Mont Blanc.
Pois é alemã, nascida em Hamburg no início do século XX, com o nome de Simplo Filler Pen Co. GmbH, e que produzia as primeiras canetas tinteiro com cartucho de tinta interno. Foi só em 1934 que a empresa assumiu o nome de seu novo lançamento, a chiquetésima Mont Blanc, cujo símbolo, a estrela num fundo branco, significa o céu sob o cume nevado da Montanha.
Mas a marca alemã que mais me surpreendeu porque pelo nome e pelo produto podia ser italiana ou brasileira, é a Melitta. Sua história é pitoresca, porque escapa dos laboratórios de físicos, químicos e engenheiros, e entra na cozinha da Dona Melitta Benz.
O Sr. Benz reclamava toda manhã que o gosto do café que a Dona Melitta coava na sua velha meia ... brincando .. no seu filtro de pano, era horrível. Cansada desse contínuo nhenhenhe, ela resolveu arrancar uma folha do caderno do seu filho, um tipo de mata-borrão, prender no fundo de uma panela que ela tinha furado com um prego, e coar aí o café daquela manhã. Seu marido, que aposto não tinha nunca viajado para a Itália, exclamou: Benhê, o café hoje está ótimo!!
Estava criado o primeiro filtro de papel. E estávamos em 1908.
A criação doméstica foi evoluindo e mudando de forma quando os químicos e os físicos se sentaram para conversar com os engenheiros para descobrir como economizar no papel, sem perder no sabor. Foi assim que ela conquistou a Europa e o mundo, não só com filtros, mas depois com a venda do pó, torrado e moído em diferentes filiais. Hoje a empresa é administrada pelos herdeiros, os bisnetos da Dona Melitta.
Tem uma torrefação deles em Bremen, perto de onde eu trabalhava. No final da tarde o cheiro do café torrando fica pairando no ar de forma perturbadora, reavivando a lembrança do café coado no coador de pano, do pão francês ainda morno, servidos na cozinha de casa, no bairro do Pari, mais de cinco décadas atrás.
Com essa lembrança encerro a primeira coleção textos sobre Alemanha, porque acho que tem histórias de outros países que merecem ser contadas. Mas não se preocupem que depois eu volto para falar mais da terra do Deutsch.
Porém, estava pensando em relembrar os anos que morei na Itália... o que vocês acham??
Abraços!
*Esther Rapoport é graduada em História pela Universidade de São Paulo, mas se dedicou nos últimos 40 anos à indústria do Turismo, tendo trabalhado em diversas empresas do setor além de oferecer palestras e cursos para profissionais do turismo e viajantes curiosos, interessados em ampliar seu repertorio sobre a História dos mais variados destinos do planeta. Mora atualmente na Alemanha
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