O país africano que está enfrentando a Meta, de Mark Zuckerberg
Acusações contra a big tech variam de comportamento anticompetitivo e publicidade não autorizada a violações graves das leis de proteção de dados; entenda o embate
Controladora do Facebook, Instagram e WhatsApp, a Meta disse que pode encerrar seus serviços na Nigéria devido a problemas enfrentados com autoridades reguladoras do país. Em 2025, três agências governamentais do país já multaram a companhia de Mark Zuckerberg com somas milionárias.
A Autoridade Federal de Concorrência aplicou uma sanção de US$ 220 milhões, enquanto o Conselho Regulador de Publicidade da Nigéria multou a empresa em US$ 37,5 milhões e a Comissão Nigeriana de Proteção de Dados (NDPC), em US$ 32,8 milhões. O total chega a aproximadamente US$ 290,3 milhões. As acusações variam de comportamento anticompetitivo e publicidade não autorizada a violações graves das leis de proteção de dados.
Diante das sanções, a Meta recorreu ao Tribunal Federal Superior em Abuja, uma das principais cortes de primeira instância da Nigéria, mas teve seu recursos rejeitados. Com o prazo de pagamento se aproximando, em junho, as tensões estão aumentando.
Regras de proteção de dados são "impraticáveis", diz Meta
Segundo documentos judiciais obtidos pelo site The Africa Report, a Meta afirma que as exigências nigerianas se baseiam em uma "interpretação equivocada" das leis de privacidade. Além da restrição sobre a transferência de dados, a NDPC exige que a Meta adicione links visíveis em suas plataformas, com vídeos educativos sobre riscos de práticas abusivas de dados, conteúdos que seriam produzidos com ONGs e universidades locais. Esses vídeos devem alertar os usuários sobre práticas de processamento de dados que podem representar ameaças financeiras e à saúde.
A empresa argumenta que essas regras impõem um ônus desproporcional às suas operações e podem tornar inviável a continuidade do Facebook e Instagram na Nigéria. "A Meta pode ser forçada a encerrar efetivamente seus serviços no país", alegou a companhia.
As plataformas da Meta estão entre as mais usadas na Nigéria. O WhatsApp, por exemplo, conta com cerca de 51 milhões de usuários e os aplicativos têm se mostrado particularmente úteis para pequenos empresários que desejam vender para seus clientes.
Soberania digital
Embora a Meta argumente que o suposto excesso regulatório ameaçaria a viabilidade de suas operações, a posição da Nigéria reflete um sentimento crescente nos mercados emergentes no sentido de assegurar a chamada soberania digital.
À medida que as economias africanas se digitalizam, as autoridades nacionais exigem maior controle sobre os fluxos de dados, a proteção do consumidor e a responsabilização das plataformas, aponta o arquiteto sênior de Soluções e Software Valter Cumbi.
"Regulamentação excessiva pode desestimular investimentos e restringir o acesso a serviços vitais. No entanto, a supervisão insuficiente pode deixar os usuários vulneráveis à exploração. O desafio reside na elaboração de estruturas de políticas digitais com visão de futuro que protejam a privacidade dos dados e, ao mesmo tempo, promovam o crescimento e a inclusão", pontua Cumbi, em artigo publicado no site Further África.
Ele acredita que, para a Nigéria, este é um momento decisivo. "O país pode liderar o continente na definição da regulamentação da privacidade de dados na África — mas somente se garantir que a aplicação da lei permaneça transparente, justa e proporcional. A Meta, por sua vez, deve se envolver de forma construtiva, respeitando as estruturas legais locais e reconhecendo a crescente maturidade digital da África", aponta.
Histórico de embates entre Meta e governo nigeriano
Esta não é a primeira vez que a Meta entra em conflito com autoridades da Nigéria. Em 2024, a companhia ameaçou tirar o WhatsApp do país após ser multada em US$ 220 milhões. Mesmo após recorrer, o Tribunal de Concorrência manteve a multa e acrescentou mais US$ 35 mil em honorários. Atualmente, a empresa responde a processos em três tribunais federais nigerianos.
E não é só na Nigéria que a Meta enfrenta problemas. Nos EUA, a empresa é acusada de ter construído um monopólio ilegal de mídia social quando adquiriu o Instagram e o WhatsApp. As aquisições teriam sido motivadas pela intenção de eliminar potenciais concorrentes, segundo a Comissão Federal de Comércio dos Estados Unidos (FTC, na sigla em inglês).
"A UE [União Europeia] aplica multas semelhantes, mas nunca há ameaças de bloquear o acesso às plataformas digitais. Que curioso", ironiza a consultora em Tecnologia e Sociedade Phumzile Van Damme, em seu perfil no X.