Um estudo publicado na revista Nature Communications nesta terça-feira (18) traz uma visão interessante sobre o desenvolvimento da linguagem nos seres humanos e sua associação a um gene específico: o NOVA1, que se acredita ter contribuído com o surgimento e a consolidação do Homo sapiens como espécie dominante entre os hominídeos.
Robert Darnell, um dos autores responsáveis pelo estudo, tem estudado a proteína NOVA1 há décadas, desde o começo dos anos 1990. Junto a cientistas de um laboratório novaiorquino, o pesquisador pôde trabalhar com a tecnologia de "edição de genes" para "substituir a proteína NOVA1 encontrada em ratos [de laboratório] pelo tipo exclusivo dos seres humanos", a fim de "testar os efeitos, na vida real, dessa variante genética".
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A partir dessa substituição, a pesquisa investigou as mudanças avistadas no comportamento dos ratos, que experimentaram um efeito inteiramente novo na maneira como se comunicavam uns com os outros.
De acordo com o estudo, os ratos filhotes modificados geneticamente passaram a ter um modo diferente de grunhir para suas mães, e os ratos adultos implantados com essa nova variante de NOVA1 "chiavam diferente de seus equivalentes normais quando viam uma fêmea no cio".
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A NOVA1 atua principalmente nos neurônios, regulando genes da sinapse e a plasticidade neuronal. Pesquisas genéticas mostram que os seres humanos modernos têm uma variação dessa proteína muito diferente daquela encontrada nos seus ancestrais neandertais e denisovanos, o que pode indicar seu papel na evolução do cérebro humano e no desenvolvimento cognitivo da espécie — inclusive no desenvolvimento da linguagem.
Uma pesquisa britânica de 2001 chegou a associar o papel genético do NOVA1 a "distúrbios de linguagem", isto é, uma disfunção do gene estaria diretamente relacionada a uma menor capacidade de comunicação.
A variante moderna do NOVA1 só pode ser encontrada entre a espécie humana, e está ligada também a fatores anatômicos, como características da garganta e de certas áreas do cérebro que evoluíram juntas para permitir a fala e a compreensão da linguagem entre humanos.
O experimento
A substituição do aminoácido I197V na proteína NOVA1 dos ratos, para criar neles a variação exclusiva dos humanos modernos, alterou os padrões de vocalização nos animais geneticamente modificados com essa variante. Os espécimes de laboratório passaram a emitir ruídos diferentes — sobretudo os machos adultos em contato com fêmeas no cio: "Mais de 90% das vocalizações vieram dos machos", diz o estudo.
Eles pareciam emitir "chamados mais longos", com uma "modulação diferenciada" em termos de frequência. Também passaram a apresentar vocalizações mais variadas. A mudança não foi, explica o estudo, na quantidade das vocalizações, mas no seu aspecto qualitativo.
Além disso, a alteração genética não causou qualquer dano ao desenvolvimento anatômico e neuronal dos ratos testados.
Os resultados do estudo sugerem que a mudança no gene da proteína NOVA1 pode ter influenciado a regulação neural da vocalização nos ratos, ou seja, afetado seus circuitos cerebrais e alterado a forma como modulam os sons que emitem.
Isso parece reforçar a hipótese, de longa data, de que o gene foi essencial na evolução da comunicação verbal entre os seres humanos.