CÂMARA FEDERAL

"Foi tentativa de golpe", diz Lindbergh após Hugo Motta negar 8/1 e acenar a Bolsonaro

Sucessor de Lira na Presidência da Câmara rasgou a pele de cordeiro, que o fez conquistar 444 votos, criticou Lula e articula manobra com bolsonaristas para alterar Lei da Ficha Limpa e colocar ex-presidente na disputa presidencial em 2026

Lula e Hugo Motta na abertura do ano do judiciário no STF.Créditos: Marina Ramos / Câmara dos Deputados
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Líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ) reagiu às declarações do novo presidente da casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), que afirmou em entrevista à rádio Arapuan FM, de João Pessoa (PB), que o 8 de Janeiro de 2023 não foi uma tentativa de golpe.

“O que aconteceu não pode se repetir. Foi uma agressão às instituições, algo inimaginável. Acho que ninguém esperava que aquilo pudesse ocorrer. Agora, querer chamar de golpe é exagero. Um golpe precisa de um líder, de alguém que o estimule, além do apoio de outras instituições, como as Forças Armadas. E isso não aconteceu,”, disse Motta na tarde desta sexta-feira (7).

Em sua fala, o sucessor de Arthur Lira (PP-AL) ignorou o fato de que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) chegou a reunir os comandantes das Forças Armadas no Palácio da Alvorada para pedir guarida para o golpe.

Em vídeo divulgado nas redes sociais, Lindbergh foi explícito ao dizer que "o 8 de janeiro foi parte da tentativa de golpe contra a democracia" e listou fatos investigados pela Polícia Federal que comprovam a intentona bolsonarista.

"O 8 de janeiro foi uma tentativa de golpe e é importante contextualizar, ele não está isolado. Veja bem: nós temos depoimentos à PF do comandante do Exército, do comandante da Aeronáutica do Bolsonaro falando claramente que participaram da reunião com Bolsonaro, tinha minuta do golpe que falava em prisão do Alexandre de Moraes e anulação das eleições. Os comandantes do Exército e da Aeronáutica não toparam. O da Marinha topava. Ai começou a operação Punhal Verde e Amarelo, comandado pelo general Braga Netto. Tinha um plano de assassinar Alexandre de Moraes, Lula e Alckmin. Era tudo tentativa de golpe. O 8 de janeiro foi a última tentativa deles", diz o líder do PT na Câmara.

Vice-líder do PT na Câmara, Rogério Correia (MG), classificou a fala de Motta como "negacionismo inaceitável" e pregou "sem anistia" aos golpistas em comunicado .

"Dizer que o bolsonarismo não tentou um golpe contra a democracia é de um negacionismo inaceitável. Não vale um relatório de mil páginas aprovado no Congresso via CPMI? Não valem os múltiplos indiciamentos pela PF após provas e delações? Não valem as minutas golpistas na sede do PL? Não valem as bombas colocadas no aeroporto de Brasília e os planos de assassinato de Lula, Alckmin e Moraes? Os Kids Pretos? A quebradeira dos três Poderes? Os inúmeros financiadores da barbárie? E os vários discursos golpistas do inelegível? Não vale nada do que assistimos?", indagou.

"Para ganhar uma eleição pode-se fazer promessas, mas nunca atos que coloquem em risco a democracia. Só podemos discuti-la hoje porque o golpe de JAIR MESSIAS BOLSONARO fracassou perante ao poder das nossas Instituições. Esse discurso não combina com lideranças que emergiram na democracia e que só exercem seu poder graças ao povo. Ainda estamos aqui, vigilantes", emendou Correia.

Bolsonaristas comemoram

Por outro lado, a declaração de Hugo Motta foi comemorada pelos bolsonaristas, que veem no atual presidente da Câmara um aliado para passar a Lei da Anistia ou mesmo alterar a Lei da Ficha Limpa e colocar o ex-presidente golpista na disputa das eleições presidenciais em 2026.

Braço político de Silas Malafaia e líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) articula um levante, convocando atos bolsonaristas em todo o país como forma de mostrar força e avançar com a anistia a Bolsonaro.

"Parabenizo o presidente Hugo Motta pela coragem e compromisso ao defender a anistia e enfrentar as injustiças do 8 de janeiro. Sua postura firme é um marco na luta contra perseguições políticas e arbitrariedades. O Brasil precisa de líderes que tenham coragem de encarar a verdade", escreveu Cavalcante nas redes sociais no fim da noite.

Líder da oposição e figura próxima ao clã Bolsonaro, Zucco (PL-RS) entrou em êxtase com a declaração do aliado na presidência da Câmara. 

"A questão da anistia, já nas declarações a gente vê que há o entendimento de se avançar na Câmara com Hugo Motta”, disse ao Estadão.

Pele de cordeiro

Antes da entrevista à rádio paraibana, Motta rasgou a pele de cordeiro e alfinetou Lula, comparando-o a Jair Bolsonaro (PL), em entrevista ao jornal O Globo nesta sexta-feira (7).

O deputado paraibano, que há seis dias obteve 444 votos para presidir a casa legislativa ao costurar um leque de apoios que foi do PL ao PT, também confirmou que o ex-presidente pediu para que ele pautasse a anistia para os golpistas do 8 de janeiro, incluindo ele próprio, e reafirmou que acha que a pena de inelegibilidade por 8 anos "é uma eternidade".

Sobre o PL da Anistia, Motta afirmou que é uma pauta que "cria tensão com o STF e Executivo", mas realçou que "enfrentará o tema", que fez parte da negociata com Bolsonaro para angariar os mais de 90 votos da bancada controlada pelo ex-presidente.

"Na conversa que eu tive com o presidente Bolsonaro, em um determinado momento, ele falou: “Eu queria que, se houver o acordo no colégio de líderes e se houver o ambiente na Casa, você não prejudique a pauta da anistia”. Na reunião com o PT, falaram: “Olha, essa pauta da anistia não pode andar. É uma pauta ruim e é uma pauta que nós não concordamos”. A nossa eleição foi construída do ponto de vista de uma convergência. Vamos sentindo o ambiente na Casa para que, a partir daí, se decida", disse Motta ao jornal da família Marinho, se referindo a Bolsonaro como "presidente" por mais de uma vez.

Em seguida, Motta voltou a citar Bolsonaro ao atacar a pena de 8 anos de inelegibilidade imposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) baseada na Lei da Ficha Limpa. PL do deputado Bibo Nunes (PL-RS) tenta mudar a lei para que o ex-presidente possa concorrer já em 2026.

"Se essa matéria for trazida, por exemplo, pelo PL, do presidente Jair Bolsonaro, vamos levar ao colégio de líderes. Agora, com eleição de dois em dois anos, não reconhecer que oito anos de inelegibilidade é muito tempo é não reconhecer a realidade democrática do país. Quatro eleições é uma eternidade", disse Motta, defendendo a mudança - e a possibilidade de abrandar a pena de Bolsonaro.

As mudanças na Lei da Ficha limpa proposta no PL do deputado gaúcho são o trunfo que Motta pretende usar para driblar a legislação e devolver a elegibilidade a Bolsonaro.

O presidente da Câmara tem criticado reiteradamente a pena de 8 anos fora das disputas eleitorais imposta pela Justiça ao presidente e o projeto prevê uma pena máxima de 2 anos de inelegibilidade.

Alfinetadas em Lula

Na entrevista a'O Globo, Motta aproveitou para alfinetar Lula, especialmente na pauta econômica. O novo presidente da Câmara criticou o governo ao dizer que falta "responsabilidade com os gastos públicos", segundo ele "uma pauta que o governo tem dificuldade em avançar".

Motta ainda sinalizou que deve criar dificuldades para colocar em pauta a isenção do isenção do imposto de renda a quem ganha até R$ 5 mil e desferiu um novo ataque ao governo usando o "cenário de alta dos alimentos" e sinalizando que Lula faz um "discurso populista, eleitoreiro", em um jargão comum na mídia neoliberal para atacar mandatários progressistas.

"Quem não quer aprovar isenção para a grande maioria da população? É pauta fácil de ser votada. Mas qual será a consequência? Vai trazer mais estabilidade fiscal? As pessoas estão recebendo o salário mínimo, mas não conseguem encher o prato em casa. Temos um cenário de alta de alimentos, com moeda fraca, poder de compra da população sendo corroído. Temos de encarar de maneira responsável e não estar atrás de discurso populista, eleitoreiro. Já vimos esse filme antes e ele não acaba bem".

Motta ainda alfinetou Lula pelas críticas à política econômica - focadas especialmente na alta da taxa Selic - dizendo que "isso não tem ajudado na condução da economia. E, por fim, comparou o presidente com Jair Bolsonaro (PL).

"Não podemos, em um país complexo como o Brasil, ficar refém de posicionamentos ideológicos. Quem mais precisa quer resultado. O governo precisa entender isso. Não adianta Lula fazer o que Bolsonaro fez e ficar o tempo todo falando para uma bolha que o faz errar. Não tem governo que traga crescimento sem discutir responsabilidade com as contas públicas", finalizou.
 

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