O tiro dos bolsonaristas saiu pela culatra. Ansiosos pela visita ao Brasil do relator especial para a liberdade de expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), para denunciarem a visão delirante sobre "Ditadura" no país, os parlamentares comandados por Jair Bolsonaro (PL) se frustraram e acusaram o representante do órgão, o advogado colombiano Pedro Vaca Villarreal, de "censura" na reunião realizada na tarde desta terça-feira (11).
A acusação se deu logo no início da reunião, quando representantes da OEA afirmaram que o encontro, em que os bolsonaristas prometeram denunciar a "perseguição" do judiciário, não deveria ser gravada.
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Prócer do Partido Novo, Marcel Van Hattem (Novo-RS), deu início ao chilique, surtando com o anúncio da orientação da comissão, acusando os representantes da OEA de censura.
“Não há nenhum ponto, no momento em que a vítima precisa da transparência, essa determinação que a reunião seja sigilosa. Nós já passamos por isso em Washington e não gostaríamos que aqui houvesse censura por parte da comissão justamente ouvindo as vítimas de censura", disse o deputado extremista, iniciando o chororô.
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Mais adiante, em relato a Villareal, Vam Hattem, surtou com o que acredita ser falta de celeridade da OEA para apurar as denúncias vazias e desconexas dos bolsonaristas.
“Na minha opinião, a OEA é parte do problema e não da solução", disse, acusando a organização de não se pronunciar desde 2019, quando Bolsonaro ainda estava no segundo ano de seu mandato. "Sou vítima de perseguição no Brasil e a OEA até agora não atendeu meu pedido de medida cautelar", emendou em outra parte do relato.
Durante a reunião, o representante da OEA ainda ouviu o chororô de outras figuras proeminentes do bolsonarismo como Gustavo Gayer (PL-GO), Bia Kicis (PL-DF) e Magno Malta (PL-ES).
Reunião com Moraes
No domingo (9), ao chegar ao Brasil, Pedro Vaca Villarreal, relator especial para a liberdade de expressão da CIDH, se reuniu com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, e com o ministro Alexandre de Moraes.
O próprio site do STF divulgou detalhes sobre a reunião, informando que "transcorreu em clima cordial".
De acordo com o Supremo, Barroso apresentou a Villarreal "o conjunto de fatos ocorridos no país que colocou em risco a institucionalidade e exigiu a firme atuação do Supremo".
"Entre estes fatos estavam incluídos discurso de parlamentar que defendia a agressão a ministros do Supremo, juntamente com inúmeras ofensas, e situações de risco democrático, como a politização das Forças Armadas, os ataques às instituições, além do incentivo a acampamentos que clamavam por golpe de Estado. Esse conjunto de fatos resultou nas invasões dos prédios dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023", diz o comunicado do STF.
O tribunal também informou que Barroso relatou ao relator da OEA o plano de golpe de Estado descoberto pela Polícia Federal (PF), que incluía o assassinato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do próprio Alexandre de Moraes.
Além disso, Barroso contextualizou as investigações e explicou as razões que levaram à suspensão temporária da rede social X no Brasil, após sucessivos descumprimentos de decisões judiciais e a retirada de seus representantes do país.
Moraes, por sua vez, detalhou a Villarreal o andamento das investigações sobre os ataques de 8 de janeiro, informando que cerca de 1.900 pessoas foram denunciadas e que, atualmente, 28 investigados estão com perfis bloqueados nas redes sociais por ordem do STF — oito no inquérito que apura ameaças ao Supremo, 10 no inquérito dos atos antidemocráticos e 10 no inquérito sobre a trama golpista.
"O ministro Alexandre de Moraes esclareceu ainda que, ao longo dos últimos cinco anos, cerca de 120 perfis [nas redes sociais] foram bloqueados, desfazendo a narrativa de um quadro generalizado de remoção de perfis. Em todos esses casos, houve acompanhamento da Procuradoria-Geral da República e das defesas, tendo havido mais de 70 recursos julgados em colegiado. Ou seja, em nenhum caso, os processos foram de natureza secreta para as partes envolvidas", destaca o comunicado do Supremo.
Frustração
Lideranças da extrema direita, como o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO), acreditavam que a missão da CIDH no Brasil poderia, de alguma forma, influenciar ou reverter decisões judiciais contra extremistas investigados.
"SOCORRO!! O vídeo mais importante da minha vida. O Brasil clama por socorro. Assista e compartilhe", escreveu Gayer ao divulgar um vídeo em inglês em que "denuncia" a inexistente prática de censura no Brasil, marcando o perfil de Pedro Vaca Villarreal no X (antigo Twitter). Outros bolsonaristas também publicaram conteúdos semelhantes, buscando atrair a atenção do relator da OEA.
Com uma agenda que inclui reuniões com parlamentares de extrema direita — muitos deles investigados por disseminação de desinformação e alvo do inquérito sobre a tentativa de golpe de Estado —, a missão da CIDH tem como objetivo "analisar a situação da liberdade de expressão no país", segundo comunicado oficial.