PEC 65/2023

PEC da ‘Privatização’ do Banco Central será analisada pela CCJ do Senado

O texto prevê a autonomia orçamentária da autarquia, o que na prática a coloca mais próxima dos interesses do mercado financeiro, para alegria da Faria Lima

Banco Central.Créditos: Leonardo Sá/Agência Senado
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A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado vai avaliar na próxima quarta-feira (11) a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65/2023. Apelidada de “PEC da Privatização do Banco Central” ou de “PEC da Faria Lima”, o texto prevê a autonomia orçamentária e financeira da autarquia, com a sua conversão em uma empresa pública com personalidade jurídica de direito privado.

Atualmente, o Banco Central é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Fazenda. Se aprovada, a PEC coloca o BC ainda mais próximo dos interesses do mercado financeiro e mais distante das necessidades da economia nacional.

A proposta seria votada uma semana atrás, em 3 de julho, mas um pedido de vista do senador Plínio Valério (PSDB), relator do projeto, adiou a discussão. Rogério Carvalho (PT-SE) ainda apresentou um requerimento para que o texto só voltasse a ser avaliado em 30 dias, mas acabou sendo voto vencido.

O que está na mesa é praticamente uma privatização do Banco Central e, se passar na CCJ, a PEC já teria pelo menos 42 senadores favoráveis. Para ser aprovada, precisaria de mais 7 votos.

A matéria proposta pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO) argumenta que o Banco Central, que já possui autonomia operacional, deve operar sem depender de repasses do Tesouro Nacional.

Segundo o relator Plínio Valério, o BC deve financiar suas atividades com receitas próprias geradas por seus ativos, cobrindo despesas com pessoal, custeio, investimentos e outras necessidades. A proposta limita reajustes salariais dos funcionários ao índice de inflação do ano anterior, requerendo autorização do Senado para ajustes acima desse índice.

Entre as mudanças previstas pelo texto está o regime de trabalho dos servidores do BC, que deixaria de ser regido pelo regime estatutário da União e passaria para a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Especialistas apontam impactos negativos

Ouvido pela Agência Brasil, Pedro Paulo Zaluth Bastos, professor de economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas-SP), aponta que se for aprovada a PEC pode prejudicar as funções públicas do BC e ocasionar a desestabilização da moeda.

“A PEC é uma espécie de privatização, tem cara de privatização. O que o Banco Central apura como, eventualmente, lucro, tem que ir para o Tesouro. Com a PEC, esse lucro pode deixar de ir para o Tesouro”, explicou o professor.

Entre outros efeitos sociais, a medida pode atrapalhar as políticas de pleno emprego, fundamentais para a política econômica do Governo Lula, que aposta na elevação dos padrões de consumo das famílias como meio de aquecer a economia brasileira.

“A PEC pode estimular o Banco Central a buscar lucro ao invés de realizar suas funções públicas. Movimentos que aumentariam o lucro do BC, como redução de juros ou desvalorização cambial, se chocam com o mandato público, que é de controlar a inflação”, acrescentou Bastos.

A favor do texto, pesa o argumento de que o Banco Central não mais precisaria recorrer ao Tesouro para fazer seus gastos e investimentos. Entre 2018 e 2023, os lucros da autarquia por senhoriagem (receita oriunda da emissão de moeda) foram de R$ 91 bilhões. Se a PEC estivesse em vigor, esses valores ficariam com o próprio BC.

“As melhores práticas internacionais recomendam que a permissão para uso da senhoriagem como fonte de financiamento seja acompanhada de regras para transferência de resultados da autoridade monetária para a autoridade fiscal (...) Outro ponto importante é estabelecer regra clara que evite a despedida imotivada como mecanismo de proteção dos futuros empregados do BC”, disse Plínio Valério.

Sonho da Faria Lima

Para Edemilson Paraná, professor de sociologia econômica da LUT University da Finlândia, a PEC fará com que o controle da política monetária nacional caia de vez nas mãos dos “grandes setores dominantes”, como bancos e instituições financeiras. Segundo sua análise, isso já ocorre de maneira menos explícita e intensa.

“Uma parte significativa dos gestores de alto nível do BC são ligados, direta ou indiretamente, às instituições financeiras. Alguns vieram delas antes e voltarão para elas depois dos seus mandatos. Então autonomia de quem? Autonomia do povo, autonomia da democracia, autonomia da decisão política soberana do país”, afirmou para a Agência Brasil.