O Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) criou um site em defesa dos ultraprocessados com apoio do governo de São Paulo. A plataforma "Alimentos industrializados", lançada em agosto de 2023, contradiz as recomendações de saúde pública e promove o consumo de alimentos industrializados ricos em gordura, açúcar e sódio. Embora afirme seguir “modelos internacionais de pesquisa”, o Ital, em comemoração aos seus 60 anos, lançou um site defendendo ultraprocessados, o que contradiz recomendações de saúde pública.
A vinculação do site à esfera governamental é evidente pela presença única de símbolos do Estado de São Paulo. Em uma campanha de quatro anos e meio, o instituto lançou 12 publicações para desacreditar os estudos que ligam o consumo de ultraprocessados a problemas de saúde.
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Embora práticos e atraentes em meio à correria do dia a dia, os alimentos ultraprocessados, como refeições prontas, salgadinhos, biscoitos e refrigerantes, representam um risco crescente para a saúde. Uma nova revisão, que reúne 45 estudos, publicada na revista científica The BMJ, revela uma associação preocupante entre o consumo desses produtos e o desenvolvimento de 32 doenças.
O trabalho, conduzido por pesquisadores dos Estados Unidos, Austrália, França e Irlanda, avalia não apenas os resultados, mas também a qualidade de cada estudo. A nova revisão, intitulada "guarda-chuva", representa um marco na investigação do impacto dos ultraprocessados na saúde. A análise, que reuniu dados de quase 10 milhões de pessoas, apresenta conclusões mais contundentes. Entre elas:
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- Aumento de 50% no risco de morte por doenças cardiovasculares
- Aumento de 53% no risco de transtornos mentais comuns
- Aumento de 48% no risco de ansiedade prevalente
- Aumento de 12% no risco de diabetes tipo 2 a cada 10% de aumento dos ultraprocessados na dieta.
Evidências sugestivas de:
- Aumento de 20% no risco de morte por qualquer causa.
- Aumento de 55% no risco de obesidade.
- Aumento de 41% no risco de problemas de sono.
- Aumento de 40% no risco de chiado no peito.
- Aumento de 20% no risco de depressão.
No Brasil, o caso é alarmante. Dados da última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do IBGE, revelam que os ultraprocessados já representam quase 20% da alimentação dos brasileiros. Em 2002/2003, esse percentual era de 12,6%. Ao mesmo tempo, a presença de alternativas mais saudáveis, como alimentos in natura ou minimamente processados, caiu quase 4%.
Fotos de alimentos naturais para divulgar informações erradas sobre ultraprocessados
Em sua publicação de 2018, 'Alimentos Industrializados - A Importância para a Sociedade Brasileira', o Ital desqualifica cientistas que criticam os ultraprocessados, rotulando-os como 'ativistas' guiados por 'mitos e ideologias'. Inclusive, o Ital, em suas publicações, nega a existência de uma categoria específica de alimentos como 'ultraprocessados', utilizando apenas o termo genérico 'alimentos industrializados' com imagens de alimentos in natura.
A aba “Mitos e Fatos”, por exemplo, utilizaria uma estratégia de marketing enganosa, apresentando fotos que induzem o consumidor a acreditar que alimentos naturais são tão processados quanto produtos industrializados. A Associação Brasileira das Indústrias de Biscoitos, Massas Alimentícias e Pães e Bolos Industrializados (Abimapi), representando a indústria de biscoitos, massas e pães, é a principal parceira do Ital nessas pesquisas, que visam, em última instância, 'provar' a saudabilidade de produtos que a própria associação fabrica.
O que diz a Ital
O Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital-Apta), uma das sete instituições de pesquisa da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, informa que o site, lançado em 30 de agosto de 2023, é fruto do trabalho da Plataforma de Inovação Tecnológica (PITec) com o Grupo de Tecnologia de Informação (GTI) da instituição.
Trata-se de uma parceria público-privada, que segue modelos internacionais de pesquisa, desenvolvimento e inovação.
Vale ressaltar que, o Governo de São Paulo conta com uma estrutura organizacional qualificada baseada em ciência e tecnologia de alimentos. Entre os projetos, alinhados à missão da SAA de promover a oferta sustentável de alimentos saudáveis e seguros, o Ital contribui para a evolução das áreas de alimentos, bebidas e embalagens através de pesquisa, desenvolvimento, inovação, assistência tecnológica, capacitação e difusão do conhecimento técnico-científico para o agronegócio, em benefício do consumidor e da sociedade.
O site, que ainda está no ar, até a publicação desta reportagem, conta com financiamentos e influenciados pela indústria alimentícia. Pesquisas sobre pizzas e hambúrgueres contam com o apoio da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), enquanto a de sorvetes tem a chancela da Associação Brasileira das Indústrias e do Setor de Sorvetes (Abis). A pesquisa sobre sucos e refrigerantes, por sua vez, é patrocinada pela Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes de Bebidas não Alcoólicas (Abir), que reúne gigantes como Coca-Cola e PepsiCo. O espaço da matéria segue em aberto para possíveis manifestações.
*Com informações de Repórter Brasil