APURAÇÃO

Obras do aeroporto de Porto Alegre fragilizaram sistema de proteção contra cheias, denuncia deputado

Documento revelados por Matheus Gomes mostram que a Fraport não atendeu às condições do DEP e criou um sistema de drenagem concorrente

Porto Alegre após inundações.Créditos: Reprodução/X/Governo do RS
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O deputado estadual Matheus Gomes (PSOL-RS) denunciou, nesta quinta-feira (27), que as obras para ampliar o Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, fragilizaram o sistema de proteção contra cheias da cidade. 

A denúncia foi feita com base em documentos do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) (extinto), Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE), da Fraport (concessionária do aeroporto), pareceres técnicos e atas de reuniões obtidos pelo deputado.

De acordo com os documentos, os problemas começaram em 2017, quando a Fraport iniciou, junto à Prefeitura de Porto Alegre, o processo para aprovar o Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) para ampliar a infraestrutura do aeroporto, como pista, novo terminal e o prédio do estacionamento.

O documento foi aprovado em 2018 pela Comissão de Análise Urbanística e Gerenciamento (CAUGE), comissão formada por várias secretarias da prefeitura, com base em uma série de diretrizes impostas por engenheiros do antigo DEP. A Fraport deveria seguir essas condições para preservar e qualificar o Sistema de Proteção Contra Cheias (SPCC), que passa dentro do aeroporto. Entre as condições, estava:

O efluente final do empreendimento deverá desaguar no canal aberto de arroio da Areia após o trecho de conduto forçado e seu lançamento ocorrerá no ponto onde houver capacidade de vazão para o escoamento total, para tanto deverá o empreendedor verificar a capacidade de seção entre o  aeroporto e o Rio Gravataí, caso a vazão seja insuficiente deverá promover a suas custas a ampliação da seção do trecho.

Porém, de acordo com documento da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Mobilidade Urbana (Smim) enviado à Procuradoria-Geral do Município, várias condições não foram atendidas ou as informações prestadas pela Fraport foram insatisfatórias

A SMIM ainda afirmou que a Fraport se negou a fazer as verificações necessárias, as interligações de drenagem, fornecer dados técnicos solicitados para verificação dos projetos, a atender o EVU e fazer a verificação hidráulica do trecho de Arroio de Areia. 

"Na prática, a empresa criou um sistema de drenagem concorrente ao SPCC. Um absurdo", afirmou o deputado. 

Porém, mesmo com a denúncia da secretaria, ocupantes de cargos comissionados da Secretaria de Desenvolvimento Econômico interromperam as análises das obras no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental. Assim, a Fraport inicou as obras sem atender às condições do EVU.

Outros documentos obtidos pelo deputado mostram que, durante todo o processo, os engenheiros do DEP tentaram alertar para os perigos que as obras da Fraport representariam para o Sistema de Proteção Contra Cheias de Porto Alegre, mas foram ignorados. Um dos documentos do DMAE mostra que as obras não foram fiscalizadas pela prefeitura durante todo o processo. 

Apenas em 2021 foi feita uma vistoria, onde os técnicos apontaram que as obras da Fraport criaram alteração na região e uma espécie de sistema de drenagem que disputava com o SPCC. "Nos chamou atenção também que o canal que conduz as águas de Arroio da Areia e da CB Silvio Brum descarrega dentro do conjunto de bacias de amortecimento lá construídas, causando assim uma relação de dependência que antes não existia", diz um trecho do documento.

Consequências das obras

Em sua denúncia, o deputado mostra as consequência das obras da Fraport para o enfraquecimento do SPCC em Porto Alegre e o prejuízo para a população. "Essas e outras alterações fizeram Porto Alegre perder a capacidade de planejamento da área, pois não se tem precisão sobre qual a contribuição das águas drenadas do Aeroporto ao Rio Gravataí e ao sistema de drenagem ordenado pelo SPCC. A prevenção foi pro ralo. É um escândalo", disse.

O parlamentar também informou que todos os documentos serão encaminhados ao Ministro da Reconstrução, Paulo Pimenta, à Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), que fiscaliza o contrato, ao MP-RS e ao Ministério Público Federal. "Não haverá reconstrução do RS sem responsabilizar os verdadeiros culpados", acrescentou o deputado.

Após a denúncia, o vereador Giovani Culau (PCdoB) informou que protocolou na Câmara de Porto Alegre uma Comissão Especial para investigar as obras feitas pela Fraport.

Para ter acesso aos documentos obtidos por Matheus Gomes, acesse os tweets completos do deputado: