A sociedade civil brasileira tem reagido com indignação ao avanço do Projeto de Lei 1904/24, que prevê pena de homicídio para quem interromper a gestação em casos previstos em lei, o chamado aborto legal, após 22 semanas de gestação.
Caso a matéria seja aprovada pelos parlamentares, a mulher ou criança vítima de estupro que fizer um aborto poderá pegar uma pena de até 20 anos de prisão. Hoje a pena para um estuprador chega, no máximo, a 12 anos de reclusão.
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Engrossam a fileira dos indignados com esse "PL dos Estupradores" a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, a Comissão Arns. A entidade divulgou uma nota na qual manifesta profunda indignação com a decisão da Câmara Federal, que aprovou nesta quarta-feira (12) o regime de urgência para a matéria.
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O resultado dessa votação significa que, agora, o projeto deve ser votado nas próximas sessões do Plenário da Casa, sem que precise passar por qualquer comissão e ser discutido entre os parlamentares ou a sociedade brasileira.
"Causa perplexidade ver a pressa com que esta casa parlamentar pretende tratar um tema complexo, que toca direitos já estabelecidos, abrindo caminho para a criminalização das mulheres que recorrem ao aborto legal – as gestantes com risco de vida, as vítimas de estupro e as gestantes de fetos anencefálicos", diz a nota.
O comunicado da Comissão Arns destaca que, caso seja aprovada, a proposição legislativa vai atingir, sobretudo, mulheres e meninas engravidadas por estupradores.
"Para eles, penas de até oito anos. Para elas, penas de até 20 anos, como para o homicídio, por interrupção da gravidez feita a partir de 22 semanas de gestação", compara. Enquanto isso, o próprio Código Penal Brasileiro não estabelece prazos para a realização do aborto legal.
"É uma infâmia contra as mulheres brasileiras, sobretudo com as adolescentes, que constituem parcela significativa dos casos de estupro no país. Fora isso, esta lei alcançará, como um alvo preciso, mulheres e meninas pobres, majoritariamente negras e moradoras das periferias, sempre carentes de acesso aos meios adequados para a interrupção da gravidez. É impossível tolerar tamanha injustiça!", apela a Comissão Arns.
A Comissão Arns finaliza a nota com enfático inconformismo e pede aos diferentes setores da sociedade civil que se mobilizem para barrar esta escalada obscurantista e aos parlamentares, a rejeição de um projeto que atropela direitos, fere a dignidade das mulheres, humilha a cidadania e ameaça a nossa democracia.
Leia aqui a nota da Comissão Arns.
Comissão Arns
A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns foi fundada em 2019 para dar visibilidade e acolhimento a graves violações da integridade física, da liberdade e da dignidade humana, especialmente as cometidas por agentes do estado contra pessoas e populações discriminadas, como negros, indígenas, quilombolas, pessoas LGBTQIA+, mulheres, jovens, comunidades urbanas ou rurais em situação de extrema pobreza.
A Comissão Arns foi criada por um grupo de ativistas, acadêmicos, jornalistas e ex-ministros da Justiça, inspirados pelo legado de Dom Paulo Evaristo Arns, cardeal e arcebispo de São Paulo que foi um destacado defensor dos direitos humanos durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985).
Dom Paulo foi um dos principais líderes religiosos e defensores dos direitos humanos no Brasil. Durante a ditadura militar, ele desempenhou um papel crucial na denúncia das violações dos direitos humanos, incluindo torturas, desaparecimentos forçados e assassinatos políticos. Sua atuação foi marcada pela criação do projeto "Brasil: Nunca Mais", que documentou a tortura e outras formas de repressão durante o regime militar.
A Comissão Arns foi criada em um contexto de crescente preocupação com a proteção dos direitos humanos no Brasil, especialmente diante de ameaças ao estado de direito e à democracia, durante o governo de extrema direita de Jair Bolsonaro. A fundação da Comissão foi uma resposta à necessidade de uma organização independente e dedicada à defesa dos direitos humanos.
A Comissão atua em várias frentes, incluindo a documentação e denúncia de violações dos direitos humanos, a defesa de políticas públicas inclusivas, e a promoção de debates e eventos para sensibilizar a sociedade sobre a importância dos direitos humanos. Também colabora com outras organizações nacionais e internacionais para fortalecer a rede de proteção aos direitos humanos.