O general Marco Antônio Freire Gomes declarou em depoimento à Polícia Federal que se colocou contrário à tentativa de golpe de Estado que impediria a posse de Lula (PT) e manteria Jair Bolsonaro (PL) no poder. O militar, ex-comandante do Exército, então passou a ser visto como uma espécie de “salvador da democracia” nos meios de comunicação. No entanto, há registros de que ele teria endossado os acampamentos golpistas armados na frente dos quartéis após as eleições de 2022.
Um desses registros, resgatado em matéria da Folha, é a nota intitulada “Às Instituições e ao Povo Brasileiro”, publicada em 11 de novembro de 2022, quando Lula já era presidente eleito e Bolsonaro vivia suas últimas semanas no Palácio do Planalto. Freire Gomes assinou a nota junto com o almirante Almir Garnier e o brigadeiro Baptista Júnior, os então comandantes da Marinha e Aeronáutica.
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O texto faz um endosso explícito de todo o movimento golpista que acontecia naquele contexto pós eleitoral. Entre os argumentos apresentados para defender a manutenção dos acampamentos, a nota dos generais recorria à Constituição Federal para dizer que era assegurada a “livre manifestação do pensamento”, a “liberdade de reunião pacífica” e a “liberdade de locomoção no território nacional”.
“Como forma essencial para o restabelecimento e a manutenção da paz social, cabe às autoridades da República, instituídas pelo Povo, o exercício do poder que 'Dele' emana, a imediata atenção a todas as demandas legais e legítimas da população, bem como a estrita observância das atribuições e dos limites de suas competências, nos termos da Constituição Federal e da legislação (…) Da mesma forma, reiteramos a crença na importância da independência dos Poderes, em particular do Legislativo, Casa do Povo, destinatário natural dos anseios e pleitos da população, em nome da qual legisla e atua, sempre na busca de corrigir possíveis arbitrariedades ou descaminhos autocráticos que possam colocar em risco o bem maior de nossa sociedade, qual seja, a sua Liberdade”, diz um trecho.
A nota foi lembrada no último dia 2 de março pelos investigadores que colheram o depoimento de Freire Gomes. Na ocasião, o general foi indagado se teria servido como um respaldo das Forças Armadas para a mobilização. O militar respondeu que essa interpretação seria equivocada e que o objetivo dos militares seria o de apontar que os manifestantes deveriam fazer suas cobranças ao parlamento, e não aos quartéis.
No entanto, conforme é possível interpretar a partir do texto e em especial o trecho destacado acima, não há qualquer possibilidade de se chegar à mesma conclusão do general apenas fazendo a leitura da nota. O discurso, assim como o do ex-presidente, é dúbio. Diz que o Legislativo é a “Casa do Povo” e “destinatário natural dos anseios da população”, sem mais explicações.
À época dos acontecimentos, a menção ao Poder Legislativo foi interpretada como uma espécie de indireta ao Poder Judiciário, especificamente ao Supremo Tribunal Federal que era – e ainda é – alvo dos bolsonaristas.