QUEM MANDOU MATAR MARIELLE?

Delação de Lessa está nas mãos de Raul Araújo, que votou contra a inelegibilidade de Bolsonaro

O ministro, que tem um alinhamento antigo com Jair Bolsonaro (PL), é o relator do caso no STJ e, ao que tudo indica, não deve proferir uma decisão monocrática sobre o tema.

Ronnie Lessa.Créditos: Reprodução/Jornal Nacional
Escrito en POLÍTICA el

Está nas mãos do ministro Raul Araújo, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a validação - ou não - do acordo de delação premiada firmado entre a Polícia Federal (PF) e o ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes.

O ministro, que tem um alinhamento antigo com Jair Bolsonaro (PL), é o relator do caso no STJ e, ao que tudo indica, não deve proferir uma decisão monocrática sobre o tema.

Araújo deve levar o caso à Corte Especial do STJ, composta pelos 15 ministros mais antigos e acionada comumente em casos de autoridades que perderam o foro privilegiado.

Novo corregedor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), desde a aposentadoria de Benedito Gonçalves, Araújo votou contra a inelegibilidade de Bolsonaro por crimes eleitorais nos dois julgamentos em que o ex-presidente foi condenado.

O ministro ainda acumula um histórico de votação favorável a Jair Bolsonaro.

Na primeira ação que condenou o ex-presidente à inelegibilidade -  que julgava a prática de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação de Bolsonaro durante uma reunião no Palácio do Alvorada com embaixadores estrangeiros, em 18 de julho de 2022 – Araújo afirmou que o discurso feito por Bolsonaro não teve influência negativa aos eleitores suficiente para dar lastro à decisão.

Em outubro passado, um segundo julgamento teve Bolsonaro como alvo. O TSE declarou inelegibilidade pela segunda vez e multa de R$ 425 mil por abuso de poder político e econômico, em referência ao uso de dinheiro público em campanha eleitoral no ato de 7 de setembro de 2022. 

Raul Araújo votou contra a decisão da inelegibilidade pois julgou improcedentes os pedidos feitos nas ações e representações. O placar final foi 5 a 2. Em ambos os casos, além dele, votou contra o ministro Kássio Nunes Marques.

Segundo mandante

Após Ronnie Lessa confirmar em suposto acordo de delação, ainda não homologado pela justiça, o nome do conselheiro do Tribunal de Contas do Estado Domingos Brazão foi apontado como um dos supostos mandantes do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, a Polícia Federal (PF) investiga um possível segundo suspeito de encomendar o crime.

O acordo de delação foi feito no fim do ano passado e a PF aguarda a homologação pelo Superior Tribunal de Justiça. Enquanto isso, os investigadores estariam buscando provas contra outros dois envolvidos no assassinato para concluir as investigações até 14 de março, quando o crime completa seis anos.

Desde o assassinato, em 2018, outras duas pessoas foram investigadas como mandante do crime, além de Domingos Brazão:  o ex-vereador Marcello Siciliano e o ex-bombeiro e também ex-vereador Cristiano Girão, que foi condenado por atuar na milícia.

Em delação já homologada pela Justiça, o também ex-PM Élcio Queiroz, que dirigia o carro que teria levado Lessa ao local do crime, apontou o nome de Brazão, que teria sido confirmado pelo executor do assassinato.

Uma das suspeitas é que o assassinato ocorreu por uma disputa de terras na zona oeste do Rio, onde atuam as milícias ligadas tanto ao clã Brazão, quanto ao clã Bolsonaro.

Marielle, segundo teria delatado Lessa, defendia a ocupação de terrenos por pessoas de baixa renda e queria que o processo fosse acompanhado por órgãos como o Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio e o Núcleo de Terra e Habitação, da Defensoria Pública do Rio.

O mandante - ou os mandantes -, por sua vez, buscava a regularização de um condomínio inteiro na região de Jacarepaguá sem respeitar o critério de área de interesse social, ou seja, o dono tinha renda superior à prevista em lei. O objetivo seria obter o título de propriedade para especulação imobiliária.

Delação

O advogado Bruno Castro, que defende o ex-PM Ronnie Lessa, afirmou que  seu cliente jamais negociou qualquer delação premiada ou citou Brazão em conversas. Também não teria assumido a autoria do crime. Pelo contrário, a tese da defesa é de que Lessa seria inocente.

“Nesses cinco anos em que acompanho o caso, jamais houve qualquer conversa minha com meu cliente sobre delação. Lá no começo, deixei muito claro para a família que meu escritório, por uma questão de ideologia jurídica, não faz delação premiada. Como Ronnie sempre afirmou que não havia sido ele [o autor dos disparos], esse assunto de delação jamais surgiu. Pelo menos comigo não [surgiu]”, declarou o profissional.

A versão vai de encontro à divulgada pela filha, Mohana Lessa, que disse se dedicar "101%" a provar a inocência do pai.

Em nota, Mohana vai além e diz que cortará relações com o pai, caso ele admita que assassinou Marielle para firmar o acordo.

Segundo ela, Lessa "garantiu sempre que era inocente" e que, por esse motivo, há quase cinco anos se dedica "101% a provar a inocência do meu pai no Caso Marielle e Anderson".

"Com os últimos acontecimentos, o que posso falar em nome de toda família é que: Se ele realmente cometeu esse crime, com toda dor no meu coração, nós não poderemos mais ter qualquer tipo de relação com ele. Essa atrocidade vai contra tudo o que somos e pensamos. E, se eu realmente perdi todo esse tempo tentando provar algo inexistente, não me restará escolha a não ser pedir que Deus o abençoe em seu caminho, que será longe do meu. Minha esperança para que tudo isso seja mentira continua acesa. Até o último segundo, eu preciso acreditar no melhor”, afirma no texto.

Marcelo Freixo

O presidente da Embratur, Marcelo Freixo, padrinho político da ex-vereadora, afirmou sem citar o nome de Lessa ou de sua suposta delação, estar “acompanhando de perto as notícias sobre o assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes. Quero reforçar a confiança e elogiar o trabalho da Polícia Federal, que com muita dedicação e responsabilidade tem avançado nas apurações”.

“A solução deste crime interessa a todos os brasileiros que acreditam na justiça e na democracia. Diante disso, quem fala sobre a investigação é quem investiga”, ressaltou.

Segundo Freixo, “cabe somente à PF se pronunciar sobre o caso quando julgar pertinente. Qualquer coisa diferente disso pode prejudicar o resultado da apuração. É desejo de todos nós descobrirmos de uma vez por todas quem mandou matar Marielle e qual a motivação do crime”.