Como já era de esperar, a ida do ministro Flávio Dino à Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (11) gerou ainda mais atritos com parlamentares bolsonaristas, a exemplo do que ocorreu a cerca de 10 dias na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Logo no início, uma série de deputados bolsonaristas acusavam o governo Lula de ser conivente com o crime organizado enquanto supostamente “persegue” os golpistas do 8 de janeiro. Mas nenhum deles chegou ao nível do deputado federal Paulo Bilynskyj (PL-SP), que usou uma comparação esdrúxula entre Lula, Mao Tse-Tung e Adolf Hitler para defender os interesses do lobby armamentista que opera no Brasil e foi afetado pelas políticas do novo governo.
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“Temos um prazo que vai de 7 a 8 meses em que lojas deixaram de vender armas e clubes de tiro deixaram de faturar e recolher tributos. Essa queda de faturamento chegou a 90%. Não existe no Brasil negócio algum que consiga sobreviver a uma queda de faturamento desta. Empregos foram perdidos e tributos deixaram de ser recolhidos por uma decisão que Vossa Excelência deixou claro em seu discurso de abertura que se trata de uma questão de visões diferentes de país, uma questão de programa de governo. O Estatuto do Desarmamento que regulamenta esse assunto foi votado nesta casa por representantes do povo, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, e já regulamentava várias das disposições que foram revogadas pelo decreto. O senhor então afirma que a vontade do povo pode ser revista a cada 4 anos, proibindo que o cidadão de bem tenha acesso a arma de fogo para autodefesa e que essa atividade econômica possa ser conduzida no Brasil. (...) Mao Tse-Tung, Adolf Hitler, Stalin, Fidel Castro e Lula, todos eles têm algo em comum: a vontade de desarmar o cidadão. Dentro desse contexto, o ministro acredita que o Estado brasileiro tem capacidade de proteger todos os seus cidadãos?”, disparou Bilynskyj em discurso que transparece cada ponto de preocupação do chamado lobby armamentista, além de trazer uma série de imprecisões históricas.
O ministro da Justiça e Segurança Pública respondeu a cada questionamento. Em primeiro lugar, tentou afirmar que a comparação do presidente Lula com as demais figuras históricas é indevida, o que gerou protestos do ativista pró-armas do parlamento. O presidente da Comissão precisou intervir para que Dino prosseguisse. É digno de nota, que ao contrário do que disse o deputado, Mao Tse-Tung na realidade incentivou o armamento civil no contexto da Revolução na China.
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“É uma comparação injusta porque não há pertinência biografia ou política dessas figuras históricas com o presidente Lula e também porque não houve, até o momento, apreensões de armas legais no Brasil. O que houve foi a apreensão de milhares de armas ilegais, que devem ser apreendidas e continuarão a ser. Não é questão de governo, mas de leis. Temos um conjunto de leis no Brasil que precisam ser cumpridas. Há diferenças que fazem parte do regime democrático. Eu confio nas polícias, acredito que merecem consideração e confiança. Mas há pessoas que não confiam na polícia e desejam instaurar um 'vale tudo' no Brasil. Nós não concordamos com isso. Na nossa ótica, estamos dando cumprimento à lei. E estamos bem acompanhados porque o decreto assinado pelo presidente da República foi confirmado pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 85. Não há como sequer debater a esta altura, em nenhuma instância, se o decreto está certo ou errado. Primeiro, porque ele existe. Segundo, foi emanado de uma autoridade competente. Terceiro, houve uma impugnação e ele teve sua constitucionalidade confirmada pelo máximo tribunal do país”, rebateu Dino.
Bilynskyj é um dos autores do Projeto de Decreto Legislativo que busca revogar o decreto de Lula e Dino que colocou um freio ao 'liberou geral' de Bolsonaro sobre o tema. Mas mais do que um delegado de polícia e militante da causa que chegou ao Congresso, e de ter um histórico de lamentáveis episódios correlacionados, ele também é dono de um clube de tiro.
Bilynskyj não declarou empresa ao TSE
Nesta terça-feira (11), horas antes da chegada de Dino á Comissão, a imprensa divulgou a notícia de que o deputado federal Paulo Bilynskyj teria omitido ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ser o sócio do clube de tiro Puma Tactical. Ele teria declarado à Corte Eleitoral, no ano passado, um patrimônio de R$ 455 mil, onde constariam um apartamento de R$ 400 mil e dois veículos de passeio.
No entanto, em registro do clube de tiro na Receita Federal feito em 2018, o deputado consta como um dos três sócios da empresa que funciona no bairro da Chácara Santo Antônio, área de classe média alta na zona sul de São Paulo. De acordo com apuração do Uol, nas redes sociais o clube oferece planos anuais de filiação que podem chegar a R$ 6 mil e facilidades na compra de armas e munições.
Quem é Paulo Bilynskyj
O ex-delegado e digital influencer bolsonarista e armamentista, Paulo Bilynskj, teve sua demissão aprovada pelo Conselho da Polícia Civil de São Paulo em julho do ano passado por incitar a violência política no 7 de setembro que se avizinhava, além de ter feito ameaças veladas a Lula, então ex-presidente e candidato. Segundo a corporação, o conjunto de vídeos de Bilynskyj também fazia apologia ao racismo e ao estupro.
Em publicações da época, feitas através dos stories, Bilynskyj fala em "lutar" para que "não dê merda" nas eleições enquanto aparece abrindo fogo. Em uma das postagens, diz que vai aos atos bolsonaristas no feriado de 7 de setembro junto a um vídeo em que dispara contra um alvo. "Não podemos deixar a esquerda voltar", declara em outra postagem.
Em outro vídeo, ele aparece como professor de "defesa armada" e tenta vender seu curso. Na peça, Bilynskyj mostra uma mulher branca sendo carregada por homens negros para dizer que a 'situação fica preta" para quem não se inscreve neste tipo de curso.
Meses antes, em maio de 2022, ele já havia ganhado holofotes ao divulgar em suas redes sociais um vídeo debochando da fala de Lula (PT) sobre transformar clubes de tiro em clubes de leitura. Com caixas de armas que simulam esteticamente livros, o delegado convidou o petista, de forma irônica, a conhecer seu ‘clube do livro’, em uma ameaça velada.
Em meio a repercussão dos seus absurdos, tanto nas redes sociais, como na imprensa que noticiou o processo administrativo que ocorreu na Polícia Civil, Bilynskyj aproveitou o momento para lançar sua candidatura à Câmara dos Deputados. Meses depois, era um dos 38 políticos eleitos com apoio do Proarmas no primeiro turno das eleições nacionais.
Ele também foi suspeito de ter assassinado a namorada, Priscila Delgado, em 2020. Bilynskj tinha 33 anos em 20 de maio de 2020 quando foi socorrido por vizinhos na porta do apartamento onde vivia com a mulher e levado para um hospital. Priscila, por sua vez, foi encontrada morta no banheiro do apartamento. À época, a Polícia Militar, mesmo após visitar o local, afirmou que não iria se manifestar e que informações poderiam ser procuradas na Secretaria de Segurança Pública (SSP). A SSP, por sua vez, disse que a investigação do caso ficaria a cargo da Corregedoria da Polícia Civil.
De acordo com sua versão, o delegado tomava banho quando a namorada entrou no banheiro atirando contra a sua pessoa, por haver se irritado com mensagens que encontrou no celular do companheiro. Ele foi baleado no abdôme mas teria conseguido fugir para o local onde foi encontrado enquanto a namorada teria se suicidado com um tiro no peito. A tese foi acatada pela Justiça e o delegado acabou absolvido.
No entanto, a família da vítima e especialistas forenses ouvidos na época ainda colocam dúvidas sobre a decisão. O próprio exame que mostraria se o delegado disparou ou não uma arma naquele dia acabou não sendo realizado.
Para o perito forense particular Eduardo Llanos, a ausência da prova residual “chama muito a atenção”. “É feito o exame residuográfico na maioria dos casos, mesmo nas mãos de vítimas feridas ou bandidos feridos quando levados a hospital”, disse ele à Ponte. “Não há como dar 100% de crédito à história que ele está contando. Por que omitir uma prova que pode confirmar a inocência do delegado?”, questionou à época.
Já cientista forense Sérgio Hernandez, também à época, mostrou uma opinião semelhante a de Llanos e destacou que quem teria que ter feito a solicitação dessa perícia é o delegado que registrou a ocorrência. “Houve negligência, omissão. Todos os casos balísticos, onde se efetue tiros de arma de fogo, tanto a vítima, como o suspeito, o agressor, eles devem passar pela coleta de resíduos, obrigatoriamente, para verificar se essas pessoas efetuaram ou não os tiros”, afirmou.
Os peritos ainda comentaram sobre possíveis roupas que Bilynskj estaria usando quando foi encontrado, uma vez que segundo sua versão ele teria corrido do chuveiro para fora do apartamento, e se estivesse vestido seria difícil confiar em sua história. Além disso, chamaram a atenção para a não realização de perícia do celular do então suspeito, para apurar se havia alguma troca de mensagens que pudesse despertar o ciúme da namorada, a fim de verificar sua versão dos fatos. As indagações dos especialistas à época deixaram dúvidas quanto à história, e a família da vítima naquele momento, em julho de 2022, negava a versão de suicídio. No entanto, o processo foi arquivado.