MODA E POLÍTICA

Harris se vestiu de poder e autoridade e abusou das caras e bocas no debate com Trump

Vice-presidenta e candidata democrata à Presidência dos EUA adotou figurino impecável e desestabilizou o adversário com expressões, risadas e olhares de desprezo

Créditos: Fotomontagem (Reprodução YouTube ABC News e Xinhua) - Kamala Harris, vestida de preto, usou e abusou de expressões faciais para desestabilizar Trump
Escrito en OPINIÃO el

A vice-presidenta e candidata à Presidência dos EUA, Kamala Harris, enfrentou pela primeira vez, e tudo indica que a única, o principal adversário, ex-presidente Donald Trump, durante debate na noite desta terça-feira (10).

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Para além das análises políticas sobre os discursos dos oponentes, este artigo tenta esmiuçar qual o impacto da roupa usada pela mulher que tenta ser a primeira a ocupar o cargo.

Homens em cargos políticos, de um modo geral, usam o mesmo uniforme, terno e gravata, e só mudam cores e texturas. Para esse debate na Filadélfia, na Pensilvânia, Trump escolheu um conjunto azul cobalto com uma gravata vermelha brilhante em referência à cor do seu partido, o Republicanos.

Já no caso das mulheres em cargos políticos, há uma vigilância constante sobre o vestuário delas. Com Kamala Harris não é diferente. Os trajes de campanha dela são escolhidos a dedo. 

Reprodução YouTube ABC News - Trump e Harris no debate

Na noite em que ficou frente a frente com o extremista republicano, ela optou por um terno preto feito sob medida, que carrega um simbologismo de poder, seriedade e autoridade. Também comunica profissionalismo e confiança e projeta uma imagem forte e decisiva. 

O terno preto é considerado um traje neutro e clássico, que evita distrações e permite que o foco fique nas mensagens e nas ideias apresentadas. Além disso, pode evocar um senso de formalidade e respeito, o que é essencial em eventos políticos de alta visibilidade.

Harris optou mais uma vez  por um decote lavallière - um estilo de gola que geralmente apresenta uma fita ou laço amarrado no pescoço, semelhante a uma gravata - branco. Esse tipo de silhueta remete ao estilo das blusas femininas clássicas, inspiradas nas gravatas usadas pelos homens no século 19. 

Este detalhe é muitas vezes associado a uma estética refinada e pode ser encontrado em blusas ou vestidos, criando um visual sofisticado e formal. O nome "lavallière" vem de Louise de La Vallière, uma amante do rei Luís XIV, que popularizou o uso de fitas no pescoço. 

Harris complementou a visual com brincos de pérola, uma de suas marcas registradas. A afinidade da democrata por essas gemas faz referência aos seus dias de irmandade em sua alma mater, a Universidade Howard. Ela era membra da Alpha Kappa Alpha, cuja joia característica é a pérola.

Construção de estilo durante a campanha

A vice-presidenta tem um visual característico, aprimorado ao longo de anos de trabalho como advogada e política. Desde o lançamento de sua candidatura presidencial em julho, ela tem assumido riscos estratégicos com seu estilo na campanha. 

A mudança mais óbvia foi uma expansão gradual de sua paleta de cores para incluir tons mais brilhantes e claros, como azul-claro e lilás, juntamente com os neutros amigáveis ao escritório que ela geralmente prefere.

Com sua corrida presidencial de 2024, Harris também parece ter dobrado seu compromisso de destacar marcas lideradas por mulheres e designers afro-estadunidenses. Em agosto, a candidata abriu e fechou a Convenção Nacional Democrata usando ternos Chloé personalizados, projetados pela recém-nomeada diretora criativa Chemena Kamali. 

Na primeira noite, Harris caminhou confiantemente no palco ostentando uma jaqueta de lã granulada de poudre "marrom coco", calças largas e uma blusa branca de crepe de chine lavallière da marca francesa, em uma possível homenagem ao terno bege que Barack Obama usou durante uma entrevista coletiva em 2014. 

Fotomontagem (DNC e Casa Branca) - O terno bege de Kamala Harris e o de Barack Obama

Na quarta noite da convenção, Harris evitou o branco sufragista em favor de um segundo terno Chloé — desta vez em azul-marinho — e uma blusa de risca de giz coordenada para aceitar a nomeação de seu partido para concorrer à Presidência dos EUA.

DNC - O estilo sóbrio no evento em que foi nomeada candidata democrata à Presidência dos EUA.

A estilista de Kamala Harris

Desde o início da campanha, Harris tem uma estilista de plantão, Leslie Fremar. A consultora de moda é conhecida por trabalhar com celebridades de alto perfil. Ela começou sua carreira como assistente de moda na revista Vogue e depois se tornou diretora de estilo na Prada.

Fremar construiu reputação ao criar visuais sofisticados e impactantes para estrelas em eventos importantes, como premiações e debates presidenciais. Ela já vestiu clientes como Charlize Theron, Scarlett Johansson e Reese Witherspoon, e é conhecida por sua abordagem elegante e minimalista no design.

O peso das roupas das mulheres na política

O peso das roupas de uma mulher como Harris durante um debate presidencial pode ser avaliado sob diferentes perspectivas:

Imagem e impressão pública: Roupas desempenham um papel significativo na forma como uma candidata é percebida pelo público. Durante um debate, a escolha de vestimenta pode refletir autoridade, confiança e profissionalismo, o que pode influenciar a opinião dos eleitores.

  • Simbolismo: A escolha das roupas, como o uso de cores específicas, pode ter um significado simbólico. Por exemplo, cores como azul ou branco podem remeter a patriotismo, ou a questões femininas, como o movimento sufragista. No caso do preto escolhido pela candidata.
     
  • Conforto: O conforto da roupa é essencial, pois um debate presidencial exige concentração, presença de espírito e energia. Roupas que proporcionem liberdade de movimento e não distraiam a candidata são fundamentais.
     
  • Cobertura da mídia: A mídia tende a focar tanto no conteúdo dos discursos quanto na aparência dos candidatos. A escolha das roupas pode ser amplamente comentada, moldando parte da narrativa após o debate.

O peso das roupas não é apenas uma questão de moda ou estilo, mas sim um elemento estratégico que pode impactar a imagem e a performance da candidata em um evento tão importante quanto um debate presidencial.

Caras e bocas miraram ego de Trump

Aliada à escolha de uma roupa que emanava poder e autoridade, a arma secreta de Harris foi ter lançado mão de uma estratégia sutil e eficaz e, ao invés de atacar o histórico ou as políticas do ex-presidente, ela ajustou a mira na maior vulnerabilidade do oponente: o ego. 

Ela deixou de lado pontos previsíveis, como declarações polêmicas e desmioladas e explorou a natureza primitiva e a masculinidade frágil de Trump. O republicano extremista está acostumado a atuar em ambientes controlados como comícios e redes sociais, onde raramente é desafiado ou ridicularizado. 

A vice-presidenta desmontou Trump com seus gestos, como risadas e olhares de desprezo, o que acabou desestabilizando o adversário de maneira inesperada. Ao longo de 90 minutos de debate, ela conseguiu romper o escudo de conforto do oponente.

O resultado foi que ela despertou a irritação e raiva de Trump. Ela questionou a lealdade dos trumpistas, chamou-o de "desgraça" entre líderes mundiais e sugeriu que sua fortuna foi herança de seu pai para desconstruir a enganosa imagem de um empresário que se fez sozinho. 

Vestida para arrasar, em uma estratégia calculada, Harris observou Trump se desestabilizar e, em vários momentos, causar prejuízo a sua própria imagem ao reagir impulsivamente.

Agora, vamos aguardar um improvável segundo duelo e, mais importante, se a roupa e as caras e bocas vão fazer diferença no resultado eleitoral de novembro.

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