Na live com o candidato derrotado no primeiro turno, Pablo Marçal, já no finalzinho, naquelas perguntas tipo ping-pong, o coach e entrevistador perguntou quem era Jesus para o candidato psolista, ao que Guilherme Boulos respondeu prontamente: “- Uma inspiração”. Para muitos que ainda não entendem essa conjunção esquerda-Jesus, digo sem medo de errar que a resposta de Boulos em nada me chocou ou me surpreendeu, já que é o que se percebe em sua luta e vida política. Senão, vejamos:
Boulos desde cedo decidiu ir viver entre os sem-teto e fazer disso a grande luta de sua vida: encarnar a luta pelo empobrecido, porém mais que discurso, o professor vivenciou a luta a partir de dentro, com o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). Para quem se lembra da narrativa do nascimento de Jesus, seus pais não encontram lugar em nenhuma hospedaria e Jesus nasce “de favor” numa estrebaria, “sem-teto” e, voltando pra sua casa, na periferia da Judeia, numa cidadezinha mal vista chamada Nazaré, logo tem que sair fugido e se tornar um exilado político e “sem-teto” numa outra realidade: no Egito.
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Ao fugir pro Egito, uma outra realidade se impõe na narrativa bíblica: Jesus não é o branco europeizado que a igreja católica (e depois a protestante) fez chegar até nós. Se era negro, não sei, mas branco de olhos claros, com certeza não. Jesus era um semita, da região do oriente médio fazendo fronteira com a ÁFRICA. Como um branco europeu iria se esconder no norte da África, se não queria ser encontrado? Jesus era um ser comum da sua região, um não-branco da periferia, exilado de sua terra natal por conta da perseguição política do império. Gente do tipo que Boulos conhece bem.
Quando se vê os posicionamentos políticos e históricos de Boulos, mais ainda se evidencia a inspiração que Jesus exerce sobre sua luta. Jesus também escolheu viver entre os mais pobres e lutar por seus direitos e acolhendo a todas as pessoas marginalizadas e excluídas. Numa de suas falas mais conhecidas dos Evangelhos, está a passagem que diz “vinde a mim todos vós que estais cansados e oprimidos.” Sim, Jesus nunca foi partidário dos opressores. Sua vida e ministério sempre foram voltados aos oprimidos. E é sempre bom lembrar: oprimido é uma palavra oriunda de opressão e opressão é a prática dos poderosos insensíveis e inescrupulosos.
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Além disso, Jesus deixa claro em vários momentos de sua vida de que lado ele estava (e está, a considerar que para nós, cristãos, Jesus ainda É). Bem-aventurados os pobres... os que têm fome e sede de justiça... os que choram... os que são perseguidos pelos poderosos que, inclusive, mentem para perseguir... os pacificadores (não os que defendem armas)... e é visto entre todos os marginalizados e excluídos da sociedade, como “publicanos” e prostitutas. Jesus é o “cara” que se sensibiliza com a dor do outro, que entende que “vida abundante” não é só uma coisa para “lá e além”, mas que pode começar aqui, através de políticas públicas e ações que levem a todas as pessoas, todos os direitos, em todo o tempo. Isso é Evangelho! Isso é Jesus! É isso que nos inspira!
Eu te entendo Boulos. O mesmo Jesus que te inspira é o que também tenho como modelo de vida e luta. Ainda que isso nos custe a cruz. Mas sempre lembrando que, para quem vive como Jesus, inspirado e motivado por ele, a cruz não é suficiente para nos parar. Nós somos do time das ressurreições. Como na canção-poema “Como la cigarra”, da argentina Maria Elena Walsh, majestosamente interpretada por Mercedes Sosa:
“Graças dou à desgraça
e à mão com um punhal
porque me matou tão mal
e eu segui cantando...”
Amém!