Em uma atitude canalha, característica que faz parte da personalidade de cada um de seus membros fundadores, o Movimento Brasil Livre, o chamado MBL, coloca em marcha mais um levante contra o padre Júlio Lancellotti, figura emblemática na caridade e fraternidade aos pobres e pessoas em situação de rua que vivem na região central de São Paulo, megalópole que expõe as mazelas do capitalismo selvagem em que vivemos - e que é defendido a unhas e dentes pela trupe de saudosistas de Margareth Tatcher.
A CPI das ONGs, que tem o religioso como foco e é levada a cabo pelo vereador Rubinho Nunes (União), fundador que se afastou misteriosamente do movimento, é a continuidade da campanha mentirosa e demoníaca do MBL contra Lancellotti.
Ao chafurdar na lama em meio a declaração em que dizia que “as ucranianas são fáceis porque são pobres” - uma demonstração do pensamento aporofóbico da trupe -, Arthur do Val tornou-se pratogonista de uma armação criminosa em que acusava o padre de pedofilia.
Segundo Fernando Dainese e Lucas Studart, ex-membros do MBL, Guto Zacarias, então assessor parlamentar de Do Val - que perdeu o mandato logo após o escândalo -, seria o responsável por uma "denúncia anônima" de pedofilia contra o padre.
Desvendada a farsa, agora o também fundador Rubinho Nunes retoma a perseguição ao padre, de forma oportunista e rasteira.
Filiado ao União, partido que apoia a reeleição de Ricardo Nunes (MDB) à prefeitura, Nunes chegou a acusar Lancellotti de "cafetão" no mais recente vídeo, enquanto esconde as relações com ONGs a quem destinou cerca de R$ 1,5 milhão para produção de festas. Organizações já denunciadas em um esquema de desvio de verbas.
No DNA
O oportunismo é uma característica que está na raiz do chamado Movimento Brasil Livre, surgido em 2014, na esteira dos atos desencadeados pelo Movimento Passe Livre, o MPL.
Rapidamente, o MBL assumiu o protagonismo e iniciou uma perseguição implacável - então com o auxílio da mídia liberal - contra Dilma Rousseff (PT).
Embora os fundadores tenham dito inicialmente que era apenas um movimento de comunicação e não se envolveriam em política, as máscaras caíram em pouco tempo, assim que Michel Temer (MDB) tomou o poder.
Acomodados em partidos de direita, como o antigo DEM, os membros fundadores do MBL partiram para a política comprando perfis de humor, que foram transformados em verdadeiras máquinas de destruir reputações.
O montante de dinheiro gasto pelo movimento ainda segue um mistério. Para alavancar as candidaturas em defesa do "livre mercado", o MBL teria tido, inclusive, financiamento internacional dos irmãos David e Charles Koch, que financiam quaisquer aventureiros que defendam o neoliberalismo mundo afora.
Para isso, os coordenadores do movimento passaram por treinamento no Students for Liberty, organização que é financiada pelos irmãos Koch. A informação foi confirmada por kim Kataguiri.
Rede de desinformação
A estrutura criada nas redes sociais pelo MBL foi a matriz do gabinete do ódio de Jair Bolsonaro (PL), ao lado de quem os fundadores se enfileiraram prontamente para eleger em 2018, quando o Facebook excluiu 196 páginas e 87 contas do Brasil que classificou como integrantes de uma "rede de desinformação".
Seis dessas páginas eram ligadas ao Movimento Brasil Livre, como os perfis dos militantes Renato Battista e Thomaz Henrique Barbosa, e a página de um dos coordenadores nacionais do grupo, Renan Santos.
Um dos maiores expoentes do movimento, Renan Santos foi alvo de mais de 60 processos, incluindo fechamento fraudulento de empresas, dívidas fiscais, fraude contra credores, calote em pagamento de dívidas trabalhistas e ações de danos morais, segundo informações da Folha de S.Paulo.
De acordo com levantamento feito pelo El País Brasil ainda em setembro de 2017, os membros da família Santos ligados ao MBL através da associação privada "Movimento de Renovação Nacional", respondem por mais de 125 processos. Em 2022, segundo o Metrópoles, Renan Santos devia mais de R$ 6 milhões à União, entre tributos federais e multas trabalhistas.
Renan foi quem acompanhou Arthur do Val na chamada por ele mesmo de "Tour du Blond", uma viagem pelos países europeus "só pra pegar loira", mais especificamente em cidades interioranas de menor poder aquisitivo.
Em entrevista à Monark - que poderia fazer parte do movimento - Santos se gabou de falar sueco, alegando que fazia uso deste conhecimento para a prática do que chamou de um jogo, ou "game", de "xavecar gringas".
Vencidos pela Fórum
Defensores da falácia classificada pelo neofascismo como Escola Sem Partido - como uma forma de cooptar jovens despolitizados -, o MBL está por trás de uma série de invasões a universidades de forma violenta, o que está na raiz da violência desencadeada nas escolas.
Em novembro deste ano, a Fórum derrotou na Justiça o MBL, Kim Kataguiri e Renan Santos, que processaram o site alegando danos morais em razão de um artigo em que o editor, Renato Rovai, afirma que "a violência nas escolas é responsabilidade de quem jogou alunos contra professores: Bolsonaro e MBL".
Alegando danos morais, os autores pediram direito de resposta e uma indenização de R$ 30 mil. No entanto, a juíza Rejane Rodrigues refutou as alegações de Kim Kataguiri e Renan Santos, defendeu a liberdade de expressão jornalística e destacou os episódios relatados na matéria alvo da ação, em que o MBL invadiu escolas e intimidou professores.
"A matéria jornalística [...] aduz ser necessário cessar a onda de violência em escolas. Após, assevera que os autores [Kim Kataguiri e Renan Santos] e outros em 2016 invadiam escolas e pediam que os alunos filmassem os professores, incentivando o debate e a exposição, o que, segundo o jornalista, acaba por fomentar a violência", destaca a magistrada.
Além disso, a magistrada afirma em sua decisão que "o editorial e o texto não atribuíram autoria formal aos autores, tão-só criticaram a postura adotada pelos autores e a forma pela qual ela contribui para a animosidade e a violência".
Em seguida, é lembrado que o MBL tem atuação favorável "à revogação do Estatuto do Desarmamento, à aceitação do ensino doméstico e à aprovação do projeto 'Escola Sem Partido', princípios de amplo conhecimento, o que dispensa a dilação probatória. Logo, apontar tais posturas como favorecedoras de animosidade e da violência é opinião do jornalista, consistindo em visão crítica que deve ser aceita ante o debate dos temas".
"Portanto, não se pode dizer que a reportagem gerou danos à imagem dos autores, mormente por não se cuidar de notícia acerca de um fato, mas de exposição da visão pessoal do jornalista com base em fatos. O estímulo ao debate sobre a forma de agir de movimentos políticos e sociais, por mais que ganhe contornos ríspidos, não pode ser alçado de ilícito capaz de impor o dever de indenizar", afirma a magistrada.
A juiza afirma ainda que a Fórum e o jornalista Renato Rovai "comprovaram que integrantes do MBL ingressaram em escolas, em 2016 e 2017, não só para verificar as condições dos locais, mas também o conteúdo das aulas ministradas [...] o que corrobora a assertiva do jornalista quanto ao fato usado como premissa para a conclusão de seu raciocínio".
Assim como no caso das violência nas escolas, o MBL também é responsável pelos ataques sórdidos e a perseguição contra o padre Júlio Lancellotti, que corre risco diante de uma trupe de garotos mimados que se colocam como bastião do criminoso sistema neoliberal de aniquilar pessoas pobres.