CARLOS CASTELO

O dia em que a ida de Latininho ao Faustão provocou a vendagem de um livro

O adolescente com síndrome de Seckel fez a audiência explodir, mas o programa foi alvo de inúmeras críticas

Bailarinas.Créditos: Openverse
Escrito en OPINIÃO el

Em oito de setembro de 1996, um adolescente de 15 anos chamado Rafael Pereira dos Santos, que tinha 87 centímetros de altura e sofria da síndrome de Seckel, compareceu ao Domingão do Faustão. O jovem se fantasiou de cantor Latino e dançou com o artista no palco.

Apesar de conseguir 30 pontos de audiência, a aparição gerou críticas a Faustão por romper com o "padrão Globo de qualidade" e usar táticas sensacionalistas para ganhar audiência. Em resposta, o apresentador disse que a necessidade de competir por espectadores o levou a tomar tal decisão.

Toda a grita em torno de Latininho fez com que a produção do Domingão buscasse, dali em diante, pautas mais “culturais”. Foi nesse clima que, na semana seguinte, o jornalista Edson Aran e eu desembarcamos no Rio para sermos entrevistados por Fausto Silva. O assunto: nossa brochura, feita a quatro mãos, "Aqui jaz – o livro dos epitáfios", lançada poucos dias antes pela editora Ática.

Foi uma experiência e tanto. Nos camarins conosco estavam Xuxa, Paquitas, Beto Carrero e uma baleia orca num tanque de acrílico. Fora um catarinense imitador de passarinhos. Estou certo de que nunca dois escritores privaram de companhia tão diversa às suas atividades artísticas.

Momentos antes de entrar na ribalta, fiquei olhando as bailarinas rebolando acima de mim na arquibancada. Comecei a ficar tonto, imaginando que seria visto, na sequência, por milhões de indivíduos.

Foi quando surgiu o cabo-man posicionando o microfone de lapela no paletó. Talvez percebendo minha tensão, declarou, em sotaque guanabarino:

- Aê, ó: tu num é artista? Então entra lá e bota pra gemê, irmão!

Persignei-me, pedi a São Genésio que me iluminasse, e fui. Passamos um longo tempo falando sobre o livro e criando epitáfios, em tempo real, para todos os membros do conjunto do Caçulinha.

Esqueci-me completamente do que Faustão nos perguntou. Mas funcionou. No final daquela semana, "Aqui Jaz" vendeu duas edições. Muita coisa para um livro de humor, ainda mais na Botocúndia.

Não parou aí: Marília Gabriela decidiu ler os epitáfios de seus convidados que estavam no livro; a revista Exame VIP criou um hotsite exclusivo sobre a obra, com links até para o cemitério parisiense Père-LaChaise.

Se não fosse Latininho, certamente eu nunca teria pisado naquele palco. Mas, orra, meu, o Faustão também poderia ter escolhido outro livro para divulgar. Fica assim, registrado nesta crônica, o meu agradecimento ao apresentador e os votos de que tenha um pronto restabelecimento.

Para concluir, deixo um conselho aos aspirantes a escritor: se querem mesmo vender livro no Brasil, esqueçam a Flip e foquem no Faustão.