A Força de Defesa de Israel (IDF, da sigla em inglês) oferece alternativa vegana de trajes militares para soldados e soldadas, que podem optar por usar boinas e botas feitas com material livre de crueldade animal.
Em 2021 o Estado de Israel foi o primeiro do mundo a proibir o uso de peles. Ao assinar a lei que proíbe a venda, incluindo a importação e exportação, de peles de animais naquele país, a ministra de Proteção ao Meio Ambiente de Israel, Gila Gamliel, hoje ministra de Inteligência, declarou:
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Usar a pele e os pelos de animais selvagens para a indústria da moda é imoral e certamente desnecessário. Casacos de pele de animais não podem encobrir a indústria de assassinatos brutais de quem os fabrica.
Desde o dia 7 de outubro, ela se mantém ativa nas redes com comentários sobre as atrocidades cometidas pelo grupo Hamas.
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I was interviewed this morning at @TimesRadio and spoke again about the atrocities committed by the monsters of Hamas, the whole world should recognize the truth and give complete support to Israel to crush the terrorism in Gaza.#Hamas_is_ISIS pic.twitter.com/8MS0ak2Twr
— ???? ?????? - Gila Gamliel (@GilaGamliel) October 19, 2023
No dia 9 de outubro, o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, anunciou que seu país passou a impedir o fornecimento de água, gás, combustíveis e alimentos à região palestina. Também fez comentário racista ao comparar o povo palestino a animais.
Estamos impondo um cerco total à Gaza (...) nem eletricidade, nem comida, nem água, nem gás, tudo bloqueado. Estamos lutando contra animais e agimos em conformidade.''
Nesta quinta-feira (19) Gallant anunciou encontro com o ministro da Defesa da Alemanha, Boris Pistorius, que, como fez questão de lembrar o ministro, faz parte da OTAN.
Germany is a NATO and European leader. In visiting Israel during the war, German Minister of Defense Boris Pistorius sent a strong message to the world: stand with Israel. @BMVg_Bundeswehr pic.twitter.com/SOO2axtdq1 — ???? ???? - Yoav Gallant (@yoavgallant) October 19, 2023
Tel Aviv, um paraíso para veganos
Além dos uniformes veganos das tropas israelenses, fruto de um movimento em defesa dos direitos dos animais robusto na sociedade daquele país, a capital do país é considerada a Capital do Veganismo.
Segundo a Tel Aviv Global & Tourism, em 2020, a cada dez residentes de Tel Aviv-Yafo, um era vegano ou vegetariano, ou seja, 45 mil de 450 mil residentes da cidade. A pesquisa também mostrou que 5% dos israelenses se dizem veganos, 4% vegetarianos e 8% semi-vegetarianos (comem peixe), ou seja, 17% da população do país.
Israel também tem um nicho de moda vegana interessante.
O DYI Tel Aviv, em um guia para veganos 2023 informa que cada vez mais designers locais de calçados e bolsas optam por oferecer pelo menos alguns produtos veganos, enquanto outros são conscientemente 100% veganos. São indicadas três opções locais:
- Roni Kantor - roupas inspiradas em vintage e sapatos e bolsas 100% veganos. Recentemente, fechou sua loja física, mas envia para todo o mundo através de seu site.
- Shani Bar - Designer local de calçados com uma seleção de estilos veganos.
- Story - Uma cadeia de lojas de moda com principalmente moda importada. Você pode comprar sapatos veganos da marca Melissa lá.
Outro exemplo é o trabalho da marca Algaeing, que desenvolveu um tecido biodegradável, não tóxico e de baixo consumo energético - usando algas.
Sua fórmula de algas pode ser usada para criar fibras naturais e corantes, utilizando menos água do que os produtos convencionais, e produzindo zero resíduos e poluição.
Ferramenta para forjar percepções
Essas histórias e experiências progressistas, como uma marca de moda preocupada com o meio ambiente, estão no dia a dia das pessoas, como as roupas que vestem, as séries e filmes que assistem, os livros que lêem, as músicas que escutam e a visão que têm de mundo.
Na política internacional, além dos aspectos tradicionais como território, soberania e população, a construção de narrativas que justifiquem e legitimem a existência dos Estados desempenha um papel fundamental, é o softpower.
Por exemplo, raríssimas são as séries policiais, militares e de ação estadunidenses que não tenha pelo menos um episódio dedicado à amizade EUA-Israel. Na mesma medida, a perseguição de árabes malvados, muçulmanos fanatizados e por aí vai.
Ou histórias como as de uma popular modelo israelense no OnlyFans que se juntou às IDF, após ser convocada como reservista, para atuar na resposta israelense ao ataque terrorista promovido pelo Hamas no sul do país.
Além de fazer sucesso na plataforma erótica, Natalia Fadeev também é famosa cosplay no Instagram, especialmente da Barbie. A israelense posta também imagens dela segurando vários tipos de armas. Fotos dela ilustram esta matéria.
Diplomacia na passarela
No caso da moda, durante o principal evento fashion do país, a Kornit Fashion Week Tel Aviv 2022, o nome por trás do desenvolvimento da moda israelense o empresário Motty Reif fez um convite inédito e simbólico.
Ele foi o responsável pela presença da estilista dos Emirados Árabes Unidos, Mona El Mansouri, se tornasse a primeira árabe a apresentar uma coleção em território israelense. A apresentação foi homenagem ao ano e meio de normalização das relações de Israel com os Emirados Árabes Unidos.
Um pouco mais de um ano depois dessa celebração de amizade israelense-emiradense, o tom de violência do conflito em Gaza não para de aumentar.
Durante uma guerra como a de agora, que toma conta do noticiário pelas tevês ou internet, os canais estão recheados de depoimentos de pessoas que estão na área de conflito.
Como em Gaza não tem estabilidade da infraestrutura básica, como água, luz, abrigo e comida, as histórias são contadas, principalmente, pelo povo de Israel. Em geral, os que falam pelo povo palestino estão fora da região.
Há raros relatos com vozes palestinas. A primeira entrevista de um líder do Hamas na mídia brasileira foi publicada aqui na Fórum. Trabalho impecável de Mauro Lopes. Vale muito ler:
Hamas à Fórum: “ação do dia 7 foi ato de defesa”; “estamos chocados com o Brasil, esperávamos mais"
Nesse processo de construir sua própria imagem, o Estado de Israel captura os frutos do ativismo da sociedade civil daquele país e embala em discurso democrático, respeitador dos direitos humanos e das minorias, dos animais, em defesa do meio ambiente etc.
Redwashing e pinkwashing
A socióloga e professora Berenice Bento, no artigo publicado em junho e 2012 Redwashing y pinkwashing: discursos de “izquierda” en defensa de Israel explica esse fenômeno.
Vale a pena examinar duas estratégias discursivas utilizadas pelo Estado de Israel, conhecidas como "pinkwashing" e "redwashing", como parte de seus esforços para consolidar sua posição na arena internacional. Em ambas as estratégias, há a notável presença de um ideal de defesa dos direitos humanos (pinkwashing) e da justiça social (redwashing).
Berenice comenta ainda no texto que o Estado de Israel se apropria da agenda da luta das populações LGBTQIA+ como um meio de se apresentar como alinhado a valores liberais e progressistas.
Essas estratégias discursivas têm gerado debates intensos sobre a política israelense e suas implicações no cenário internacional. Elas refletem não apenas a busca por legitimação, mas também a complexa interseção entre questões de identidade, direitos humanos e diplomacia.
A professora comenta no artigo que para ela é um mistério que um Estado que mantém uma política colonial brutal usufrua de tanto prestígio como uma nação democrática. Inclusive entre ativistas de movimentos sociais e pessoas de partido de esquerda.
A decisão dos judeus europeus e do leste europeu de estabelecer um Estado-nação na Palestina, sem considerar as pessoas que já viviam lá, tem como base a construção da cultura árabe como algo inexpressivo pelo Ocidente.
O artigo completo, em espanhol, você pode ler neste link.
Moda e sua dimensão geopolítica
A poderosa indústria da moda opera além das passarelas. Para além do valor simbólico de uma peça que usamos, as roupas, calçados e acessórios que vestimos percorrem uma cadeia de suprimentos complexa e imbricada.
Das plantações de algodão na Índia ou no noroeste da China, nas fábricas têxteis de Bangladesh ou Vietnã, nas petrolíferas que fornecem matéria-prima para o poliéster na Rússia, no mercado consumista dos EUA, nos lixões de resíduos têxteis em Gana ou no Chile, o mercado de segunda mão sufocado da Guatemala e nas rotas comerciais marítimas do Mar do Sul da China.
A roupa que você veste não nasceu em um cabide. O jeito que ela é feita revela as entranhas do sistema capitalista e colonialista. O colosso da moda só existe graças ao cultivo de algodão por mão-de-obra escravizada em colônia, que gerou recursos suficientes para a primeira revolução industrial.
No colonialismo do século XXI, a disputa pela atenção e empatia da opinião pública passa também pelo olhar que lançamos sobre os modos de viver, o jeito que os povos que observamos se vestem e se comportam de acordo com nossas medidas ocidentais. Talvez por isso, a IDF e sua possibilidade vegana seja tão romantizada e atraente para a audiência ocidental.