Com o objetivo de analisar a realidade da região Amazônica e propor ações de resistência e lutar pelos povos que nela habitam, foi realizado na semana passada o 10º Fórum Pan-Amazônico (Fospa), na simbólica cidade de Belém, no Pará. Digo simbólica porque a capital paraense faz parte de um dos estados com maiores índices de desmatamento da Amazônia brasileira, por conta da gana do capitalismo em razão da mineração e de grandes projetos como a construção de complexos portuários e hidroelétricas, a exemplo da Usina de Belo Monte, na bacia do Rio Xingu.
Durante quatro dias de debates em torno da defesa do meio ambiente e da vida, o evento surpreendeu com a diversidade de grupos e entidades representativas que prestigiaram o encontro. Cerca de 10 mil pessoas participaram do Fospa, dentre representantes quilombolas, indígenas, ribeirinhos, movimentos populares e sociais, além de organizações da sociedade civil de vários países da Pan-Amazônia, que integra o Brasil, Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, além de outros países da Europa e Ásia. Consideramos fundamental a presença de movimentos populares urbanos no debate sobre a Amazônia e o meio ambiente, pois o processo de acumulação de capital que destrói os biomas é o mesmo que concentra terra, renda e riqueza nas cidades, e somente pela articulação entre lutadores da floresta, do campo e da cidade, pela construção conjunta de estratégias de enfretamento e defesa de direitos, alcançaremos formas solidárias de relação com a natureza.
Com essa inspiração, foram realizadas mais de 260 atividades no Fospa, entre rodas de conversa, atos em homenagem aos defensores da floresta e manifestações contra o fascismo, o autoritarismo, o genocídio ambiental e o fundamentalismo. A Marcha de abertura deu o tom do evento e apontou os caminhos que devemos percorrer em defesa da emancipação humana e do meio ambiente. Nas ruas, o que se viu foi um desejo incontrolável de resistir à extração das riquezas da Amazônia, que tem provocado um processo sem precedentes de destruição, deixando os povos que vivem na região das florestas em situação de extrema violência, fome e miséria.
A gravidade do desmatamento da Região Amazônica e as principais causas dos crimes cometidos nos últimos anos contra o meio ambiente foram detalhadas nas mais diversas mesas de debates do Fospa, que teve como tema central “O Esperançar das Amazônias”. Infelizmente, o Brasil vive um governo de direita ultraliberal, que viola direitos e não tem nenhuma perspectiva na defesa da Amazônia, da floresta e de seus povos. Bolsonaro se aproxima do final de seu governo marcado pela impunidade (e o estímulo) a crimes ambientais, além dos retrocessos em políticas públicas na preservação do meio ambiente. Ao longo de sua gestão, suas decisões favoreceram a atividade pecuária, projetos de extração de madeira, mineração e grilagem de terras públicas. A Amazônia é um dos lugares que mais tem sofrido com os impactos da “antipolítica” ambiental do governo Bolsonaro. Por incentivo dele, os índices de desmatamento são alarmantes hoje no Brasil.
Dados recentes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que, no primeiro semestre do ano, 3.988 quilômetros quadrados de floresta foram desmatados na região. A área acumulada de derrubadas é a maior já registrada no período desde o início da série histórica, em 2016. O mês de junho também teve a pior marca da série histórica. Foram desmatados 1.120 quilômetros de floresta amazônica, 5,5% mais do que se derrubou no mesmo mês do ano passado (1.061 quilômetros quadrados) e 7,4% mais que em 2020 (1.043 quilômetros quadrados).
O avanço brutal da exploração da natureza na Amazônia, aliada ao desmonte de órgãos de proteção ambiental, têm aumentado a criminalidade na região e colocado em risco a vida dos povos originários, dos defensores dos direitos humanos e da população local como um todo. A região da Amazônia é rica em biodiversidade e abriga inúmeras comunidades indígenas. Pela sua riqueza e localização, reunindo sete países, a região é alvo constante de garimpeiros, grileiros, narcotraficantes, madeireiros, pescadores e caçadores ilegais. Recentemente, o Brasil e mundo ficaram devastados com os assassinatos do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, no Vale do Javari, no Amazonas. É contra a todo esse “ecogenocídio”, do avanço da mineração, do agronegócio, que nos colocamos à disposição para lutar. É preciso dar um basta para que a vida humana e a natureza prosperem e se recomponham.
Ao final do evento, os povos da floresta, das águas, do campo e da cidade demonstraram, em Belém, sua capacidade na construção da organização popular para um outro projeto para a Amazônia, trazendo diversos exemplos de alternativas para enfrentar a crise social, ambiental e política que nos afeta. As eleições presidenciais de 2022 se aproximam e, diante da possibilidade da derrota do fascismo ecogenocida e da eleição de Lula presidente-, renasce a nossa esperança.
Mas o desafio colocado exige luta cotidiana que supere o calendário eleitoral. Após quatro anos de destruição institucional, das políticas públicas ambientais, há a urgência da nossa resistência para a proteção de nossas florestas e da vida dos povos originários. Estamos prontos e fortalecidos, por exemplo, para defender a responsabilização de acordos internacionais e empresas transnacionais que violam os direitos humanos dos povos amazônicos, queremos pôr fim na financeirização da nossa natureza, na “boiada” de Bolsonaro, que tem gerado conflitos territoriais e violação dos direitos de populações tradicionais. Lutaremos pela participação social na formulação de políticas socioambientais e pela retomada do orçamento da política ambiental.
Sigamos em luta e em resistência ao capital, por um Brasil democrático e popular, que priorize a preservação das nossas florestas, da água, da biodiversidade e da garantia e segurança do acesso à terra aos povos originários, aos sem-terra e aos sem-teto, com prioridade a quem resiste nas fronteiras do avanço do agronegócio, da mineração e da grilagem sobre a vida.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum