Em editorial higienista divulgado nesta quinta-feira (21), o jornal O Globo, da família Marinho, diz que a "Justiça do Rio acerta ao permitir apreensão de menores sem flagrante", apoiando a decisão do presidente do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-RJ), desembargador Ricardo Rodrigues, que revogou decisão de primeira instância que proibia a apreensão de crianças e adolescentes a caminho das praias.
O pedido foi feito pelo governador Cláudio Castro (PL-RJ) e pelo prefeito Eduardo Paes (PSD) após moradores de Copacabana, bairro de classe média alta da zona Sul do Rio, formarem milícias para "caçar" adolescentes que cometiam furtos e pequenos delitos na região.
Te podría interesar
A prisão sem flagrante foi uma das medidas de ações preventivas da Operação Verão. No entanto, no sábado (16), a juíza Lysia Maria da Rocha Mesquita, titular da 1ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Comarca da Capital, determinou que o governo do estado e a prefeitura se abstenham de apreender ou conduzir crianças e adolescentes a delegacias ou a unidades de acolhimento, a não ser quando flagrados cometendo crimes.
No editorial, O Globo diz que "não se pode perder a noção da realidade" ao defender que "se a polícia só puder agir em casos de flagrante, estará impedida de atuar na prevenção de crimes".
Te podría interesar
"Claro que policiais precisam ter critério, não podem sair por aí detendo adolescentes negros e pobres só para justificar seu trabalho. Mas cobra-se da polícia justamente que aja preventivamente, antes que os crimes aconteçam", diz o texto dando cor e classe social àqueles que seriam os alvos das prisões sem flagrante.
Para Ariel de Castro Alves, advogado, especialista em direitos da infância e juventude. Ex secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), há um claro viés higienista no editorial do jornal, além de ser uma afronta à Constituição e ao Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA.
"A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente proíbem apreensões de adolescentes que não estejam em flagrante de ato infracional. A apreensão de adolescentes por serem pobres, negros e moradores da periferia seria uma clara afronta a legislação brasileira e um atentado aos direitos fundamentais da infância e juventude, além de clara higienização social", afirmou à Fórum.
Castro Alves ainda critica a decisão da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que abriu processo "para apurar a conduta da juíza da 1ª Vara da Infância, do Adolescente e do Idoso do Rio de Janeiro, Lysia Maria da Rocha Mesquita, responsável por proibir apreensão e condução de adolescentes a delegacias ou a serviços de acolhimento do Rio de Janeiro, salvo em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita".
Segundo o CNJ, "diante da repercussão do caso na mídia nacional, a Corregedoria Nacional vai averiguar se houve infração da magistrada em relação às regras constitucionais e ao previsto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) ou nas regras adotadas pelo próprio CNJ".
Ou seja, o processo foi aberto justamente em razão da repercussão negativa da "mídia nacional" sobre a decisão da magistrada. "Uma investigação totalmente ilegal, já que a juíza cumpriu a Constituição Federal e o ECA". afirma Ariel de Castro Alves.