Um estudo recente revelou que o Homo erectus conseguiu sobreviver em uma paisagem árida, semelhante ao atual Saara, enfrentando escassez de vegetação e incêndios recorrentes há cerca de um milhão de anos. Até então, acreditava-se que apenas o Homo sapiens, surgido há aproximadamente 300 mil anos, possuía a capacidade de se adaptar a climas extremos.
A pesquisa, liderada por Julio Mercader, da Universidade de Calgary, em parceria com o Instituto Catalão de Paleoecologia Humana e Evolução Social (IPHES-CERCA), trouxe evidências de que o Homo erectus utilizava os recursos naturais da Garganta de Olduvai, na Tanzânia, considerada um dos marcos mais importantes da evolução humana.
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Publicado na revista Communications Earth & Environment, do grupo Nature, o estudo resulta de uma colaboração internacional envolvendo cientistas do Canadá, Austrália, Espanha e outros países. Baseado em amostras coletadas no sítio arqueológico Engaji Nanyori, localizado no Serengeti, o trabalho combinou avançadas técnicas de datação, modelagem espacial e análises geoquímicas para reconstruir o ambiente da época.
Um cenário inesperado
Os pesquisadores constataram que, ao contrário do que se imaginava, a região de Olduvai não era uma área de pastagem verdejante, mas sim uma paisagem árida e desafiadora. Esse ecossistema, marcado pela escassez de água e incêndios constantes, foi ocupado repetidamente pelo Homo erectus. "Esses dados demonstram que ele possuía uma flexibilidade ecológica notável, semelhante a características até então atribuídas exclusivamente ao Homo sapiens", explica María Soto, arqueóloga da Universidade Autônoma de Madrid e coautora do estudo.
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Para reconstruir o ecossistema, a equipe utilizou análises biogeoquímicas, simulações paleoclimáticas e estudos paleobotânicos. Eles também examinaram fósseis de fauna, como antílopes, cavalos e hipopótamos, para compreender a dieta dos animais e caracterizar o ambiente local. A análise de pólenes e hidrocarbonetos preservados nos sedimentos revelou que mudanças climáticas estavam em curso na região, com lagos secando e novos rios surgindo no horizonte.
Implicações para a evolução humana
O Homo erectus, presente na África há quase dois milhões de anos, foi a primeira espécie do gênero Homo a migrar para fora do continente, espalhando-se pela Ásia cerca de 1,9 milhão de anos atrás. A descoberta de sua capacidade de adaptação a ambientes extremos reforça a necessidade de revisar hipóteses sobre os fatores que possibilitaram essa expansão.
"Esse estudo revela que, desde o início do nosso gênero, já havia uma capacidade de resiliência em cenários desafiadores", destaca Mercader. Ele ressalta que o Homo erectus demonstrou habilidades excepcionais para sobreviver em ambientes adversos, o que foi crucial para sua ampla dispersão geográfica.
Ao redefinir em um milhão de anos a origem dessa habilidade adaptativa, a pesquisa também abre novas perspectivas para entender as estratégias de sobrevivência das primeiras espécies humanas. Esses achados sugerem que o Homo erectus, ao explorar repetidamente pontos estratégicos, possuía uma habilidade de gestão de recursos e adaptação ecológica que moldou o curso da evolução humana.