O Brasil enfrenta, desde agosto, a seca mais extrema de sua história, o que vem aumentando as temperaturas para 40° em algumas cidades, elevando o risco de doenças respiratórias e agravando o cenário de incêndios e queimadas. A previsão para o futuro, porém, não é de melhora desse cenário, mas de agravamento.
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Se o planeta continuar com a destruição ambiental, causando a crise climática enfrentada em diversos países, o risco é de aumento de 3°C na temperatura média global até o final do século, como alertou a Organização das Nações Unidas (ONU) nesta quarta-feira (18).
"Estamos soando o alerta vermelho para o planeta. A ciência é clara. Estamos muito longe de atingir as metas climáticas globais", afirmou o órgão.
Caso isso aconteça, as ondas de calor e a transmissão de doenças serão mais intensas e frequentes. O impacto também será econômico, uma vez que a demanda por energia vai aumentar com a tentativa dos moradores de se refrescarem.
Essas conclusões foram divulgadas no novo estudo feito pelo World Resource Institute (WRI) e divulgado nesta quinta-feira (19). O instituto analisou 996 cidades com população superior a 500 mil habitantes. Do Brasil, 32 entraram na lista. Entre elas estão Manaus, Belém, Aracaju, Goiânia, Cuiabá, Uberlândia, Belo Horizonte, São Paulo, Santos, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, Maceió e Fortaleza.
Os pesquisadores analisaram indicadores de riscos de áreas estratégicas como saúde pública, infraestrutura e produtividade econômica para entender como as cidades responderão a cenários de aumento de 1,5°C, 2°C e 3°C na temperatura média da Terra.
"A diferença entre 1,5 °C e 3 °C tem consequências de vida ou morte para bilhões de pessoas no mundo todo", afirma Rogier van den Berg, diretor global do WRI Ross Center for Sustainable Cities, que liderou o estudo.
Os piores impactos serão sentidos pelos países mais pobres, localizados na África Subsaariana, América Latina e Sudeste Asiático serão os mais afetados.
Ondas de calor mais frequentes e intensas
Com o aumento de 3°C na temperatura média do planeta, a frequência das ondas de calor passará de 4,9 para 6,4 vezes por ano em média. Elas também serão mais longas, com duração média de 24,5 dias. Hoje, as ondas de calor duram cerca de 16 dias.
Na América Latina, o cenário é ainda mais devastador: a frequência de ondas de calor pode chegar a 7,5 ocorrências por ano.
Dentre as cidades analisadas, 16% poderão enfrentar temporada extrema de ondas de calor, com duração de um mês, pelo menos uma vez ao ano. Em relação ao Brasil, o cenário vai se agravar em praticamente todas as 32 cidades avaliadas.
Cuiabá, que em agosto quebrou recorde de temperatura e chegou a ser considerada a cidade mais quente do país ao atingir 41,8°C, poderá enfrentar 12 ondas de calor por ano. Algumas podem durar mais de um mês, se estendendo por 32 dias.
Até mesmo a região Sul, mais fria, vai sofrer com maior ocorrência de ondas de calor. Curitiba, por exemplo, pode ser atingida por sete ondas de calor por ano.
Maior risco de doenças
O corpo humano tem limites para aguentar altas temperaturas, que podem causar estresse, insuficiência cardíaca e lesão renal aguda por desidratação. Por isso, o aumento da temperatura estará diretamente ligado à maior ocorrência de doenças cardiovasculares e respiratórias, por exemplo, e pode até mesmo levar à morte.
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De acordo com um estudo brasileiro e australiano publicado em 2023, as altas temperaturas respondem por 7% das internações do Sistema Único de Saúde (SUS). Uma outra pesquisa, realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, em 2021, mostrou que o calor intenso pode elevar o índice de mortalidade de pessoas acima de 60 anos devido a doenças respiratórias ou cardiovasculares.
Além dessas doenças, o aumento da temperatura também provoca maior propagação de mosquitos transmissores de doenças como dengue, febre amarela, zika e chikungunya.
Segundo o estudo do WRI, com o aumento de 3°C, novos lugares no mundo se tornariam um ambiente propício para a multiplicação desses vetores. Nas grandes metrópoles, onde já há maior ocorrência, o pico de transmissão pode se alongar em média por mais seis dias.
No Rio de Janeiro, por exemplo, a elevação de 3°C na temperatura pode provocar um aumento de 71% nos dias propícios para infecção, passando de 69 para 118.
O país já enfrentou neste ano a epidemia de dengue mais grave da história. De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 6 milhões de brasileiros foram diagnosticados com a doença neste ano até agora. Foram quase 4 mil mortes e a maioria das vítimas tinha entre 20 e 29 anos.
Impacto no bolso da população
Com o aumento das temperaturas, as pessoas tenderão a utilizar mais eletrodomésticos que demandam energia para se refrescar. Dessa forma, o gasto de aumenta e, consequentemente, o preço da conta luz.
O estudo do WRI estima que com o planeta 3°C mais quente, pelo menos 194 milhões de pessoas vão aumentar em 100% seu consumo de eletricidade. O impacto será, novamente, maior na América Latina.
Os brasileiros já estão sentindo o impacto do aquecimento global no bolso. Com a seca severa e o baixo nível dos reservatórias das hidreléticas, a conta de luz vai ficar R$ 4,46 mais para cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos, de acordo com a bandeira vermelha do sistema tarifário controlado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Até países com clima mais frio, como os europeus, irão sentir maior demanda pelo uso de eletrodomésticos de resfriamento. Em 2023, considerado o ano mais quente da história, as vendas de aparelhos subiram em média 16% nas semanas de verão do Hemisfério Norte, segundo estimativa da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês).
O maior uso de eletrodomésticos de resfriamento como o ar-condicionado também vai gerar um ciclo vicioso, uma vez que geram mais gases do efeito estufa que, por sua vez, causam o aquecimento global.
*Com informações de Deutsche Welle.
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