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Equador é hoje um narcoestado, diz Correa

Como a Colômbia e o México, país tem narcodeputados, diz ex-presidente

Rambo.Noboa se vestiu de soldado para uma ação contra o crime organizado; partidários dele defendem entregar de novo aos EUA a base de Manta, o que exigiria mudar a Constituição.Créditos: Reprodução X
Escrito en GLOBAL el

CARACAS -- O Equador se converteu em um narcoestado, mas o presidente Daniel Noboa pretende combater o crime organizado se fazendo passar por Rambo, denuncia o ex-presidente Rafael Correa.

Segundo Correa, as máfias criminosas se infiltraram no que restou do aparato do Estado, que foi desmantelado pelas políticas dos presidentes Lenin Moreno e Guilherme Lasso. 

Noboa, filho de uma das famílias mais ricas do país, herdeiro de uma plantation bananeira, segue na mesma linha neoliberal -- sempre segundo Correa.

Ele recebeu a revista Fórum para uma entrevista em Caracas no dia em que fez uma apresentação no Seminário Internacional de Desenvolvimento Econômico.

Correa governou o Equador entre 2007 e 2017. Comandou a chamada Revolução Cidadã, que promoveu profundas mudanças institucionais e ainda tem influência no país.

Na última eleição, Noboa derrotou a partidária de Correa, a advogada Luisa Gonzáles, por 52% a 47%.

Traído pelo homem que ajudou a eleger, Lenin Moreno, Correa acabou condenado à revelia em 2020 a oito anos de prisão.

Teria supostamente liderado o esquema de corrupção que envolveu pagamento de propinas pela Odebrecht, empresa que não foi investigada no Equador.

Correa diz que a acusação contra ele foi de "influência psíquica" sobre os demais condenados, na linha do "domínio do fato" aplicado de maneira distorcida pelo Supremo Tribunal Federal no Brasil no chamado "escândalo do mensalão".

Em seu governo, Correa fechou a base militar estadunidense de Manta, o que o colocou na lista de alvos preferenciais dos EUA.

Hoje, os inimigos dizem que a decisão facilitou o narcotráfico. Ele afirma que segue sendo alvo de assassinato de caráter pela mídia equatoriana.

No exílio há sete anos, o ex-presidente diz que seus sucessores, todos representantes do status quo, foram bem sucedidos em mudar totalmente a institucionalidade do Equador, colocando inimigos da Revolução Cidadã em cargos-chave.

É como se Sergio Moro tivesse triunfado no Brasil.

Mais recentemente, o presidente Daniel Noboa foi bem sucedido ao confundir o combate ao crime organizado com a perseguição a aliados de Correa.

Em abril deste ano, mandou invadir a Embaixada do México para prender o ex-vice-presidente Jorge Glas, que é mantido em uma prisão de segurança máxima. A decisão recebeu condenação internacional e levou à suspensão das relações com o México.

A Justiça equatoriana, no entanto, endossou a medida, alegando que Glas era fugitivo da Justiça.

Hoje, os ministros que serviram a Correa em sua maioria se encontram no exílio, em Caracas ou na Cidade do México. O ex-presidente vive na Bélgica.

Fórum: O que diria da luta contra a criminalidade, que é o mote principal do governo Noboa?

Correa: A maior parte da violência no Equador vem do crime organizado e para combatê-lo você não precisa de um Rambo, mas do Sherlock Holmes. Eles destruíram tudo. Deixei o governo do Equador como o segundo país mais seguro da América Latina. Quando assumi tínhamos 18 homicídios por 100 mil habitantes, sai com 5,8, superado apenas pelo Chile, que tinha o dobro da renda per capita. O Equador era o país mais seguro do mundo, se considerada a renda per capita.

Fórum: Isso mudou muito?

Correa: No ano passado tivemos 44 homicídios por 100 mil habitantes. Somos um dos países mais perigosos do planeta. Temos a cidade mais violenta do mundo, Durán, com cerca de 140 homicídios por 100 mil habitantes. Nunca vi uma destruição tão rápida de um país sem bloqueio econômico, em tempos de paz. É um caso a ser estudado.

Fórum: Qual o seu diagnóstico sobre o que aconteceu?

Correa: Não é porque as máfias se tornaram mais perversas, mas porque desmantelaram o Estado. Foi por causa do fundamentalismo ideológico, por ódio. Começaram a desmantelar o Poder Executivo. Eu tinha o Poder Executivo dividido em 6 grandes ministérios, um dos quais era o Ministério da Segurança, que coordenava com o Ministério da Defesa, o Ministério da Polícia, o Ministério do Interior, o Ministério de Reações Estrangeiras, a Inteligência.

Fórum: Como foi o desmanche?

Correa: O Ministério da Justiça eliminou as Comissões Internacionais de Fronteiras. As drogas vem da Colômbia, as armas do Peru, foi tudo desarmado e depois mexeram com o resto do Estado. Destruíram o sistema de Justiça que era exemplo para a América Latina. Destruíram o Ministério Público, a Controladoria, a Procuradoria-Geral da República, tiraram o orçamento da polícia.

Fórum: O combate ao crime é de fachada?

Correa:  Choramos lágrimas de sangue e eles querem combater isso com golpes de efeito, com um presidente vestido de Rambo que destruiu a Inteligência, a Unidade de Análise Financeira está lá, mas agora serve para perseguição política, não para perseguir o crime organizado. O crime organizado se infiltrou no Estado, o que não existia. Está infiltrado nas Forças Armadas, na Polícia, no Judiciário, nas Assembleias, tem deputados financiados pelos narco, como no México e na Colômbia.

Para combater isso você não precisa de um presidente disfarçado de soldado, com metralhadora e jaleco, você precisa de inteligência, você precisa de coordenação internacional, você precisa conhecer as rotas do dinheiro. Exige coragem e independência, e isso não existe mais no Equador.

Os pontos-chave da entrevista estão nos vídeos abaixo: