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Argentina: polícia abre fogo em manifestantes contra pacote ultraliberal de Milei

Povo nas ruas de Buenos Aires, capital argentina, sofre violenta repressão policial; presidente de extrema direita discursa em evento com participação de Elon Musk. Veja fotos e assista vídeos

Créditos: Página 12 (Leandro Teysseire) - Polícia da Argentina vai para cima de manifestantes contra pacote ultraliberal de Javier Milei
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O Congresso da Argentina está cercado por manifestantes que protestam contra mais um pacote neoliberal proposto pelo presidente de ultradireita Javier Milei nesta quarta-feira (12). A polícia abriu fogo contra a multidão que se reúne na Praça do Congresso com balas de borracha, bombas e caminhões tanque d'água. Há feridos, prisões arbitrárias e agressões a jornalistas.

Página 12 (Leandro Teysseire) - Polícia da Argentina vai para cima de manifestantes contra pacote ultraliberal de Javier Milei
Página 12 (Leandro Teysseire)
Página 12 (Leandro Teysseire)

As forças de segurança argentinas reprimiram o povo com aplicação do denominado protocolo antipiquete da ministra da Segurança, Patricia Bullrich.

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O Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS) advertiu nque a operação de repressão realizada pelo Ministério da Segurança nos arredores do Congresso argentino está escalando "de maneira desproporcional".

"A operação de repressão está escalando de maneira desproporcional: as forças de segurança estão usando balas de borracha, caminhões com canhões de água, gases lacrimogêneos MK-9 e há efetivos da PNA portando armas de fogo", postou a entidade.

Discurso de Milei

Reprodução YouTube

Em meio à caótica jornada vivida dentro e fora do Congresso Nacional em razão do debate da Lei Bases no Senado, o presidente Milei fez um discurso no fórum “O Renascimento da Liberdade na Argentina e no mundo”, organizado pela Fundação Liberdade e Progresso e pelo think-tank dos EUA Instituto Cato, no hotel Hilton de Buenos Aires, no bairro de elite Puerto Madero.

Nesse contexto, o presidente iniciou sua fala com um resumo da "façanha" que o governo nacional tem realizado na área econômica. "Às vezes, a gente ouve analistas ou políticos que parecem viver em Nárnia", expressou o mandatário, que também reiterou que, junto com sua equipe, estão "vencendo a inflação", embora tenha destacado que o país "necessita de mudanças profundas".

"Sabem que, se fizermos essas reformas, isso vai funcionar e eles não voltarão mais", ameaçou.

Milei afirmou que sua gestão sofre "obstáculos" todos os dias e criticou a justiça social, um ponto recorrente na narrativa de Milei: "A justiça social amarrou as mãos de um povo, e esse tempo nunca vamos recuperar", assegurou, referindo-se aos últimos 100 anos da história argentina.

Além disso, ele falou sobre os supostos impedimentos que seu governo enfrenta por parte da oposição: "Tem que dizer na cara deles. Eles esperavam que liberássemos tudo, ignorando a dinâmica dos estoques, e que tudo explodisse, jogando as pessoas na rua. Não descartem, digamos, a metodologia deles de jogar mortos na rua, promover saques, algo que alguns jornalistas incentivam de seus espaços", apontou o presidente.

Milei discursou após um painel que contou com a participação do empresário Elon Musk, que, por meio de uma videoconferência, parabenizou o mandatário argentino por suas medidas econômicas.

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Pacote ultraliberal

A fúria da população é causada pela polêmica Lei de Bases, um conjunto de reformas econômicas e fiscais ultraliberais que inclui privatizações, alterações no imposto de renda, e mudanças nas leis trabalhistas e no emprego público.

Milei, através de sua bancada ultradireitista e com a ajuda da oposição moderada, enfrenta mais uma vez a votação da polêmica proposta, que já sofreu várias correções.

Aprovada pela Câmara dos Deputados após um longo debate, a lei agora está no Senado. A legislação visa reduzir o tamanho do setor público e introduzir medidas de austeridade, apesar das críticas de vários setores, incluindo sindicatos e partidos de oposição, que alertam para seus impactos negativos na população e na economia.

Após alcançar o quórum necessário para seguir a votação, a base de Milei no Congresso anunciou mais mudanças importantes: Aerolíneas Argentinas, Correo Argentino e Radio Televisión Argentina foram retiradas da lista de empresas a serem privatizadas.

A decisão de retirar essas empresas da lista de privatizações é um movimento significativo e reflete a resposta do governo às pressões e preocupações levantadas por diversos setores da sociedade.

Entre os itens dessa proposta de legislação está o RIGI (Regime de Incentivo para Grandes Investimentos), que gerou grande polêmica, pois implica modificações importantes em estatutos impositivos, aduaneiros e cambiais.

Na justificativa, o governo Milei afirma que a criação do RIGI busca atrair projetos de investimento superiores a 200 milhões de dólares e fomentar a chegada de capital estrangeiro e nacional.

 Durante o debate no plenário do Senado, o ministro do Interior de Milei, Guillermo Francos, afirmou que o instrumento "pretende atrair grandes investimentos, sobretudo nas áreas de mineração, petróleo e gás em grandes montantes".

Principais pontos do RIGI

O RIGI oferece incentivos fiscais, aduaneiros e cambiais sob o pretexto de facilitar a chegada de grandes investimentos ao país.

Benefícios fiscais

  • Imposto sobre a Renda
    • Alíquota reduzida de 25% para os Veículos Titulares de um Único Projeto (VPU).
    • Amortização acelerada de bens móveis e infraestrutura.
    • Transferência de prejuízos fiscais não absorvidos dentro dos primeiros 5 anos.
       
  • Imposto sobre Valor Agregado (IVA)
    • Devolução acelerada de saldos a favor em um prazo não superior a três meses.
    • Pagamento do IVA através de Certificados de Crédito Fiscal transferíveis a terceiros.
       
  • Outros impostos
    • Computar 100% do imposto sobre débitos e créditos bancários como crédito no Imposto sobre a Renda.

Benefícios aduaneiros

  • Isenção de direitos de importação para bens de capital, peças de reposição, partes e insumos.
  • Isenção de direitos de exportação durante os primeiros três anos para projetos aderidos ao RIGI.

Benefícios cambiais

  • Livre disponibilidade de divisas para exportações:
    • 20% no primeiro ano.
    • 40% no segundo ano.
    • 100% a partir do terceiro ano.
    • Divisas para financiamento local ou externo sem restrições.

Estabilidade normativa:

  • Estabilidade fiscal, aduaneira e cambial durante 30 anos.
  • Garantia de não afetação por normativas mais onerosas.

Os problemas do pacote ultraliberal

O pacote ultraliberal de Milei, especificamente o RIGI, está sendo questionado por legisladores opositores, sindicatos, pequenas e médias empresas (PMEs) e economistas.

Do Centro de Economia Política (CEPA), argumentam que o RIGI concederá "benefícios tributários e cambiais excessivos durante 30 anos a quem investir um mínimo de 200 milhões de dólares, sem nenhuma exigência". E afirmam: "não há setores prioritários, nem obrigação de promover fornecedores locais, nem agregar valor na Argentina".

O diretor do CEPA, Hernán Letcher comenta que a normativa impulsionada pelo governo "aumenta o gasto tributário" e coloca o Centro Internacional para a Resolução de Disputas sobre Investimentos (CIADI), que faz parte do Grupo Banco Mundial, como tribunal de resolução de conflitos.

A Associação de Industriais Metalúrgicos da República Argentina (ADIMRA) concordou com a CEPA ao advertir que os benefícios podem gerar concorrência desleal com a indústria local, ao permitir importações sem tarifas. O organismo econômico destaca: "o RIGI coloca em risco toda a indústria local e seus postos de trabalho ao facilitar a importação de bens que competem com os nacionais".

Outros setores opositores argumentam que o teto mínimo de investimento de 200 milhões de dólares exclui as PMEs, que geram a maior quantidade de empregos no país.

Também se questiona que, em caso de ser aprovada, a Lei de Bases anularia qualquer normativa anterior que limite os benefícios do RIGI, o que —segundo advogados constitucionalistas da Argentina ouvidos pelo jornal Página 12 — poderia vulnerar a autonomia de províncias e municípios.

Com informações do Página 12