Os Estados Unidos têm uma longa história de envolvimento em assuntos internacionais, muitas vezes com consequências duradouras para certas nações, principalmente as latino-americanas. Um exemplo disso é a interferência estadunidense no Chile antes do golpe militar de 1973, que nesta segunda-feira (11), completa 50 anos.
O historiador e pesquisador americano Peter Kornbluh, um dos maiores especialistas no assunto, está em Santiago para diversos dos eventos de memória relacionados ao golpe. Ele trabalhou por anos no Arquivo de Segurança Nacional dos Estados Unidos.
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“Pinochet Desclassificado” (ed. Catalônia) é uma atualização de sua pesquisa, iniciada em 2003, que agora inclui várias novas informações em razão da recente liberação de uma série de documentos secretos sobre o assunto pelos EUA. Outro material apresentado pelo historiador é a “Operação Chile” (Chilevisión), um documentário que explora essas descobertas com maior profundidade.
Apoio dos EUA à ditadura chilena
No documentário, a sequência de eventos que levaram ao golpe é esclarecida de maneira mais detalhada. Revela-se que a ideia do golpe nasceu antes mesmo de Salvador Allende assumir o cargo, com reuniões ocorrendo em Washington entre Agustín Edwards, então proprietário do jornal El Mercúrio, e o presidente dos EUA na época, Richard Nixon, juntamente com seu secretário de Estado, Henry Kissinger.
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Essas reuniões tinham como objetivo encontrar uma maneira de impedir que Allende assumisse o poder, mas acabaram não sendo bem-sucedidas. Em um desses encontros, por exemplo, foi planejado o assassinato do general René Schneider, um constitucionalista que acreditava que os militares deveriam respeitar a vontade da população expressa nas urnas.
Situação fora de controle fez EUA mudar de lado
À coluna da Folha, Kornbluh conta que o golpe no Chile foi estimulado há 20 anos atrás pelos americanos. "Agora temos bem claro e com muitos detalhes como começam esses quase 20 anos em que os EUA primeiro estimularam o golpe de Estado no Chile. Depois, foram mudando de opinião e começaram a exercer todo tipo de pressão para que Pinochet saísse do poder, nos anos 1980”, afirma o pesquisador.
O esforço dos EUA para acabar com a ditadura chilena começou a se intensificar após uma série de abusos do regime que indicavam que a violência do Estado havia saído do controle. O primeiro desses incidentes foi o assassinato do diplomata Orlando Letelier em Washington, em 1976.
O plano de assassinato de Schneider seria uma tentativa de incitar outros militares e a sociedade a impedir a posse de Allende. No entanto, a morte de Schneider em 25 de outubro de 1970 acabou sendo uma tragédia que não teve o impacto esperado. Allende assumiu o cargo como planejado em 3 de novembro de 1970, mostrando que os esforços para impedir sua posse foram em vão.
Posteriormente, a crise econômica que o regime não conseguiu controlar se instalou, com desabastecimento e alta inflação. As estatísticas mostram que o tão aclamado “modelo chileno” neoliberal para a economia começou a desmoronar somente alguns anos após o golpe de Estado.
É importante notar que outro motivo para a mudança de atitude dos EUA foi o trágico assassinato do jovem fotógrafo Rodrigo Rojas. Ele tinha apenas 19 anos e residia nos EUA, sendo incendiado pelo Exército durante um protesto.
É possível observar no documentário que Pinochet tentou resistir à ideia de deixar o poder mesmo após ter sido derrotado no plebiscito de 1989. O ditador solicitou que seus oficiais mais próximos assinassem um compromisso para garantir sua permanência no comando. No entanto, a solicitação foi recusada pelos militares, sob pressão dos Estados Unidos.
“Ele afirmava: ‘nunca vou sair’. A versão de que ele respeitou as urnas e entregou o poder democraticamente é equivocada. Essa nunca foi a intenção dele”, lembra Kornbluh.
“Ainda há muito a descobrir nos arquivos militares da Argentina e do Brasil. É crucial solicitar que esses governos entreguem esses documentos ao Chile para que possamos descobrir a verdadeira extensão do envolvimento desses países no golpe chileno”, enfatiza o historiador, que afirma que todos os seus descobrimentos só foram possíveis graças à liberação recente de documentos secretos pelo governo dos EUA.
Com informações da coluna de Sylvia Colombo, da Folha de São Paulo