Aos 85 anos, o único filho vivo de João Cândido Felisberto, conhecido como “Almirante Negro”, reagiu com indignação e rebateu com contundência as declarações do comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen.
Adalberto Cândido afirmou que seu pai não era um herói da Marinha, mas um “herói do povo”.
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“Se fizesse um plebiscito, uma eleição para saber sobre o reconhecimento, ele (João Cândido) ia ganhar”, declarou Adalberto, em entrevista ao jornal O Globo.
Conhecido como Candinho, ele é morador de São João de Meriti, onde seu pai passou os últimos anos de vida. Adalberto ressaltou que João Cândido é reconhecido internacionalmente e que sua figura é fundamental na história do país.
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O filho do “Almirante Negro” relatou que não teve coragem de ler a carta de Olsen na íntegra, que classificava a Revolta da Chibata como um “episódio vergonhoso” e os marinheiros que participaram como “abjetos”.
Adalberto disse, ainda, que seu pai sempre foi perseguido pela Marinha, desde os eventos de 1910 até os dias atuais, em consequência do racismo institucionalizado na época e à resistência liderada por João Cândido.
O filho do “Almirante Negro”, afirmou, também, que João Cândido era reservado e não comentava muito sobre o movimento que liderou. Porém, sofreu perseguições, como a tentativa frustrada de trabalhar na Marinha Mercante e a proibição da instalação de um busto em sua homenagem em Porto Alegre (RS), onde nasceu.
Adalberto segue o exemplo e continua lutando pelo reconhecimento do legado de seu pai e pela construção de um museu em sua memória em São João de Meriti.
Indignação de parlamentares
As declarações do comandante da Marinha provocaram revolta em parlamentares. Os deputados federais Lindbergh Farias (PT-RJ) e Benedita da Silva (PT-RJ) visitaram Candinho para demonstrar solidariedade.
“Sinceramente nos pegou de surpresa tamanho a contundência, acho que ele perdeu a oportunidade de ficar calado. Falar em ‘abjetos marinheiros’ e ‘fatos nefastos da história’ 114 anos depois. Caiu como uma bomba, porque João Cândido é herói da resistência do povo negro”, afirmou Lindbergh.
“Não existe achar natural levar cem chicotadas como parte da disciplina, né? Nós temos contado todas as histórias, de todos os momentos do Brasil, por que não podemos contar a do João Cândido?”, questionou Benedita.
A expectativa dos deputados é que o projeto de inclusão de João Cândido no “Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria” seja aprovado na Comissão de Cultura e, em seguida, na Comissão de Constituição e Justiça.
Em 2008, o presidente Lula sancionou a anistia póstuma de João Cândido como reconhecimento formal das injustiças cometidas pelo Estado brasileiro. Além do almirante, outros oficiais punidos pela Revolta da Chibata foram “anistiados políticos”.
O que foi a Revolta da Chibata
João Cândido Felisberto liderou a Revolta da Chibata, em 1910, um motim contra a aplicação de castigos físicos, incluindo chibatadas, aos marinheiros, em sua maioria negros, por parte dos oficiais.
O almirante recebeu apoio de dois mil marinheiros e os revoltosos assumiram o controle de embarcações da Marinha na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, e fizeram os oficiais reféns. Além disso, apontaram os canhões dos navios para a cidade.
Após a revolta, João Cândido ficou detido por 18 meses em uma prisão subterrânea, internado em um hospital de alienados e foi preso novamente. Depois de solto, viveu como mercador de peixes no Rio de Janeiro e morreu na miséria em 1969.
A história inspirou a célebre canção “O mestre-sala dos mares”, da dupla de João Bosco e Aldir Blanc.