Perversidade econômica

Armínio Fraga, que geriu R$ 16 bi em fundo, acha que Brasil deve congelar salário mínimo por 6 anos

Quem contribui mais para o país, o 'investidor" que paga pouco ou quase nada de impostos no mercado financeiro ou o trabalhador que ganha o piso nacional?

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Jornalista formado na ECA-USP, colaborador do Outras Palavras, ex-editor-executivo do Brasil de Fato, ex-editor da Rede Brasil Atual e ex-âncora na TVT e Rádio Brasil Atual.
Armínio Fraga, que geriu R$ 16 bi em fundo, acha que Brasil deve congelar salário mínimo por 6 anos
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Neste sábado (12), em palestra realizada na Brazil Conference, nos Estados Unidos, o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga apresentou o que, segundo matéria da CNN, seria uma "receita" para que os problemas econômicos brasileiros possam ser superados.

“Algo que seja realista e palatável. A receita é: congela o salário mínimo e reduz os gastos tributários em 2% do PIB. Isso daria 3% do PIB (em redução de gasto público) e o Brasil virava o jogo”, afirmou.

Ele seguiu dizendo que as prioridades do gasto público no país estão “totalmente equivocadas”. “A soma do gasto com folha de pagamento e Previdência no Brasil atinge 80% dos gastos. Deveria ser 60% do gasto primário”, estimou.

Sem justiça social

"PERVERSO! O ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, disse que o salário mínimo não deveria ter aumento real durante SEIS ANOS, para fazer um aperto fiscal e conter o gasto público. Esses banqueiros só querem uma coisa: que os pobres sejam eternamente pobres! BILTRE!", disse em seu perfil no X, ex-Twitter, o deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP).

Armínio Fraga não é exatamente conhecido por demonstrar preocupações sociais. Em outubro de 2024, por exemplo, defendeu que o modelo do Sistema Único de Saúde (SUS), como foi concebido pela Constituição de 1988, não seria mais adequado para o Brasil. "Não acredito que seja possível voltar ao modelo original do SUS. Acho que seria mais fácil caminhar para um modelo que seja mais um híbrido de alguns modelos europeus", pontuou.

Sim, um modelo baseado em países desenvolvidos, adequado para um país em desenvolvimento como o Brasil, um dos piores do planeta em distribuição de renda, seria uma boa ideia, de acordo com a avaliação "técnica" do ex-presidente do BC. Até porque toda opinião de alguém alinhado à doutrina do liberalismo econômico é tida pela mídia corporativa como se fosse dotada de todo conhecimento supostamente técnico e, por consequência, incontestável, assemelhando-se mais a um dogma religioso da Idade Média.

E as avaliações são sempre desinteressadas e neutras. Não importa se Fraga foi o presidente do BC que elevou os juros a um patamar de 45% em sua gestão, no governo de Fernando Henrique Cardoso, período em que o desemprego atingiu níveis recordes. Na Grande São Paulo, por exemplo, o índice chegou a 20,4% em abril de 2002.

Capital improdutivo

Fraga assumiu a presidência do Banco Central no início de 1999, no segundo mandato de FHC. À época, o real sobrevalorizado já fazia água, e o câmbio fixo, grande alicerce da nova moeda, era substituído pelo regime de câmbio flutuante e de metas de inflação, junto com a imposição de resultados primários positivos, formando o sacrossanto tripé macroeconômico que limita as opções econômicas do Brasil até hoje.

Ainda que muitos economistas critiquem a fórmula, eles não são ouvidos na mídia corporativa. Armínio Fraga é. Assim como outros que fizeram gestões malsucedidas, como um ex-ministro cuja gestão resultou em uma hiperinflação de mais de 80% ao mês e é tido como alguém capaz de criticar de forma ácida a política econômica e propor alternativas.

O problema de propor supostas soluções que ignoram as consequências sociais em um país cujo déficit social é histórico e ainda sem resolução não é apenas uma questão ideológica, mas se conecta com uma economia cada vez mais financeirizada e mais conectada ao chamado "mercado" do que ao capital produtivo.

Fraga é gestor da Gávea Investimentos, fundada por ele em 2003, logo depois de ter deixado a presidência do Banco Central. Em 2021, administrava R$ 16 bilhões em recursos que ficam restritos à ciranda financeira.

Resta perguntar: quem contribui mais para o país? Um investidor que pouco ou quase nada paga de impostos, cujo dinheiro também não é direcionado para investimentos produtivos de fato, ou o assalariado, que ganha o piso que ajuda a economia a rodar? Não é só uma questão de justiça social, é também escolha econômica que vai além de dogmas que nem sendo repetidos ad nauseam se tornarão verdade.

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