"Veja, a minha importância é declinante. Eu tenho humildade para perceber que a minha palavra cada vez tem menos audiência no Ceará. Isso eu tenho que aceitar com humildade."
A declaração acima é do ex-ministro e ex-governador do Ceará Ciro Gomes, dada no domingo (6) do primeiro turno das eleições municipais. Pela manhã, ele foi votar na capital do estado, Fortaleza, e reclamou do ministro da Educação, Camilo Santana, afirmando que ele tinha "ingerência" na Justiça do Ceará. Também atacou a “grande desigualdade” na Justiça Eleitoral, que teria gerado prejuízos à campanha de seu aliado, o prefeito da capital cearense José Sarto (PDT).
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Apesar de se dizer confiante na vitória de Sarto, as queixas (e as pesquisas) já transpareciam que ela não viria. O prefeito teve somente 11,7% dos votos válidos, bem distante dos dois que passaram para o segundo turno, o deputado federal André Fernandes (PL), que teve 40,2%, e o deputado estadual Evandro Leitão (PT), com 34,33%.
E a derrota prematura do pedetista não se deu por falta de recursos financeiros. Segundo levantamento do jornal O Povo, José Sarto teve a segunda campanha mais cara da região Nordeste, com R$ 17,3 milhões, atrás somente do prefeito reeleito de Salvador, Bruno Reis (União Brasil), com R$ 20,6 milhões.
A queda na capital foi um símbolo do declínio do PDT no estado e de seu principal nome, Ciro Gomes. Em 2020, o partido elegeu 67 prefeitos no Ceará e, agora, somente cinco.
Rachas e ladeira abaixo
Para entender a derrota de agora, é preciso retroceder para a implosão da união entre o PT cearense e os irmãos Ferreira Gomes, aliança que foi funcional para ambos de 2002 até meados de 2018, ano da derrota de Ciro nas eleições presidenciais, marcada pela sua viagem a Paris no segundo turno.
Mais recentemente, houve um racha entre os irmãos Gomes, com Cid e Ivo, o prefeito de Sobral, saindo da legenda e migrando para o PSB. Levaram com eles diversos prefeitos, vereadores e outras figuras políticas, fazendo com que o PDT reduzisse seu número de prefeituras para dez.
Agora, no primeiro turno, o PSB de Cid se tornou a sigla com maior número de prefeituras, vencendo em 65 cidades. O PT, antes aliado no estado e agora alvo de Ciro, elegeu 46 prefeitos, e está no segundo turno em Fortaleza e Caucaia, segunda cidade mais populosa do Ceará.
O isolamento trouxe à tona as limitações do tipo de liderança exercida pelo ex-ministro. "Do ponto de vista da lógica de funcionamento do grupo ferreiragomista, que foi hegemônico no Ceará de 2006 a 2022, havia uma clara divisão de funções: Ciro cuidava da articulação nacional e Cid gerenciava o grupo no estado. Se, por um lado, a racionalização das funções otimizou a eficiência do grupo, também serviu para afastar Ciro dos debates locais. O ministro era acionado esporadicamente como bombeiro em contextos de crises. Ao contrário de Cid, que, síndico das coalizões lideradas pelos Gomes no Ceará, transformou-se em liderança reconhecida por sua habilidade em gerenciar tensões entre aliados e montar arranjos eleitorais competitivos", explica, em artigo, a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará Monalisa Torres.
Ciro já havia sofrido uma derrota dura no Ceará em 2022, quando, pela primeira vez numa campanha presidencial, não venceu no estado, ficando atrás de Lula e Bolsonaro. As eleições de 2024 mostraram que ele não conseguiu exercer a função que Cid desempenhava, articulando localmente com prefeitos, vereadores e lideranças regionais. O PDT cearense pagou por isso.