PERIGO

Tragédia no RS: Especialista alerta para medidas de prevenção contra leptospirose

Transmitida principalmente por água e solos contaminados pela urina de animais infectados, a doença é uma ameaça ainda maior após enchentes

Enchentes no Sul.Créditos: Divulgação/CBMRS
Escrito en SAÚDE el

A tragédia humanitária e ambiental que atinge o Rio Grande do Sul traz uma série de consequências avassaladoras aos moradores do estado. Além de dezenas de mortos e milhares de desabrigados, há riscos de doenças que proliferam em ambientes onde ocorrem enchentes.

Uma delas é a leptospirose, doença infecciosa grave causada pela bactéria Leptospira. Transmitida principalmente por água e solos contaminados pela urina de animais infectados, especialmente ratos, se torna uma ameaça ainda maior após alagamentos, que elevam significativamente o risco de transmissão.

A doença não é uma novidade, com o registro de casos recentes no Brasil. Em novembro de 2023, por exemplo, o adolescente Nikollas Dreger do Nascimento, de 15 anos, morreu após contrair leptospirose e ficar internado por cinco dias.

O pai do menino mencionou, na ocasião, não saber onde o filho adquiriu a infecção, evidenciando a dificuldade em identificar as fontes de contágio em ambientes urbanos.

Diante dessa realidade, foi divulgada, no dia 5 de maio, uma Nota Técnica Conjunta da Sociedade Brasileira de Infectologia, Sociedade Gaúcha de Infectologia e Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, recomendando a quimioprofilaxia em situações específicas.

“Esta orientação é crucial para proteger especialmente as equipes de socorristas e voluntários que têm contato direto com águas de enchente”, explicou a médica infectologista pediátrica Carolina Brites.

A Nota Técnica Nº 16/2024 ressaltou que, de modo geral, o uso profilático de antimicrobianos não é recomendado, dado que estudos, incluindo uma revisão sistemática de 2024 pela Cochrane Systematic Reviews, não demonstraram redução na mortalidade ou infecção.

Porém, em situações de alto risco, como para equipes de resgate e indivíduos com exposição prolongada a ambientes contaminados, o uso de doxiciclina ou azitromicina é indicado, de acordo com as entidades que emitiram a Nota Técnica.

Para adultos, segundo as orientações, o recomendado é 200 mg de doxiciclina por via oral em dose única, imediatamente após a exposição de alto risco, ou uma dose semanal de 200 mg durante o período de exposição contínua.

Para crianças, a dose é de 4 mg/kg, também em única administração, sem exceder 200 mg. A alternativa, azitromicina, é administrada em dose única de 500 mg para adultos e 10 mg/kg para crianças após exposição, sem ultrapassar 500 mg.

“É importante ressaltar que a quimioprofilaxia com doxiciclina não é indicada para gestantes e lactantes, e todos devem estar cientes de que mesmo com o uso de antimicrobianos, a proteção não é garantida em 100% dos casos”, destacou a médica.

Medidas não farmacológicas também são importantes

Carolina apontou, ainda, a importância de medidas não farmacológicas: “Primeiro ponto, obras de saneamento básico. Quanto mais a gente conseguir organizar, para que tenha uma drenagem melhor de águas paradas, redes de coleta e de abastecimento de água, construção e manutenção das galerias de esgoto e água pluviais, é importante para as melhorias de habitação humana e controle dos roedores”.

A infectologista recomendou, também, evitar o uso de água ou lama de enchentes, impedir que crianças nadem ou brinquem nessas águas, além de utilizar água sanitária ou hipoclorito de sódio a 2,5%.

“Mata as leptospiras e deve ser utilizado para desinfetar os reservatórios de água. Pode ser usado um litro de água sanitária para cada mil litros de água do reservatório. Assim, conseguimos minimizar a leptospirose”, relatou.

Políticas Públicas

“A gravidade dessa doença e a complexidade de sua prevenção ressaltam a necessidade de políticas públicas eficazes e a conscientização da população sobre os riscos e medidas de proteção, especialmente em tempos de crise ambiental. Com a colaboração de todos, esperamos reduzir significativamente o impacto da leptospirose no estado”, concluiu a médica, que é mestra em Ciências Interdisciplinares em Saúde e, atualmente, é professora de Pediatria na Unaerp, em Guarujá, e na Universidade São Judas, em Cubatão, além de atuar em hospitais e consultório.