A história que viveu Anthony Donatelli muitos passam. Com apenas 41 anos, Donatelli estava em um leito a espera de um doador e tinha esperança de continuar vivo, a expectativa de vida estimada era de somente três meses.
Em entrevista à BBC News Mundo, ele afirma que nunca desistiu e sempre pensou nos filhos. Com amiloidose, doença rara que acontece quando determinadas proteínas anormais se acumulam no corpo e formam depósitos, Donatelli viu que precisava de um doador que lhe desse ao menos três órgãos compatíveis.
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Ele foi a primeira pessoa no mundo a receber um triplo transplante de fígado, coração e rim, a partir de uma técnica denominada PRN, ou Perfusão Regional Normotérmica, que consiste em manter os órgãos vivos do paciente morto de modo que eles possam ser transplantados a outra pessoa.
Polêmico e revolucionário
O método alternativo de transplante de órgãos tem se tornado motivo de muito debate nos Estados Unidos, uma vez que após o consentimento de familiares de que os aparelhos que mantém a pessoa viva devam ser desligados, os médicos reativam por meio de uma máquina o bombeamento do sangue do falecido novamente para que o coração e os pulmões funcionem e não deteriorem, avaliando se estão aptos a transplante.
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Tratam-se de doadores com danos cerebrais catastróficos irreversíveis os quais são mantidos vivos artificialmente com a ajuda de aparelhos de suporte à vida. A técnica é praticada há anos em países como Reino Unido, Suécia, Austrália, Espanha, França, Portugal e Itália. No entanto, nos Estados Unidos ganhou uma razão ética.
Vale lembrar que a técnica até o momento nunca foi utilizada na América Latina, de acordo com informações disponíveis ao público. A questão ética está na percepção de que o morto voltaria à vida com a reanimação de sua atividade cardíaca.
O American College of Physicians chegou a solicitar em um documento a pausa na adoção da PRN por "profundas questões éticas em relação à determinação da morte", em abril de 2021. "A PRN ressuscita o paciente", afirma. Algumas Organizações de Procura de Órgãos (OPOs) são a favor dessa posição.
Alexandra Glazier, presidente e diretora-executiva de uma destas organizações, revelou à BBC que para eles, neste debate, o essencial é que os direitos do doador morto possam ser respeitados.
A diretora-executiva conta que sua organização, a New England Donor Services, está hoje em processo de adoção da PRN apenas para transplantes de órgãos abdominais. O objetivo é "evitar uma circulação mais ampla no corpo do doador e, assim, evitar a reativação do coração”.
Em resposta às declarações do American College of Physicians, médicos especialistas da Universidade de Nova York, nos EUA, Brendan Parent, Nader Moazami, Arthur Caplan e Robert Montgomery, publicaram uma nota na revista científica American Journal of Transplantation em 2022.
Eles dizem que bombear sangue aos órgãos torácicos não muda o fato de que o coração não vai reativar por conta própria. A PRN não mudaria as circunstâncias que levaram a família e a equipe médica a concluir que já não há mais chance de uma vida significativa para o paciente com dano cerebral catastrófico declarado morto por uma parada cardiorrespiratória.
"Não tem nada a ver com trazer um paciente de volta à vida, não é ressuscitar o doador, porque a ressuscitação, por definição, significa que você vai restaurar a longevidade ou a qualidade de vida", diz o diretor cirúrgico de Transplante do Coração e Suporte Circulatório Mecânico do NYU Langone Health, Nader Moazami. O ato de retomar a circulação, afirma ele, é simplesmente outra técnica para recuperação de órgãos.
A técnica segue avançando em países desenvolvidos enquanto a discussão continua nos Estados Unidos. Projetos-piloto em países como Suíça, Holanda, Noruega e Canadá estão sendo desenvolvidos atualmente.
*Com informações de BBC News Brasil