O Fórum Onze e Meia desta quarta-feira (30) recebeu o jurista Lenio Streck para comentar a proposta de redução das penas dos golpistas condenados pelo 8 de janeiro, que seria uma saída ao PL da Anistia, que é inconstitucional e está sendo barrada na Câmara dos Deputados.
A proposta alternativa foi anunciada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e pelo líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), nesta terça-feira (29). Eles afirmaram que estão analisando a possibilidade de redução das penas. O texto estaria sendo elaborado pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE) e não atingiria aqueles que planejaram e financiaram os atos golpistas, como é o caso do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado.
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No entanto, na avaliação de Streck, o projeto "vai beneficiar inexoravelmente o Bolsonaro". Para ele, a proposta é uma "cortina de fumaça".
"Isto vai beneficiar Bolsonaro, vai beneficiar todos os mandantes e essa gente toda", disse. Ele ressaltou que o governo federal foi "fraco" ao conduzir o debate da anistia e acabou deixando "tudo nas costas do Supremo".
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"E houve um momento em que o Supremo se entregou. A entrevista do Barroso foi, digamos, o código, a chave que desencadeia todo o processo. Mas tudo começa com o truque narrativo do caso da moça do batom. Aquilo ali foi o elemento desencadeante, foi a coceira que virou essa gangrena", analisou o jurista.
Ele também afirmou que houve "pouca reação" da ala progressista, que chegou a ter pena de alguns condenados. "O resultado está aí. É uma coisa bem brasileira, nós não conseguimos levar algo desse tipo até o final, a gente não conseguiu fazer justiça de transição", declarou Streck.
"Tudo isso está na conta do débito republicano nosso e vem o momento que a conta chega, a conta vem com juros de cartão de crédito. Nós não conseguimos fazer justiça e transição, nós não conseguimos deixar os fantasmas do passado e chegou tudo junto, com Executivo, Legislativo, Judiciário, para fazer um acordo para, de algum modo, perdoar os que quase acabaram com a democracia", acrescentou.
Streck avaliou que, por posturas como a do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), o Supremo pode ter "se sentido meio solo" e recuado em alguns pontos. "Não sei bastidores ainda, mas o governo tinha que ajudar nessa história toda. Porque o governo foi a vítima. Veja, a vítima é a democracia representada pelo governo. Portanto, é como alguém que sofre uma violência e fica olhando de fora, não se importando", afirmou Streck.
"Se o governo nada diz, há um determinado momento em que a vítima, numa espécie de síndrome de Estocolmo tardia, acaba concordando com o algoz", comparou.
Isso é negociar o inegociável. Não se negocia o inegociável, isto é um harakiri institucional, um erro histórico, não se perdoa golpista em lugar nenhum do mundo. A democracia não pode ser autocontraditória e autofágica.
Por fim, o jurista alertou que é preciso estar atento aos detalhes do novo projeto de redução de penas, porque nas entrelinhas podem estar as possibilidades de beneficiar Bolsonaro. "O diabo mora nos detalhes, entendeu? O direito é tão complexo que essas coisinhas passam despercebidas. É como na medicina, uma costurinha ali, um ponto fora do lugar, mata o cara. No direito, uma vírgula acaba ou beneficia. É impossível um projeto desse tipo não beneficiar Bolsonaro e companhia", ressaltou.
Confira a entrevista completa do jurista Lenio Streck ao Fórum Onze e Meia
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