ANISTIA AOS GOLPISTAS

Lenio Streck diz que anistia é "golpe na tentativa de golpe"

Em entrevista ao Fórum Onze e Meia, jurista reforça que proposta é inconstitucional e irá gerar crise com STF

O jurista Lenio Streck.Créditos: Reprodução Migalhas
Escrito en POLÍTICA el

O Fórum Onze e Meia desta quarta-feira (16) recebeu o jurista Lenio Streck para analisar a proposta de anistia aos golpistas de 8 de janeiro que irá começar a tramitar na Câmara dos Deputados após o Partido Liberal (PL) conseguir as assinaturas necessárias necessárias para que o projeto tramite em regime de urgência.  

Streck afirmou que o que mais o impressiona é o fato de metade das assinaturas ser da base do governo. Para ele, isso significa que "essa base é uma fraude". "Não existe uma base do governo se a própria base do governo, parte dela, brinca com a democracia, negocia a democracia", disse o jurista.

Ele acrescentou que o Brasil está fazendo um "hara-kiri (suicídio) institucional". "É de uma irresponsabilidade bárbara, é antirrepublicano. Isto é um golpe na tentativa de golpe, uma rasteira de parte do Parlamento, e auxiliados por pessoas que pretensamente estariam apoiando o governo", avaliou. 

O jurista também destacou que "não há dúvida nenhuma" de que o Supremo Tribunal Federal (STF) irá declarar a proposta inconstitucional - conforme o próprio jurista já explicou nesta reportagem. "O problema não é jurídico, o problema é político", resumiu.

Streck ressaltou que a proposta de anistia ainda cria uma crise inconstitucional com o STF. Ele explicou que toda democracia funciona com desenhos e diálogos constitucionais, e que as crises só acontecem quando essas ferramentas falham. "Isto é, a divisão de Poderes, que devem ser harmônicos, tem um mecanismo anterior que funciona para evitar o atrito e a crise. O Brasil está na contramão", declarou o jurista. 

"O Brasil não está sabendo utilizar os mecanismos de freios e contrapesos, e aí o governo falha também, porque não entra em campo como deveria, entende? Está criando um problema lá na frente, que é um problema de crise institucional, e os deputados, de forma irresponsável, brincam com a democracia. Este é o pior Parlamento que a República já teve", avaliou. 

O golpismo e a Lava Jato

Streck, que acompanhou o processo da Lava Jato, também fez ponderações sobre como essa operação ainda traz prejuízos ao Judiciário e à democracia brasileira. Ele ressaltou que, "ao invés de aprendermos com os erros, insistimos neles". Ele classificou a Lava Jato como "uma "experiência fracassada na República". "Isso que está aí [tentativa de golpe] só existe por causa da Lava Jato", afirmou. 

"As pessoas que lidaram com a Lava Jato - e lidaram mal ou bem para elas, mas mal para o país - não deveriam ser prestigiadas, porque é uma crônica de um problema que vai se colocar logo adiante, de novo. Mas o Brasil tem essas coisas de insistir [no erro]", acrescentou o jurista. 

Streck ainda disse que a Lava Jato foi um "fenômeno de mídia" e que só deu certo porque teve apoio da imprensa comercial. "Aquela imagem daquele tubo saindo dinheiro é uma imagem performática que marcou. Então, hoje, as coisas só funcionam assim".

Cassação de Glauber Braga

Por fim, Streck comentou sobre o processo de cassação do deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ), e afirma que já assinou um abaixo-assinado em defesa do parlamentar. "O Glauber é um combativo parlamentar, tem toda a minha solidariedade", afirmou.

O jurista destacou que o caso de Glauber é "diferente" de quando alguém, por exemplo, faz um discurso machista, homofóbico ou racista. "O Glauber é o contrário. O Glauber empurrou, tirou o cara para fora, porque o cara estava ofendendo com discursos fascistas", apontou.

Ele ainda relembrou o caso do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL). O pedido de cassação de seu mandato foi aprovado pelo Conselho de Ética, mas segue, há um ano, engavetado na Câmara. 

"Agora, para um Parlamento como esse, igualam aquele cara que mandou matar Marielle com um cara como o Glauber, que expulsa um fascista do Parlamento", disse Streck.

"Eu me solidarizo com o Glauber. Lamentavelmente, ele pegou uma onda errada no Parlamento, justamente num período em que a extrema direita quer se vingar por uma série de coisas", acrescentou.

Para Streck, faltam grandes líderes parlamentares para que ocorra uma defesa mais ampla e efetiva de Glauber. O jurista relatou que deveria haver um deputado que fizesse um discurso em que defendesse que Glauber fez uma "espécie de legítima defesa do Parlamento" ao expulsar o militante do MBL que proferiu ofensas contra ele e sua mãe.

Confira a entrevista completa do jurista Lenio Streck ao Fórum Onze e Meia

Siga o perfil da Revista Fórum e da jornalista Júlia Motta no Bluesky.

Reporte Error
Comunicar erro Encontrou um erro na matéria? Ajude-nos a melhorar