AVALIAÇÃO

Coimbra sobre aprovação do governo Lula e pesquisas: "Não temos uma amostragem real"

Em entrevista ao Fórum Onze e Meia, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi comenta últimos resultados das pesquisas sobre o governo

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.Créditos: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil
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O Fórum Onze e Meia desta quinta-feira (3) recebeu o cientista político e presidente do Instituto Vox Populi, Marcos Coimbra, para analisar os últimos resultados das pesquisas que avaliam o governo do presidente Lula (PT), e que mostram índices negativos ultrapassando os positivos, apesar das melhorias feitas pelo Executivo. 

Para Coimbra, as pesquisas não podem ser consideradas uma "amostragem real" da sociedade. Ele explica esse cenário com outros dados que evidenciam o desinteresse da população pela política. O cientista questiona, por exemplo, como o último levantamento aponta que 97% dos eleitores têm um candidato ou vão votar nulo ou branco se outros estudos apontam que os índices de falta de interesse em política chegam a 50% em alguns setores da sociedade?

"A grande parcela que não quer, não se interessa, não se entusiasma com isso [política], não vai te dar entrevista. Portanto, nós não estamos com uma amostra efetiva do universo do eleitorado. Nós não temos essa amostra", defende Coimbra. "Nós não estamos conseguindo fazer uma amostragem 'real' da sociedade", acrescenta.

Coimbra usa como exemplo as pesquisas feitas antes das eleições de 2022, que apontavam que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tinha cerca de 30% dos votos, enquanto Lula tinha 60%. Porém, quanto mais se aproximava o dia da votação, os resultados mudavam e, na apuração final, foram bem diferentes. 

"Hoje, nós não estamos conseguindo saber o que pensa essa parte não politizada, não informada, não interessada da sociedade", afirma o cientista. 

Nesse sentido, Coimbra defende que o "real significado" das pesquisas é ignorado. Ele afirma que vê com "grande perplexidade" o cenário de uma parte dos formadores de opinião e da imprensa ficar discutindo os números das pesquisas "quando os reais significados deles são ignorados". Ele afirma que se 97% dos eleitores já tomaram uma decisão um ano antes das eleições, significa dizer que somente 3% da população está indecisa, o que para o cientista é "completamente incoerente com a sociedade que a gente vive".

"Isso não tem a menor coerência com os dados que a gente tem a respeito de desinteresse, não envolvimento, antipatia pelo tema, pela discussão, pela conversa [sobre política]", ressalta. 

"Quando você faz as perguntas clássicas que permitem traçar qual é o perfil da informação política, mais da metade não sabe nada. Não sabe dizer quem é o vice-presidente, não sabe dizer quem é o presidente da Câmara, não sabe dizer quanto tempo dura o mandato de um senador", comenta Coimbra. 

Dessa forma, ele defende que os resultados das pesquisas são "completamente incoerentes" com a realidade socioeconômica e atitudinal do país. O cientista ainda destaca que vivemos um período "particularmente ruim de imagem da vida política, dos partidos e da liderança". "E, no entanto, 97%, segundo essa pesquisa, sabem o que vai fazer daqui a um ano e meio".

"Ou seja, então, a gente tem que olhar todos esses números com pé atrás porque não é um cenário que está definido", afirma o cientista. Ele menciona, também, um termo usado pelo jornalista Reinado Azevedo, que é o "pesquisismo".

"O mundo piorou"

Coimbra também destaca que uma das razões que podem explicar o maior índice de desaprovação do governo Lula é que o mundo político piorou em quase todos os países. Ele cita uma pesquisa feita por um instituto dos EUA que investigou a avaliação dos principais líderes políticos nas democracias eletivas. Segundo Coimbra, das 25 maiores democracias eletivas, somente três têm chefes de governo bem avaliados. Em outras duas, as avaliações são equilibradas. Porém, nas demais, a avaliação é negativa. E o Brasil se encontra nesse grupo. 

"Esse é o cenário do mundo", diz. "Não é porque estamos vivendo uma birra com o Lula ou porque o antipetismo se ampliou. É porque é assim que é a vida política hoje", afirma Coimbra. 

Ele defende que isso se deve a pelo menos "duas coisas óbvias". "A primeira razão de que isso passou a ser a regra nas democracias mundo afora, é porque o mundo piorou. Nós estamos vivendo um tipo de capitalismo que não tem perspectiva", avalia Coimbra. "A óbvia manifestação disso é a crise climática. Nós estamos destruindo o mundo", declara. 

Em segundo lugar, Coimbra relembra que, nos últimos 20 anos, do governo de Fernando Henrique para cá, houve o novo fenômeno da sociedade da informação instantânea. 

"Essa sociedade de informação instantânea e imediata jogou no sistema de opinião um contingente que não fazia parte dele - em países como o Brasil, uma boa parte continua fora - mas cresceu muito a parcela que agora se sente perfeitamente qualificada para ter opinião. E raramente essa opinião de quem está chegando agora é favorável, é positiva, porque está tudo mal mesmo", analisa o cientista. "Não é ruim porque o Lula está fazendo um mau governo", considera Coimbra. 

Ele ainda ressalta que Fernando Henrique atravessou crises muito piores do que a de Lula, pagou um preço, mas saiu como"uma grande liderança do governo". Lula passou por duas experiências num mundo pouco diferente e está agora enfrentando dificuldades muito maiores do que no passado, porque herdou essa calamidade pública que foi o governo do Bolsonaro, as consequências dele", analisa o cientista. 

Preço dos alimentos e segurança: é culpa do Lula?

Por fim, Coimbra comentou sobre os fatores apontados como razão para a avaliação negativa de Lula: o preço dos alimentos e a Segurança Pública. O cientista ressalta que esses dois temas sempre foram "invocados pelas pessoas quando tinham que explicar por que estavam fazendo uma avaliação não favorável, seja média, seja negativa" de algum governo. 

Além disso, Coimbra destaca que "somos uma sociedade que se acostumou a se preocupar com o preço das coisas, embora o fenômeno da hiperinflação já tenha deixado de ser uma preocupação tão profunda. Mas, até hoje, não nos livramos das consequências atitudinais dessa hiperinflação que durante tantos anos foi um tema brasileiro", afirma o cientista. 

Coimbra também comenta que são sempre os mesmos alimentos que registram alta de preços, e isso se deve também às mudanças climáticas e à produção massiva para exportação, e não para o mercado interno. 

"Todo mês são os mesmos produtos que aumentam. E assim é, numa economia afetada por fatores climáticos, afetada pelo modo como se organiza a produção de alimentos. Quem produz alimentos no Brasil para vender hoje é o MST. O famoso agro não quer nem saber de produzir comida", afirma o cientista. 

Já em relação à Segurança Pública, Coimbra afirma que é "óbvio que existe uma preocupação enorme na sociedade brasileira" com o tema, mas que isso é uma característica "permanente". "Não há nada hoje que explique a crise na imagem da segurança pública. Ela é igual", diz. 

"Você pode cobrar de quem se posiciona com 'vou revolucionar a segurança pública', e você tem direito de cobrar. Mas quem tem que cuidar disso, não é o presidente da República, e nunca foi cobrado a rigor dele", avalia. 

Coimbra finaliza afirmando que "essa ideia de que o custo de vida é responsável pela má avaliação do Lula não faz muito sentido".

Confira a entrevista completa do cientista político Marcos Coimbra ao Fórum Onze e Meia 

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