Em entrevista ao Fórum Onze e Meia desta quarta-feira (19), o jurista Pedro Serrano falou sobre a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados por tentativa de golpe de Estado. O advogado já havia previsto, também em entrevista à Fórum em dezembro, que a denúncia seria apresentada em fevereiro deste ano.
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O advogado avalia que agora o Supremo Tribunal Federal (STF) enfrenta uma tarefa ainda maior do que a denúncia, que é "demonstrar a materialidade do delito" cometido por Bolsonaro e aliados na trama golpista, mas que o órgão terá uma "grande ajuda" do relatório da Polícia Federal. O problema principal agora, segundo Serrano, é demonstrar a existência da autoria, ou seja, que os principais réus foram autores do delito. Para o advogado, no caso de Bolsonaro, "a grande dificuldade vai ser demonstrar a autoria, demonstrar que ele tinha ciência [da tentativa de golpe] e não interrompeu".
"Eles [PGR e STF] têm que demonstrar que Bolsonaro autorizou e pediu a conduta. Se não der isso, pelo menos tem que demonstrar que o Bolsonaro sabia do que estava ocorrendo e não impediu que ocorresse, tendo o poder para impedir. Essa é uma demonstração que tem que ser feita, ou seja, que ele ou participou diretamente da conduta, autorizando, determinando, comandando, ou que ele, tendo o conhecimento da conduta, não impediu a sua realização. Esse é um esforço que a PGR vai ter", afirma Serrano.
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O advogado, porém, acrescenta que apesar da tentativa da defesa de argumentar que não houve crime, essa seria uma tentativa "infrutífera". "Eu fiquei muito impressionado com a leitura do relatório da PF e eu acho que tem ali uma demonstração clara da materialidade do delito", diz. "Acho que não é tão clara a participação dos comandantes, vai ter que demonstrar isso em juízo, vai depender muito da eficiência dos procuradores, da qualidade da prova que eles vão produzir", argumenta Serrano. O advogado completa que por sua leitura da denúncia há indícios, mas eles devem ser "efetivamente comprovados".
Serrano afirma, assim como o advogado Roberto Bertholdo que também esteve no Onze e Meia desta quarta-feira, que o Brasil tem uma "tradição golpista" e que o julgamento desse caso seria um dos mais importantes dos últimos 50 anos.
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"A gente tem o hábito de falar, por exemplo, que a República foi produzida pelo golpe e foi um golpe de Estado mesmo. Mas na realidade o golpe foi muito antes. Eu já vi gente de extrema direita criticando a República, aqueles que defendem a Monarquia, falando que isso [a República] é produto do golpe, mas na realidade, o nosso império foi produto de um golpe. Então, a primeira Constituição do Brasil independente já foi produto de um golpe", diz Serrano.
Julgamento em plenário
O advogado avalia que entre o julgamento do caso na Primeira Turma ou em Plenário, o ministro Alexandre de Moraes deve seguir pela segunda opção. Serrano argumenta que, em primeiro lugar, defende os "direitos" e, nesse sentido, caso não haja prova da autoria de Bolsonaro, deve se ter "coragem histórica" de inocentar o ex-presidente. "Ele é culpado? A gente até pode saber que sim, mas se não tem prova no processo, não tem que condenar", defende.
Em segundo lugar, Serrano diz que não se pode "criar mecanismos que depois eles [apoiadores de Bolsonaro] usem para dizer que o eventual juízo de condenação foi fraudulento, inconstitucional, teve nulidades, problemas ou não foi democrático".
Portanto, o advogado defende que, se fosse o ministro Alexandre de Moraes, levaria o caso ao plenário "para não ter dúvida". "O caso é muito relevante, é um caso histórico. Vai constituir a nova jurisprudência de uma lei importantíssima que é a Lei em Defesa da Democracia. Então, eu acho que ficar criando esse tipo de problemas não favorece o processo, porque vai ter o backlash (retaliação, em tradução livre)", avalia Serrano.
"Esse julgamento não acaba no dia de julgamento. Vai ter reação política. Então, é importante que ele seja inquestionavelmente legítimo", diz o advogado. "A experiência histórica do direito demonstra isso", acrescenta.
"A realidade é que é melhor mandar para o plenário para não ter dúvida. Nós temos que ter esse critério, porque se sair uma condenação de um cara importante como Bolsonaro, vai ter reação, inclusive internacional, e nós vamos ter que resistir, mostrar que houve legitimidade. Então, eu acho que a melhor coisa é estar no ambiente que é inquestionável dentro do Supremo, que é o plenário. É a nossa jurisdição falando, é a nossa autonomia, nossa soberania nacional. Não tem o que discutir, a gente tem que enfrentar", defende.
Serrano também acredita que esse caso deve dar uma "lição de democracia". "A vitória aí não é condenar, a vitória é aplicar a Constituição e a lei. Nós estamos falando de justiça, não de disputa política", declara. "Houve o cometimento de um crime gravíssimo que implicou em organização armada. É preciso apurar quem são os responsáveis. Essa discussão é uma discussão de Direito, de Justiça e não de disputa de poder", completa.
Confira entrevista completa do advogado Pedro Serrano ao Fórum Onze e Meia
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