Dados recentes revelam que 3.261 militares da ativa do Exército estão associados a clubes militares, destacando-se o Clube Militar do Rio de Janeiro, o Clube do Exército e a Casa do Sargento do Brasil. Essas associações, que tradicionalmente deveriam ser espaços de lazer e integração social para os militares, têm assumido uma postura política cada vez mais ativa, o que levanta preocupações sobre a influência desses espaços em temas de interesse nacional e o uso de recursos públicos para sustentar suas operações.
O Clube Militar, em especial, conta com 1.821 militares da ativa do Exército entre seus associados, seguido pelo Clube do Exército com 1.434 e pela Casa do Sargento do Brasil com 6. Já o Clube Naval, entidade ligada à Marinha do Brasil, apresenta 4.220 militares da ativa filiados, conforme informações do Sistema de Pagamento da Marinha, base até outubro de 2024. Além disso, o Clube Naval também conta com 3.609 veteranos e 245 pensionistas. Por outro lado, o Clube Militar registra 158 militares ativos, acompanhados de 263 veteranos e 62 pensionistas egressos da Marinha do Brasil.
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A coluna também acionou a Aeronáutica solicitando informações sobre membros da ativa filiados a clubes militares, mas a Força se negou a fornecer os dados referentes ao efetivo alegando que, diferente das demais forças, apenas ela não tem acesso a essas informações.
Este alto número de militares ativos do Exército e da Marinha em clubes que mantêm uma intensa participação política é, para muitos, um ponto de alerta.
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Atuação política e histórico de manifestações
O Clube Militar do Rio de Janeiro se destaca entre essas associações por sua postura política aberta e contundente. Nos últimos anos, a instituição emitiu uma série de notas públicas e organizou eventos nos quais expressou posições sobre questões de política nacional. Um exemplo notável foi durante a reeleição de Dilma Rousseff em 2014, quando, embora afirmasse respeito ao resultado eleitoral, o clube deixou clara sua insatisfação com o governo e lançou uma campanha pela “moralidade nacional.” Durante o evento de lançamento dessa campanha, o então presidente do Clube Militar, general Gilberto Rodrigues Pimentel, criticou programas sociais como o "Mais Médicos" e acusou o governo de ter uma agenda "totalitária" e "autoritária."
Ao longo da última década, o Clube Militar também se posicionou em defesa do voto impresso, criticou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e acusou a instituição de promover uma “ditadura.” Durante o governo Bolsonaro, a associação publicou notas em apoio ao ex-presidente, com ataques frequentes ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao sistema de urnas eletrônicas, além de ter defendido o ex-deputado Daniel Silveira, condenado por ataques a instituições democráticas e por incitar violência contra opositores. A oposição do clube à CPI da Covid, em que insinuou a possibilidade de um golpe militar como resposta à investigação, também reforça a sua postura política inflamada e alinhada a setores conservadores.
O custo para o público: designações de militares da ativa e uso de recursos
Esse contexto torna ainda mais complexo o fato de que muitos desses clubes recebem apoio financeiro significativo dos militares da ativa do Exército e da Marinha. Em maio de 2024, o Clube Militar recebeu mais de um milhão de reais em consignações, valores deduzidos diretamente dos contracheques de seus sócios militares. Além disso, o Clube Naval, com 4.220 militares da ativa associados, também se beneficia dessa mesma estrutura.
Sob a gestão do General Tomás Miné Ribeiro Paiva, o Comando do Exército autorizou que militares ocupem funções administrativas nesses clubes sob a modalidade de “Prestação de Tarefa por Tempo Certo.” Com isso, esses militares recebem adicionais sobre seus salários para atuar em funções essencialmente recreativas e administrativas, sem qualquer relação direta com a defesa nacional.
O Clube Militar, ao longo dos anos, tornou-se uma voz ativa entre os militares do Exército, consolidando-se como uma plataforma de influência política. Em 2018, Jair Bolsonaro, ao considerar nomes para a posição de vice em sua chapa, cogitou representantes do Clube Militar, reconhecendo a projeção política que o cargo de presidente da associação possui entre a tropa. Isso evidencia como a associação se tornou um pilar de poder simbólico dentro das Forças Armadas, com potencial para mobilizar a opinião pública e influenciar o debate político.
Um cenário que exige transparência e revisão
A presença de mais de 3.200 militares da ativa do Exército e 4.220 militares da Marinha em clubes com histórico de atuação política intensa e, em certos momentos, antidemocrática, traz à tona a necessidade de maior transparência e regulamentação. As designações para funções administrativas em associações recreativas que não possuem ligação direta com a defesa nacional, financiadas por meio de recursos públicos, geram questionamentos sobre a real necessidade e impacto dessas práticas.
O contexto atual revela a importância de uma discussão mais aprofundada sobre o papel e os limites das associações militares no cenário político brasileiro. Em tempos de estabilidade democrática, é fundamental que as Forças Armadas mantenham sua neutralidade e que associações como o Clube Militar e o Clube Naval respeitem os limites de sua função recreativa, sem comprometer a confiança e a imparcialidade que a sociedade espera de seus militares em serviço ativo.