O Exército Brasileiro negou um pedido de acesso à informação feito por esta coluna, que buscava revelar documentos sobre os acampamentos golpistas realizados em frente a quartéis em 2022, após a derrota de Jair Bolsonaro nas urnas. A solicitação, feita por meio da Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação, LAI), abrangia relatórios, análises de risco e decisões internas relacionadas às manifestações antidemocráticas. O pedido foi recusado sob a justificativa de que seria "desproporcional".
A justificativa apresentada, no entanto, apresenta contradições e inconsistências. O Exército alegou que atender à solicitação seria inviável por envolver informações de 672 organizações militares espalhadas pelo país. Contudo, a solicitação original especificava de forma clara que o pedido se limitava a documentos produzidos pelo Centro de Inteligência do Exército (CIE) e pelo Comando do Exército, instâncias centrais que concentram informações estratégicas sobre o tema.
Te podría interesar
Incoerência nas justificativas
A negativa do Exército é marcada por argumentos inconsistentes. Enquanto o órgão afirma que o pedido abrangia uma "ampla gama de informações", o escopo original da solicitação estava bem delimitado, restringindo-se a unidades centrais e a um período específico de tempo: o final de 2022 e o início de 2023.
Te podría interesar
Além disso, o Exército não apresentou evidências concretas para sustentar a alegação de desproporcionalidade, como exige o enunciado CGU nº 11/2023. Esse entendimento determina que, para negar pedidos dessa natureza, o órgão deve demonstrar objetivamente a impossibilidade operacional ou apresentar alternativas, como o fornecimento parcial das informações ou a possibilidade de consulta presencial.
A ausência de alternativas reforça a percepção de que a negativa não foi técnica, mas deliberada, configurando um entrave à transparência e ao controle social sobre as Forças Armadas.
Tentativa de evitar o acesso
Após o recurso de primeira instância, o Exército manteve sua posição e sugeriu que a coluna iniciasse um novo pedido, sob o argumento de que o recurso não era adequado. Essa orientação contraria a lógica da Lei de Acesso à Informação, já que o recurso reafirmava as demandas originais, sem ampliar ou modificar o escopo.
A postura do órgão militar, portanto, levanta suspeitas de que a instituição busca evitar a revelação de informações sensíveis sobre o monitoramento e a reação dos militares diante dos acampamentos golpistas. O tema é de elevado interesse público, e sua omissão compromete a credibilidade e a transparência de uma das principais instituições do país.
Interesse público e impacto democrático
Os acampamentos de 2022 configuraram atos de intimidação à ordem constitucional, com demandas explícitas por intervenções militares contra o resultado das eleições. O envolvimento ou a omissão das autoridades militares nesse episódio exige esclarecimentos, já que impacta diretamente a confiança pública na instituição e no sistema democrático.
A negativa do Exército representa não apenas um entrave burocrático, mas também uma afronta ao direito constitucional de acesso à informação, previsto no art. 5º, inciso XXXIII, da Constituição Federal, e ao princípio de que a transparência deve ser a regra e o sigilo, a exceção.
Recurso em segunda instância
Diante das inconsistências apresentadas, a coluna encaminhou um recurso em segunda instância ao comandante do Exército. O recurso reafirma que as justificativas apresentadas não encontram respaldo na legislação vigente e que a Lei de Acesso à Informação prevê mecanismos que permitem atender a demandas sem comprometer as atividades institucionais.
A coluna também destacou que as informações solicitadas estão concentradas em órgãos com estrutura técnica suficiente para fornecer os dados e que a alegação de desproporcionalidade não foi fundamentada de forma concreta.
Transparência sob ameaça
A resistência do Exército em fornecer informações sobre os acampamentos golpistas evidencia um padrão preocupante de opacidade em relação a episódios de interesse público. A postura reforça a necessidade de maior controle social e a importância de fortalecer os mecanismos de transparência no Brasil.
Ao omitir informações relevantes, a instituição não apenas ignora o direito constitucional de acesso à informação, mas também mina a confiança pública em um momento em que o fortalecimento do estado democrático de direito é mais necessário do que nunca.