Parecer jurídico coordenado pelo advogado Breno Valadares, presidente da comissão de processo legislativo da Ordem dos Advogados do Brasil da Bahia (OAB-BA), sobre a PEC 03/2022, relatada por Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no Senado concluiu que a Proposta de Emenda à Constituição não só permite a privatização das praias, como deve ocasionar na expulsão de comunidades pela especulação imobiliária.
"A PEC não só permite a privatização das praias como dá um prazo para que isso ocorra", afirmou Valadares à Fórum.
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Segundo o parecer, assinado por 23 advogados, "a praia, como bem público e gratuito, está inserida como cláusula pétrea da Constituição no Art. 60, parágrafo 4º, pois está entre as garantias e direitos individuais". Portanto, a PEC seria, sobretudo, inconstitucional.
Valadares ressalta, ainda, o caráter excludente da PEC que, caso seja aprovada, deve resultar na expulsão de comunidades tradicionais pela especulação imobiliária.
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"Na forma que está, inclusive os pequenos serão prejudicados haja vista a especulação sobre os terrenos, e, quando não forem expulsas à força essas comunidades dos terrenos de marinha e das praias, serão tomadas pelo interesse privado através da especulação imobiliária", diz, rebatendo um dos principais argumentos do filho "01" de Jair Bolsonaro (PL), de que a PEC beneficiaria os mais pobres concedendo títulos de propriedade.
"Há saídas para se ganhar muito dinheiro sem expulsar os mais pobres, sem degradar o meio ambiente e sem proibir o povo do seu sagrado direito à praia", afirma o advogado
Leia a entrevista e acesse o parecer na íntegra abaixo.
Fórum: Há um debate sobre a PEC, de que se ela permite a privatização das praias ou não. Qual a conclusão do parecer sobre isso? A PEC permite que as praias sejam privatizadas?
Breno Valadares: Sim, a PEC não só permite a privatização das praias como dá um prazo para que isso ocorra. A linguagem legislativa muitas vezes é complicada e difícil de entender, por isso muitos tentam criar embaraços ao real entendimento das leis. Neste caso, porém, apesar de não usar a palavra privatização, a PEC é absolutamente transparente ao falar em propriedade já no Art. 1º com a expressão “passam a ter propriedade” e passam ao “domínio pleno dos foreiros e ocupantes”. Ela avança também no mesmo sentido mas por outra via, passando a propriedade às prefeituras que poderão realizar a privatização de acordo com os interesses locais.
Fórum: Como você vê o debate político em torno disso? Os interesses de quem são defendidos na PEC - já que o relator diz que vai regularizar terrenos de pessoas mais pobres, como no Complexo do Alemão, no Rio?
Breno Valadares: Desde a nossa primeira lei até a presente data, colocar no texto da lei que dará direitos ao povo é o subterfúgio para beneficiar a elite econômica, sendo assim com a própria lei de terras de 1850 e com o estatuto da terra de 1964. Existem pequenas propriedades, inclusive tradicionais que precisam para de sofrer cobranças e ter segurança quanto a sua moradia e atividades econômicas, mas existem forma jurídicas específicas de beneficiar essas comunidades. Na forma que está, inclusive os pequenos serão prejudicados haja vista a especulação sobre os terrenos, e, quando não forem expulsas à força essas comunidades dos terrenos de marinha e das praias, serão tomadas pelo interesse privado através da especulação imobiliária.
Garantir um papel de propriedade não é garantir segurança e permanência dos pescadores, das marisqueiras, das comunidades tradicionais e dos que mais precisam, nem no Complexo do Alemão no Rio, nem em qualquer outro lugar do Brasil.
Fórum: Qual seria a alternativa para essa questão apresentada pelo estudo?
Breno Valadares: Excelente pergunta. Tem jeito de fazermos uma regularização das áreas, preservando o meio ambiente, o direito das comunidades tradicionais e até das grandes corporações econômicas, empresas de turismo e de eventos. Nos casos de áreas mais habitadas, podem ser realizadas as Reservas extrativistas que asseguram a moradia e a atividade econômica, tendo ainda o Estado como protetor dessas comunidades, temos também a possibilidade de convênios entre União e prefeituras, com criação de consórcios privados para exploração sustentável de praias e paraísos. Não podemos contudo passar a boiada achando que haverá uma saída única para todos os casos, pois não se pode comparar o Complexo do Alemão com a praia de Boipeba na Bahia ou com Ilha do Mel no Paraná. Há saídas para se ganhar muito dinheiro sem expulsar os mais pobres, sem degradar o meio ambiente e sem proibir o povo do seu sagrado direito à praia.
Leia a íntegra do parecer