A intensa mobilização de mulheres e da sociedade como um todo contra o Projeto de Lei 1904/2024, conhecido como "PL do Estupro", vem surtindo efeito. Após milhares de pessoas saírem às ruas nos últimos dias, em todo o país, contra a proposta fundamentalista que equipara a interrupção de gestação acima de 22 semanas ao crime de homicídio, parlamentares que antes expressavam apoio já fazem movimento de recuo.
A ideia é que o projeto, encabeçado pelo bolsonarista Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), seja votado somente após as eleições municipais, que serão realizadas em outubro - apesar de um requerimento de urgência ter sido aprovado na última semana após manobra do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL).
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A pressão popular contra a proposta, somado ao posicionamento contrário do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de membros de seu governo, aliada ainda ao recado do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de que o texto não tramitaria na casa legislativa em regime de urgência, vem fazendo com que lideranças do centrão, bloco que mais reúne parlamentares na Câmara, retirem o apoio. Isso faz com que os votos favoráveis ao projeto fiquem basicamente limitados à bancada evangélica.
O movimento foi revelado por uma liderança do centrão à jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo. "Do jeito que está, não tem como aprovar essa proposta", disse o parlamentar, que não teve o nome revelado.
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Lula prepara reação
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que já classificou o o Projeto de Lei 1904/2024, conhecido como "PL do Estupro", que equipara a interrupção de gestação acima de 22 semanas ao crime de homicídio, como uma "insanidade", prepara uma reação do governo que tem como objetivo barrar a aprovação da proposta que está em tramitação na Câmara dos Deputados.
Na manhã desta segunda-feira (17), o mandatário fará reunião com ministros e lideranças do governo no Congresso Nacional para discutir meios de frear o avanço da proposta, cujo regime de urgência foi aprovado na última semana.
Participarão da conversa com Lula no Palácio do Planalto os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Rui Costa (Casa Civil), Márcio Macedo (Secretaria Geral), Fernando Haddad (Fazenda), Laércio Portela (Comunicação Social) e os líderes do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e no Congresso, Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP). Constam na agenda oficial de Lula desta segunda-feira duas reuniões: uma às 9h e outra às 10h30.
PL do Estupro é "insanidade", diz Lula
Neste sábado (15), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se manifestou a respeito do PL do Estupro.
"Eu, Luiz Inácio, sou contra o aborto. Mas, como o aborto é uma realidade, precisamos tratar como uma questão de saúde pública", disse o presidente.
"Eu acho uma insanidade querer punir uma mulher vítima de estupro com uma pena maior que um criminoso que comete o estupro. Tenho certeza que o que já existe na lei garante que a gente aja de forma civilizada nesses casos, tratando com rigor o estuprador e com respeito às vítimas".
Na última quinta-feira (13), a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, havia divulgado nota sobre o projeto.
"Não podemos revitimizar mais uma vez meninas e mulheres vítimas de um dos crimes mais cruéis contra as mulheres, que é o estupro, impondo ainda mais barreiras ao acesso ao aborto legal”, pontuou. “Hoje a pena para o estuprador é de 6 a 10 anos de prisão, ampliada para até 12 anos caso o crime envolva violência grave. Portanto, a mulher que optar pelo aborto legal em caso de estupro poderá passar na prisão até o dobro do tempo de seu estuprador".
Logo depois, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que o governo se posicionava contra o projeto.
"Não conte com o governo para qualquer mudança na legislação atual de aborto no país. Ainda mais um projeto que estabelece, quero repetir, uma pena pra mulher que foi estuprada, pra menina que foi estuprada, que muitas vezes é estuprada sem nem saber o que é aquilo, descobre tardiamente que ficou grávida porque nem sabe o que é gravidez ou às vezes tem que esconder, às vezes do estuprador, que às vezes é um parente que está lá na própria casa".
A socióloga e primeira-dama Janja da Silva também havia falado sobre o PL em postagem publicada na sexta-feira (14).
"Os propositores do PL parecem desconhecer as batalhas que mulheres, meninas e suas famílias enfrentam para exercer seu direito ao aborto legal e seguro no Brasil", pontuou. “Isso ataca a dignidade das mulheres e meninas, garantida pela Constituição Cidadã. É um absurdo e retrocede em nossos direitos.”