BANCADA "EVANGÉLICA"

PL do estupro: autor é “poste” de Malafaia e criminaliza mulheres para “testar” Lula

Alçado à liderança da bancada evangélica após golpe de Malafaia, Sóstenes Cavalcante atua como braço político do "conselheiro" de Bolsonaro e usa PL para tentar jogar evangélicos contra Lula e negociar cargo com Lira na sucessão na Câmara

Sóstenes Cavalcante com Malafaia em 2018 e no cartaz do ato pró-Bolsonaro no Rio.Créditos: Instagram / Sóstenes Cavalcante
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Após a aprovação de regime de urgência do PL 1.904/2024, que prevê a equiparação do aborto ao homicídio caso a gestação já esteja com mais de 22 semanas, o principal autor da proposta, Sóstenes Cavalcante (PL-SP) escancarou o uso político do tema, uma questão de saúde pública para mulheres e crianças, vítimas de estupro no país.

O PL, que “acresce dois parágrafos ao art. 124, um parágrafo único ao artigo 125, um segundo parágrafo ao artigo 126 e um parágrafo único ao artigo 128, todos do Código Penal Brasileiro, e dá outras providências”, foi apresentado por Cavalcante, mas tem outros 31 autores.

Entre eles, muito são ligados diretamente à bancada evangélica e têm estreita ligação com Malafaia, como Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Nikolas Ferreira (PL-MG), Paulo Bilynskyj (PL-SP), Carla Zambelli (PL-SP), Bia Kicis (PL-DF) e Alexandre Ramagem (PL-RJ), entre outros que atuam como soldados de Bolsonaro e seu “conselheiro espiritual” na Câmara - veja a lista de autores.

Em 2022, o Brasil registrou cerca de 75 mil casos de estupro – o maior da série histórica, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Seis em cada dez vítimas eram crianças de até 13 anos, 57% eram negras e 68% dos estupros ocorreram na residência das vítimas.

Em média, 38 meninas de até 14 anos se tornam mães a cada dia no Brasil, de acordo com dados do SUS. Em 2022, foram mais de 14 mil gravidezes entre meninas com idade entre 10 e 14 anos no país – que podem ser interrompidas com o aborto pela legislação atual.

No entanto, o “poste” de Silas Malafaia, juntamente com seus colegas, manobrou com Arthur Lira (PP-AL) para dar urgência ao PL para tentar emparedar Lula sobre o tema.

"Será um bom teste para o Lula provar aos evangélicos se o que ele assinou na carta era verdade ou mentira", disparou Cavalcante após a votação na Câmara, em apenas 24 segundos.

Não acredito no Lula", afirmou Sóstenes Cavalcante, como porta-voz da horda, à coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo. "Quero aprovar esse projeto para ver se ele vai sancionar ou se vai vetar."

“Poste” de Malafaia

Pastor licenciado da Assembleia de Deus, Sóstenes Cavalcante atua como “poste” de Silas Malafaia, o “conselheiro espiritual” de Jair Bolsonaro (PL) na Câmara.

Principal articulador da aliança entre o pastor midiático e o clã Bolsonaro, ainda em 2017, Cavalcante atua como braço político de Malafaia no Congresso nacional e foi eleito, em 2022, líder da bancada evangélica por meio de um golpe dado em conjunto com o líder Assembleia de Deus Vitória em Cristo.

Cavalcante chegou ao posto após debate público entre Malafaia e parlamentares e bispos ligados ao ex-presidente, Cezinha de Madureira (PSC-SP), que expôs a guerra em torno do comando da bancada evangélica.

A principal batalha foi  travada entre Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, e Samuel Ferreira, que comanda a Assembleia de Deus no Brás – Ministério de Madureira.

A briga começou quando Ferreira anunciou que faria campanha para manter o deputado Cezinha na liderança da bancada durante a posse do “terrivelmente evangélico” André Mendonça no Supremo Tribunal Federal (STF).

A declaração irritou Malafaia, que trabalhava em cima do acordo já costurado para o nome de Cavalcante.

Em seguida, farpas públicas foram trocadas apoiadores de Cezinha e Malafaia, que chamou Samuel Ferreira de "arrogante asqueroso" em áudio distribuído em grupos da bancada.

Cristão de fuzil

Após assumir a bancada, Cavalcante passou a obedecer as ordens de Malafaia e chegou até mesmo abandonar sua posição de armamentista para defender que "o cidadão pode ter uma arma de grosso calibre, um fuzil".

 "Ter uma arma na sua casa, na sua propriedade rural não é anticristão. É defesa pessoal. É ele ou eu. O bandido ou eu. À luz da minha fé, isso não é pecado. O bandido anda armado para matar e eu vou me defender. A teologia cristã defende que a vida é o bem maior. Não existe pecado", disse, ao justificar a mudança de posição.

Como líder da bancada evangélica, Cavalcante é usado por Malafaia e Bolsonaro para polemizar temas que têm forte impacto entre os fiéis junto ao governo Lula, culminando no projeto de criminalização das mulheres vítimas de estupro que engravidarem.

Além de usar o pupilo para ataques ao governo, Malafaia ainda ensaia voos mais altos com a indicação de Cavalcante para a vice-presidência da mesa diretora da Câmara, na chapa apoiada por Arthur Lira, o que explica a aprovação relâmpago do regime de urgência para o PL que criminaliza as mulheres vítimas de estupro que optarem por abortar.